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Estado de SP é condenado a indenizar homem que perdeu rim e parte do intestino

Os desembargadores da 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) mantiveram decisão que condenou o Estado a indenizar um morador de Araraquara que teve que retirar um de seus rins e parte de seu intestino grosso após ser agredido por policiais militares. Em votação unânime, a Corte ainda deu parcial provimento a um recurso da Defensoria Pública e aumentou o valor da reparação a ser paga à vítima, de R$ 30 mil para R$ 70 mil.

A decisão foi dada durante julgamento realizado no dia 10 de junho. O caso foi divulgado pela Defensoria na última quarta, 8, dias antes de vir a público o caso de uma mulher negra de 51 anos que levou três socos e teve a tíbia quebrada ao levar uma rasteira de um PM. Depois, o policial pisou no pescoço da mulher.

As agressões que resultaram na condenação da Fazenda Pública ocorreram em agosto de 2015, na Delegacia, após prisão em flagrante do homem. Segundo os autos, ele chegou a casa de sua irmã, ‘alcoolizado e sob o efeito de entorpecentes’, e teve ‘um desentendimento’ com sua mãe. A polícia foi acionada por ‘tentativa de agressão’ e o homem e sua mãe foram levados para o Plantão Policial para registro de ocorrência.

Após a lavratura do B.O., a mãe foi liberada e informada de que seu filho continuaria detido até ‘que os efeitos do álcool e dos entorpecentes se amenizassem’. No entanto, o homem não voltou para casa.

Após procurar informações sobre seu paradeiro, a família foi informada que o homem tinha sido levado a uma Unidade de Pronto Atendimento e depois transferido para a Santa Casa de Araraquara. Nesta última teria passado por dois procedimentos cirúrgicos – nefrectomia e retirada parcial de cólon.

Em depoimento pessoal, a vítima relatou que foi agredido com cassetetes e chutes tanto quando foi algemado, quanto no transporte até a viatura policial. Narrou alinda que na delegacia foi algemado junto a um corrimão e que os policiais ‘começaram a caçoar dele mediante o acesso a seu celular, tendo-se iniciado uma discussão’.

“No curso da discussão, descreveu que recebeu tapas em seu rosto e chutes no abdômen, ocasião em que desmaiou. Acordou na carceragem da delegacia sofrendo com dores e vomitando sangue”, registra o acórdão da 1ª Câmara de Direito Público do TJ-SP.

‘Desestimular ilícitos semelhantes’

No recurso apresentado à Corte, pedindo o aumento da indenização determinada em primeira instância, o defensor público Matheus Bortoletto Raddi destacou que, em razão das agressões, o homem teve sequelas permanentes que o acompanharão pelo resto da vida, como ‘trânsito rápido e vômitos’. Além disso, apontou que a vítima correu risco de morte em razão da rotura do rim direito, que ocasionou sangramento intra-abdominal.

Segundo a Defensoria, Raddi também ressaltou a necessidade de desestimular a prática de atos ilícitos semelhantes por parte do Estado, ‘visando impedir a reiteração de práticas como a narrada nos autos, que contrariam a Constituição Federal e Tratados Internacionais ratificados pelo Brasil’.

“Em que pese o acerto do pronunciamento judicial recorrido quanto à caracterização da responsabilidade civil, entende-se, data máxima vênia, que o valor fixado a título de danos morais não é suficiente para reparar os gravíssimos danos sofridos pelo demandante e, mais, para desestimular a prática de condutas semelhantes pelo Estado”, sustentou Matheus Raddi.

A Fazenda Pública do Estado de São Paulo também recorreu da decisão de primeiro grau, alegando que ‘não restou demonstrado nos autos que os danos alegados pelo autor foram decorrentes de agressões de agentes públicos’.

“Deste modo, excelências, muito embora o recorrido tenha suportado lesões, em nenhum momento trouxe provas de que aquelas teriam decorrido de agressão por parte de Policiais Militares, não fazendo, portanto, prova do nexo de causalidade entre as lesões sofridas e a conduta dos agentes do Estado”, alegou o Estado, segundo o acórdão da 1ª Câmara de Direito Público da corte paulista.

Atuação abusiva e o dever da polícia de garantir a ‘incolumidade’ das pessoas

Ao analisar o caso, o desembargador Marcos Pimentel Tamassia, relator da ação, considerou que restou configurado que o corpo policial envolvido no caso atuou de forma abusiva, restando caracterizada a responsabilidade civil do Estado.

“A partir de todos os documentos e provas acostadas nos autos, é possível concluir que o autor sofreu as mencionadas lesões enquanto esteve detido na Delegacia Seccional de Araraquara, de modo que, igualmente, pode-se concluir que o autor foi vítima de agressões perpetradas por agentes da mencionada unidade policial. Assim, em contraponto ao sustentado pela ré, é possível firmar nexo de causalidade entre o ato ilícito dos agentes da Administração Pública Estadual e os danos suportados pelo autor, de maneira que resta configurada a responsabilidade civil do Poder Público Estadual”, registrou.

Além disso, o magistrado determinou que a Fazenda Pública do Estado de São Paulo informe as medidas tomadas a fim de responsabilizar regressivamente os agentes públicos envolvidos no caso.

Em seu voto, o desembargador pontuou que a Constituição Federal atribuiu, dentre outras funções, o dever de a polícia garantir a ordem pública e a incolumidade das pessoas.

“Por mais que os agentes policiais possuam a prerrogativa de deter particulares, caso as circunstâncias fáticas justifiquem tal medida, ao utilizar desta prerrogativa com o fim de cometer agressões e, até mesmo, torturar os administrados, a medida se desviou do interesse público e, neste caso, a conduta dos agentes estatais configura-se como patente abuso de poder, na modalidade excesso de poder.”

COM A PALAVRA, O GOVERNO DO ESTADO

Até a publiação desta matéria, a reportagem não havia obtido contato com o governo do Estado. O espaço permanece aberto a manifestações.

Por Pepita Ortega e Fausto Macedo

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