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Para juristas, Sara Winter feriu ECA e Código Penal em caso de criança estuprada

A militante bolsonarista Sara Fernanda Giromini, a Sara Winter, usou as redes sociais para divulgar o primeiro nome de uma menina de 10 anos que engravidou após ser estuprada pelo próprio tio. Apesar de a publicação ter sido apagada depois, juristas afirmam ao Estadão que ela pode ter ferido ao menos quatro artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e do Código Penal.

A divulgação de dados da vítima de estupro aconteceu no domingo, 16, através da conta de Sara no Twitter. Na ocasião, a militante de extrema-direita publicou a identidade da criança e o endereço do hospital que faria o procedimento para interromper a gravidez, previsto em lei. Ela também chamou o médico responsável pela unidade de “aborteiro”.

Juristas afirmam que Sara Winter pode responder nas esferas criminal e cível por causa da exposição da menina. Para a advogada Cecilia Mello, ex-juíza federal e especialista em direito penal e administrativo, só do ECA ela poderia ser enquadrada em mais de um delito.

“O artigo 17 estabelece o direito ao respeito, que consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da identidade”, explica a jurista. “Com base nesse dispositivo já se evidenciam, em tese, a irregularidade e o dano causados pela conduta adotada em relação à criança, abrindo espaço, em consequência, para eventual reparação.”

A outra infração cometida seria ao § 1º do artigo 247, segundo avalia a especialista. A legislação proíbe exibir, total ou parcialmente, qualquer ilustração de criança ou adolescente, que se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de forma a permitir a identificação do jovem. A pena prevista é de multa de três a vinte salários – ou o dobro, em caso de reincidência.

Normalmente, o dispositivo serve para inibir exposição de pessoas com menos de 18 anos envolvidas em algum delito. Para Cecilia Mello, entretanto, ele também poderia ser aplicado ao caso da criança estuprada. “O tipo penal previsto, no meu entender, não pressupõe que tais imagens ou conteúdo sejam decorrentes de ato infracional imputado à criança ou adolescente, haja vista a expressão ‘atos que lhe sejam atribuídos’, ou seja, quaisquer atos”, diz.

Ex-presidente da Comissão de Direitos Infantojuvenis da OAB-SP, o advogado Ricardo de Moraes Cabezón também avalia que houve violação da lei. “Obviamente, o que foi feito está na contramão do ECA: a preservação o nome se dá para que a gente não permita uma estigmatização futura da criança”, afirma. “Em tese, a família poderia pedir não só o bloqueio da postagem como também, eventualmente, danos materiais e morais. Até porque se trata de um caso de aborto com previsão legal.”

Código Penal

Mestre em Direito Processual Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o advogado criminal Fernando Castelo Branco afirma que, em tese, Sara Winter também poderia responder por constrangimento ilegal e incitação de crime. Os delitos são previstos nos artigos 146 e 286, respectivamente, do Código Penal.

“O constrangimento teria sido gerado para os médicos, querendo proibi-los ou ameaçando-os a não fazer algo que a própria lei permite”, explica o advogado. Neste caso, a pena prevista é de três meses a um ano de prisão.

Já a incitação, com pena de três a seis meses ou multa, seria por divulgar o nome do hospital e incentivar a pessoas a ir ao local impedir que o procedimento fosse realizado. “De que forma seria impedido esse aborto? Seria uma coação moral ou uma violência física”, afirma.

Líder do movimento “300 do Brasil”, Sara Winter já responde a inquérito sobre atos antidemocráticos contra o Supremo Tribunal Federal (STF), motivo pelo qual chegou a passar nove dias presa neste ano. Beneficiada por um habeas corpus, ela usa tornozeleira eletrônica desde junho.

Para Castelo Branco, a exposição da criança também poderia prejudicá-la em sua defesa no processo anterior. “Pode se complicar, porque há o aspecto subjetivo que acaba influenciando o julgador, o Ministério Público e a coletividade”, afirma.

Por Felipe Resk

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