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Entrevista: Rali dos mercados deve prosseguir, sem inflação global, diz economista

(Foto: Shutterstock)

Os mercados brasileiros devem seguir em alta no decorrer de 2021, impulsionados pela valorização das commodities, pelos estímulos fiscais contra a Covid-19 e pela perspectiva de avanço da agenda de reformas no Congresso, conforme análise do economista Matheus Jaconelli, da corretora de valores Nova Futura, em entrevista ao Mercado News.

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Além disso, Jaconelli não enxerga risco de inflação global em decorrência das medidas expansionistas lançadas pelos governos, sobretudo nos Estados Unidos, para o combate aos efeitos da pandemia na economia: “não enxergo esse surto de inflação, pois os salários ao redor do mundo não estão crescendo”.

O economista também acredita na aprovação das reformas prometidas pelo governo federal, mas aponta para certa lentidão na tramitação e com possíveis desidratações. “As reformas devem ser aprovadas, mas pode haver certa demora, pode ter uma PEC ou outra que pode contribuir pra que a questão fiscal não seja aprovada”, diz Jaconelli.

Outro ponto para o qual o economista chama a atenção é a importância de uma rápida imunização da população contra a Covid-19, para que assim a economia possa passar por uma abertura plena, gerando empregos e diminuindo a necessidade de auxílios governamentais.

A seguir, leia a entrevista com Matheus Jaconelli, da Nova Futura:

Mercados viveram forte rali recente, renovaram recordes com esperança por estímulos. Vê espaço para continuidade do rali?

O aumento de dólares na economia via estímulos fiscais contribui muito para a desvalorização da moeda norte-americana e faz com que commodities, principalmente, subam de preço. Assim o fluxo acaba indo para mercados que tenham ativos intensivos nesse tipo de produto. O Brasil é um exemplo disso, o México é um exemplo disso, então o ciclo global começa a ficar positivo. Também levando em consideração que os estímulos à economia norte-americana trazem boas perspectivas para o crescimento econômico global.

O problema, de fato, é o coronavírus, que continua avançando. Mesmo com a vacinação, que já começou nos países desenvolvidos e em outros países como México e Argentina, a evolução [do vírus] continua muito rápida e muito intensa, e isso também traz riscos ao mercado. Mas o panorama geral até o fim do ano é que os mercados continuem subindo, tendo em vista essa questão dos estímulos lá fora e a perspectiva de melhora do quadro fiscal, que também será necessária. Então é bom acompanhar tudo está relacionado às eleições na Câmara, já que apesar do Baleia Rossi [deputado federal] ter apoiado o governo na maior parte das pautas colocadas ao longo da administração Bolsonaro, ele tem em sua base aliada muitos partidos contrários ao governo Bolsonaro. Esses partidos podem pressionar, caso o Baleia Rossi ganhe [a eleição para a presidência da Câmara], para que ele vá contra algumas pautas do governo. Então isso também será importante para a expectativa em relação às reformas e medidas de ajuste fiscal.

Qual é a sua expectativa para a retomada da economia brasileira sem o auxílio emergencial?

Pode ser que a economia cresça caso as vacinas sejam aplicadas, a reabertura da economia ocorra de forma mais forte e o comércio volte a funcionar de forma regular. Assim, a economia acabará crescendo. Isso fará com que muita gente volte a trabalhar em seus antigos empregos, nas empresas que não quebraram, e também, pensando pelo lado da oferta, há um aumento de produção, se olharmos alguns números, como os dados de produção industrial e de serviços, que foram positivos – e esse setor sofreu bastante com a pandemia.

Mas, quando olhamos pelo lado da demanda, esse crescimento pode ser limitado porque muita gente vai perder parte de sua renda, e parte dessa renda nós olhamos como renda disponível.

Muitas pessoas acabaram pegando o auxílio – e é claro que muita gente não tinha nada -, mas também houve pessoas que eram comerciantes ou trabalhadores sem carteira assinada que ficaram com receio de perder suas receitas e optaram por receber o benefício também, como um adicional. Quando olhamos para o nível de renda que foi poupada, teve gente que conseguiu guardar parte dessa renda oriunda de serviços temporários e do auxílio emergencial. Isso consegue equilibrar um pouco as coisas para que muitas pessoas consigam suportar esse momento de retirada do auxílio. Mas é claro que isso será um limitador.

