Com a chamada “Minhocão ganha jardim”, o primeiro chegou a ilustrar a capa do Estadão. Cinco anos e mais seis jardins verticais depois, a maioria dessas paredes verdes não tem mais a aparência da inauguração, ressecadas pela falta de manutenção. A retirada de quatro dos jardins começou na última quarta-feira, e deve seguir pelas próximas semanas. Fruto de uma compensação ambiental, a Prefeitura de São Paulo agora vai pagar para desmontar as estruturas, ao custo de R$ 1,077 milhão.
A remoção foi reivindicada após a gestão Bruno Covas (PSDB) descumprir o acordo de manutenção, que previa o ressarcimento dos custos adicionais de energia e água (valores estimados de cerca de R$ 400 até R$ 1 mil mensais, para cada prédio). Insatisfeita, parte dos condomínios desligou o sistema de irrigação das plantas e levou o caso à Justiça, obtendo decisão favorável. Os três outros prédios decidiram seguir com as instalações.
Ex-síndico do Edifício Santa Cruz, Wendel Cardoso da Silva diz que a retirada foi motivada pelo descumprimento do acordo. “(Senão) iria continuar. Coisas foram prometidas e não foram entregues. Se tivessem pagado (as despesas), o mural estaria lá bonito. Quando quebra a confiança, fica difícil”, diz ele.
“Não conseguiram manter sete murais, que diria um Parque Minhocão”, comenta, ao se referir ao projeto da Prefeitura de criar um equipamento do tipo na área do Elevado João Goulart, na região central paulistana. “Foi uma falta de planejamento da Prefeitura. Fazem algo para ter impacto, tem o impacto e, depois desaparecem.”
Os sete jardins verticais foram instalados pela empresa Movimento 90º, contratada pela iniciativa privada após uma nova regulamentação municipal incluir a modalidade como forma de compensação ambiental. O acordo com os condomínios previa a manutenção e o ressarcimento de custos adicionais por três anos, dos quais os seis primeiros meses eram pagos pelas incorporadas e os demais eram de responsabilidade da Prefeitura, o que deixou de ocorrer há quase dois anos.
Todos as instalações foram feitas nas empenas cegas, fachadas laterais visíveis especialmente para quem transita pelo Elevado, chegando a 60 metros de altura, formando imagens distintas elaboradas por artistas. O custo tabelado para a intervenção era de R$ 891 por metro quadrado, resultando em um investimento de R$ 4 milhões para instalação e manutenção por seis meses nos sete imóveis, segundo estimativa da professora Pérola Brocaneli, da Universidade Mackenzie.
Sem água, com insetos
Com o desligamento do sistema de irrigação, parte dos moradores reclamou da maior presença de insetos. O ressecamento das plantas também preocupou o Edifício Bonfim após um laudo técnico apontar risco de incêndio. “(Por causa do jardim) também teve a negativa do Corpo de Bombeiros para o AVCB (Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros)”, conta a o advogado do condomínio, Julio Cesar da Silva, que pede na Justiça o pagamento de multa de R$ 200 mil pelo atraso na remoção.
Assim como o Bonfim, também serão retirados os jardins dos Edifícios Santa Filomena (onde está a fachada verde no formato de uma carranca), o Santos e o Minerva. Além disso, os imóveis também terão as empenas recuperadas. O trabalho deverá ser entregue em 90 dias, a contar de 1º de setembro.
“Essa retirada é um desperdício de dinheiro público, um descaso da atual gestão com o corredor verde do Minhocão”, lamenta o paisagista Guil Blanche, fundador do Movimento 90º. Ele considera que os condomínios estão “no seu direito” ao defenderem a retirada, mas critica a postura do Município por abrir mão da “pouquíssima” manutenção necessária.
“Vamos falar que custe R$ 5 mil por mês para todos, isso é R$ 60 mil por ano. Se dividir R$ 1 milhão por R$ 60 mil, são quantos anos (cerca de 16)? Estamos falando de algo que captura CO2 (gás carbônico), que é um negócio bacana para a paisagem. Por que não fazem como na (Avenida) 23 de Maio e licitem (a manutenção)?”
Procurada, a gestão Covas ressaltou que o acordo previa a retirada dos jardins após três anos nos edifícios que não aceitassem renovar o acordo. “Em 16/09/20, foi iniciada a montagem dos balancins e tapumes de um dos edifícios”, acrescentou. Além disso, ressaltou estar investindo na criação de 36 jardins de chuva, um tipo de canteiro rebaixado que auxilia no escoamento da água e redução dos efeitos de enchentes.
Restam três
Desenvolvido em uma ideia de design biofílico, os jardins verticais receberam elogios de moradores por auxiliar no conforto térmico e sonoro, além de atrair aves. Por isso, permanecerão nos Edifícios Huds, Santa Cruz e Blackford (da Universidade Mackenzie). A instituição de ensino admite, contudo, que “caso haja um enfraquecimento dessa política e a Prefeitura indique a impossibilidade de sua manutenção”, irá solicitar a retirada.
A síndica Dinah Moreira Allen conta que a preservação da fachada verde foi aprovada por unanimidade pelos condôminos do Santa Cruz. “O jardim é muito apreciado pelos moradores. Os apartamentos que compartilham a parede do jardim nunca tiveram problema de infiltração, têm até algumas vantagens, como diminuição de temperatura”, explica. “Os passarinhos vêm, e não só nos apartamentos que compartilham a parede. Teve relato de moradores que, depois do jardim, mais passarinhos passavam pela janela.”
Segundo ela, o custo adicional é de até R$ 20 para cada um dos 20 apartamentos. “Foi unânime o desejo de manter o jardim”, comenta. “Os moradores concordaram em pagar esse valor por mês. No futuro, podemos decidir cobrar esse dinheiro todo da Prefeitura. É um direito que nós temos, um dia podemos pedir ressarcimento.”
Além das três fachadas, a cidade ficará com o muro verde da 23 de Maio, que também chegou a ter problemas. A Prefeitura contratou este ano uma empresa para a manutenção, com custo mensal de R$ 128.376. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Priscila Mengue
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