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Partidos tentam virada digital para recuperar relevância

A oito meses das eleições municipais, partidos ampliam o investimento em cursos de formação política online em busca de candidatos interessados em se lançar em outubro. A “virada digital” também tem como meta colateral a tentativa, por parte das legendas, de recuperar sua relevância no debate nacional, de fugir da pecha da velha política e de servir como ferramenta para atrair jovens.

Os cursos, gratuitos, abordam desde temas mais tradicionais, como quais são as atribuições de um vereador, legislação eleitoral e maneiras de prestar contas, até a construção de marca pessoal e combate a fake news. Há módulos que ensinam a gerir redes sociais, a usar mídia paga e a monitorar, por meio de métricas, a audiência e o engajamento de postagens nas redes sociais.

A estratégia dos partidos é semelhante à adotada pelos grupos cívicos ou de renovação política, apoiados pelo apresentador de TV Luciano Huck, eventual candidato à Presidência em 2022 que, assim como o presidente Jair Bolsonaro, não está filiado a nenhuma sigla.

Após o racha provocado pela desfiliação de Bolsonaro, o PSL – sigla que recebeu o maior número de votos para a Câmara – foca, por exemplo, na elaboração de um programa 100% digital para capacitar novos quadros e gerir campanhas. Legendas mais tradicionais, como PT, MDB, PDT, PSD e Cidadania, também planejam novidades com a criação ou incremento de suas ferramentas de ensino e interação a distância. Com o atual descrédito dos partidos, muitos envolvidos em escândalos de corrupção, as formas de filiação praticadas anteriormente, seja nas portas de fábrica ou nos grêmios estudantis, foram, aos poucos, deixadas de lado.

“O ambiente é que provoca mudanças. Os partidos perderam a ideologia, a identificação. Isso os afastou da sociedade, que não se interessa mais em buscar uma filiação. As plataformas digitais são válidas nessa tentativa de retorno, mas o contato pessoal, o debate não podem ser descartados. Isso é política, senão vira hashtag”, disse Marcelo Vitorino, professor de marketing político da ESPM.

Elaborada pelo economista Marcos Cintra, ex-secretário especial da Receita e atual coordenador técnico do Instituto Índigo, do PSL, a plataforma online do partido abordará temas como gestão de campanha, legislação eleitoral e prestação de contas – o partido é investigado por uso de candidaturas laranjas em Minas e Pernambuco. Voltado para a formação de quadros, um segundo programa contará com encontros presenciais.

“Sinto que o PSL é um partido que cresceu muito rapidamente, em função da eleição de Bolsonaro. Ele saiu de um partido praticamente inexpressivo para o segundo maior do País, e ainda não conseguiu firmar uma imagem programática muito clara”, afirmou Cintra.

A constatação, mesmo que tardia, da dificuldade quase unânime de renovação interna também é uma das propulsoras das ações digitais. “O PT perdeu bancada em 2018, em parte porque não soube ofertar nomes para a renovação”, disse o secretário nacional de Juventude do partido, Ronald Sorriso.

Intitulado Representa, o projeto da legenda deve ser lançado em março com o objetivo de mapear e formar jovens que tenham identificação com o PT e disposição para se candidatar. Vai oferecer aulas online de política e alguns encontros presenciais. A meta é formar 2 mil para disputar cargos de vereador.

Treinamentos para a eleição de outubro também são prioridade no MDB. Em janeiro, a Fundação Ulysses Guimarães lançou o FUG Lab, com aulas online e uma etapa presencial em todas as capitais, com módulo sobre fake news. “O próprio Bolsonaro foi a prova de um trabalho feito via rede social. Sentimos o baque na eleição passada, quando o MDB perdeu metade de seus deputados”, disse o secretário executivo da fundação, João Henrique de Almeida Sousa.

“O celular virou o cabo eleitoral moderno, e a campanha que não estiver ligada nisso terá dificuldades.”

Rumo

A psicóloga Maria Aparecida Pinto se filiou ao MDB aos 18 anos, na época do bipartidarismo da ditadura militar. Em 2018, no comando da ala afro da sigla, lançou-se candidata ao Senado por São Paulo. Com 557 mil votos, ficou em 9.º lugar e resolveu mudar o rumo da carreira política. Agora, aos 62, concluiu o curso online de formação política do RenovaBR e pretende se candidatar a vereador pela capital.

“Os partidos são formados por pessoas que estão há 20, 30 anos lá dentro. Elas não te ensinam para que você não queira concorrer com elas”, afirmou. Estudando com mais jovens, Cidinha, como é conhecida, disse que precisou se esforçar. “Aprendi até a cortar vídeos. Só não aprendi a emendá-los.”

Na tentativa de se aproximar ainda mais dos grupos de renovação – e, de quebra, filiar Huck para 2022 -, o Cidadania deve iniciar na quarta-feira seu curso online de formação política, aberto para não filiados e até bolsonaristas. Segundo a produtora executiva do curso, Manuela Borges, alcançar a diversidade é um desafio. A maioria dos 4.630 inscritos é composta por homens com ensino superior.

O presidente do diretório regional do Cidadania-AM, Elcy Barroso Júnior, foi convocado para gravar um vídeo rápido, de três minutos, sobre as atribuições dos vereadores. Em função do fim das coligações proporcionais, a expectativa é de que o número de candidatos por partido bata recorde. De olho no público jovem, as aulas seguirão um modelo de “game”. Nele, os alunos receberão pontos por suas respostas certas e avançarão de fase. Eles também podem pontuar interagindo nas lives do partido – gravações ao vivo via redes sociais.

O PSD oferece aplicativo aberto, com 20 aulas. O PDT segue a mesma linha, com opções para quem quer aprender marketing digital eleitoral.

Para Vitorino, as tentativas são positivas, mas há dicas obrigatórias para um resultado efetivo. “O tema das aulas deve ser pragmático, mexer com a vida das pessoas, como reforma da Previdência, preço da gasolina. A partir daí se fala da ideologia do partido. Outra coisa é oferecer uma mentoria, especialmente para os novatos, que não vão saber fazer uma campanha. E sempre lembrar que nem tudo dá para fazer pela internet. Like não aperta a mão, não toma café.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Adriana Ferraz
e Fernanda Boldrin

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