Quando olhamos o boletim Focus e vemos aquela expectativa de crescimento do PIB de 3,41%, a realidade pode ficar um pouco abaixo disso, lembrando que já houve queda dessa estimativa. Há 4 semanas se esperava [um crescimento de] 3,5%.

Qual é a sua visão para o dólar? Existe uma expectativa de desvalorização global do dólar neste ano, com estímulos fiscais na gestão Joe Biden.

O dólar deve perder força, pensando mais nos movimentos lá de fora, e pensando também nesse movimento de valorização das commodities. Mas o grande problema que observamos na primeira semana de janeiro é a preocupação com a questão fiscal.

O dólar frente ao real também absorve todos os problemas locais do País. Estão sendo destinados mais dólares aos países emergentes por conta dos investimentos, mas quando olhamos para nossos pares tem mais recursos indo para outros países, tendo em vista a situação fiscal e política do Brasil. Isso precisa ser resolvido. Se resolvidos, ao menos em parte, os problemas fiscais que nós temos, a previsão é que o dólar perca força frente ao real e não fique mais nesse patamar elevado que temos visto, acima de R$ 5,20.

O senhor acredita em avanço na agenda de reformas no Congresso neste ano?

Isso vai depender muito de como vai ficar o Congresso. O [Rodrigo] Maia [presidente da Câmara], apesar de falar da necessidade de continuar com o benefício [fiscal], sempre tenta falar sobre a questão do limite, que é o teto [de gastos]. Baleia Rossi também já falou sobre isso, e se [o eleito] for o [Arthur] Lira [deputado federal], tem ainda mais chances de as reformas passarem.

Há uma ala bolsonarista dentro do governo que é um pouco menos liberal em comparação com o Ministério da Economia. Mas eu acho que essas pautas podem ser aprovadas porque mesmo com o apoio de outros partidos menos liberais ao Baleia Rossi, ele deve ver com bons olhos as reformas, ao menos vem sinalizando isso. Então as reformas devem ser aprovadas, mas pode haver certa demora, pode ter uma PEC ou outra que pode contribuir pra que a questão fiscal não seja aprovada. Então pode existir esse cenário misto, mas a expectativa é que as reformas saiam.

A falta de um plano estratégico de vacinação no Brasil está precificada nos ativos brasileiros?

[O impacto] é negativo. As coisas não estão avançando, a economia precisa da reabertura total para que volte a crescer e isso depende da vacina. Então alguns gastos que poderiam ser evitados vão continuar porque não será aplicada a vacinação e não teremos a reabertura, e o crescimento econômico será menor. Uma pessoa que abriria um negócio ou cujo negócio voltaria a funcionar de forma integral, não o fará, e esse negócio que poderia empregar alguém, não empregará. Tudo isso impacta negativamente, pois uma coisa embola na outra e o tempo vai passando – tempo durante o qual negócios poderiam estar funcionando.

Lá fora, os juros dos Treasuries começaram a subir bastante, sobretudo com vencimento em 10 anos. Há risco de surto de inflação no mundo, com chance de o Fed começar a reverter medidas de estímulos?

Por ora, não. Não enxergo esse surto de inflação, pois os salários ao redor do mundo não estão crescendo. A atividade econômica caiu muito e o desemprego está em um patamar muito elevado em todo o mundo, principalmente nos EUA. Quando olhamos para os dados de pedidos de seguro-desemprego nos EUA, que são semanais, e que em momentos normais não passavam dos 300 [mil], hoje não caem abaixo de 700 [mil], ficando sempre próximo dos 800 mil pedidos. Então não há uma perspectiva de aumentos nos salários, ao menos neste ano. Os salários devem permanecer no patamar atual, o desemprego deve levar um tempo para recuar, e isso influencia os preços, porque impacta a renda das pessoas. Quando você tem salários mais baixos e maior desemprego, você não tem aumento de preços, nem pelo lado da oferta, porque existirá uma quantidade maior de mão de obra disponível no mercado, nem pelo lado da demanda, porque o consumidor terá uma renda menor, com muitas pessoas dependendo de auxílios, até mesmo nos países desenvolvidos. Tudo isso faz com que a perspectiva, ao menos por ora, não seja de alta da inflação. A análise de alguns especialistas é que haverá alta da inflação com a retomada do setor de serviços, mas é preciso olhar se haverá, de fato, tanta demanda quanto se espera.

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