Durante os 25 anos em que o deputado federal Aroldo Martins (Republicanos-PR) viveu fora do País, a saúde ocular de seus filhos foi acompanhada por optometristas, chamados de “fisioterapeutas da visão”. De volta ao Brasil, no entanto, ele observou que a atividade ainda não estava regulamentada, o que o levou a criar uma frente parlamentar para defender a categoria.
Iniciativas como essa bateram recorde em 2019, quando 309 grupos de interesses específicos foram oficializados na Câmara – uma alta de 44% em relação a 2015, primeiro ano da legislatura anterior. Na avaliação de deputados, a sinalização de que o governo do presidente Jair Bolsonaro dialogaria com bancadas temáticas, e não com partidos, “serviu de combustível” para este aumento.
Entre as frentes mais atuantes estão a Evangélica, a da Agropecuária e a da Segurança Pública. Há outras menos conhecidas, como as frentes do alho, de doenças raras e dos jogos eletrônicos.
“Fiquei sabendo que em alguns Estados, como no Paraná, os optometristas não têm liberdade de exercer a profissão”, justificou Martins. Outros 211 parlamentares já aderiram ao grupo. O número alto de participantes, aliás, é um fator comum entre as frentes.
Criadas por meio de requerimento, elas reúnem congressistas de diferentes partidos. A Frente Parlamentar Mista da Beleza e Bem-Estar, por exemplo, busca defender os interesses de profissionais e empresas do ramo. O mesmo acontece com as frentes em defesa do café, do setor de serviços, da Baixada Fluminense, da conclusão das obras públicas inacabadas e dos esportes equestres.
Quase um terço das frentes registradas atende a interesses de setores ou de categorias profissionais. Caso da indústria brasileira de bebidas, por exemplo, que conta com dois grupos idênticos em sua defesa, propostos por Guiga Peixoto (PSL-SP) e Fausto Pinato (PP-SP) com um mês de intervalo.
Sem o poder de disciplinar representantes ou orientar votos, o efeito prático das frentes é reduzido. De acordo com as regras da Câmara, o único poder conferido a elas é o de requerer espaços físicos para reuniões.
Para serem constituídas, as frentes precisam da assinatura de pelo menos 171 parlamentares. Segundo o deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG), que assinou a favor da criação de 262 frentes, a subscrição é “uma questão de cortesia”. “Um deputado está formando uma frente e precisa de um número mínimo de assinaturas. Ele pergunta se não me importo de assinar. Aí eu assino, de maneira cordial”, afirma.
Para Andrada, o aceno que Bolsonaro fez no início do governo de que dialogaria com bancadas temáticas, e não com partidos, impulsionou a criação das frentes. “Serviu como um combustível”, afirma.
Já na análise do analista legislativo e doutor em ciência política Lourimar Rabelo, a proliferação de frentes se deu no contexto da grande renovação da Câmara em 2019, com parlamentares buscando “protagonismo”. “As frentes são um meio não legislativo de atuar e ganhar reconhecimento”, diz.
Mesmo sem poder regimental, as frentes mais atuantes servem como ponte entre o Congresso e setores específicos, podendo influenciar a pauta de votações. É de autoria, por exemplo, do deputado federal Marcelo Ramos (PL-AM), da Frente Parlamentar Mista de Apoio ao Mercado Imobiliário, o projeto de lei que amplia o prazo de redução da carga de tributos federais para incorporadoras e construtoras de projetos do Minha Casa Minha Vida.
“Na reunião de formação da frente, o presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) levantou essa questão (da tributação). Eu falei: ‘Pô’, esse problema tem solução legislativa e apresentei o projeto. Na votação houve o trabalho de mobilização da frente.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Fernanda Boldrin
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