A Polícia Civil de Pernambuco (PCPE) convocou uma coletiva de imprensa nesta quarta-feira, 1º, para apresentar a conclusão das investigações do caso de Miguel Otávio Santana da Silva, de 5 anos, que morreu há quase um mês, no dia 2 de junho, ao cair do nono andar, numa altura de 35 metros, de um dos prédios do Condomínio Pier Maurício de Nassau, no centro do Recife. De acordo com o delegado responsável, Ramon Teixeira, a então patroa da mãe do Miguel, Sarí Corte Real, vai responder juridicamente por abandono de incapaz com resultado morte, podendo pegar até 12 anos de prisão – um agravamento quatro vezes maior que no previsto pela autuação inicial, de homicídio culposo.
De acordo com o delegado Ramon Teixeira, a mudança na tipificação penal é comum quando alguém é autuado em flagrante e depois o caso passar por investigações, mostrando novos fatos e levando a outras conclusões, chegando a um indiciamento diferente. “O auto de prisão em flagrante inicia o processo investigatório, não encerra. Então, a investigação teve continuidade. O que observamos na sequência das investigações foi bastante importante”, afirmou o delegado.
Inicialmente, Sarí foi autuada por homicídio culposo, quando não há a intenção de matar. Segundo Teixeira, a resposta jurídica inicial foi tomada com base nas primeiras imagens de segurança do elevador e no depoimento da empregada doméstica e mãe de Miguel, Mirtes Renata Santana de Souza. Para ele, a resposta era necessária e não foi equivocada, mas as investigações mostraram outros elementos, que fizeram mudar a tipificação.
Em depoimento à polícia na última segunda-feira, 29, Sarí Corte Real teria dito ao delegado que não apertou o botão da cobertura do elevador ao deixar Miguel sozinho, apesar das imagens de vídeo mostrarem ela fazendo o movimento, mas que teria simulado o gesto para convencer o menino a sair do elevador.
Para o delegado, o trabalho da PCPE e do Instituto de Criminalística (IC) foi essencial para verificar que Sarí Corte Real cometeu um crime preterdoloso, já que Miguel foi intencionalmente abandonado, mas a morte dele não era a projeção de Sarí. “Independentemente da ação de pressionar ou não a tecla da cobertura, o que nós entendemos como relevante já no auto de prisão em flagrante delito foi a conduta omissiva de permitir o fechamento da porta deixando Miguel sozinho. Aquilo, sim, tem valor jurídico-penal bastante relevante, inclusive para responsabilização penal da investigada”, explicou.
Ainda segundo o delegado, ao comentar as imagens de segurança, teria havido uma irritação de Sarí depois de tentar tirar Miguel seis vezes dos elevadores. “Ela, simulando ou não apertar o botão, imediatamente retira o braço e permite consciente e livremente o fechamento da porta e ainda é capturada pelas imagens se dirigindo à porta corta-fogo. Isso se soma ao fato de que o painel tem a numeração do andar em que se encontra o elevador. Então seria perfeitamente possível acompanhar para que andar se dirigia. O que, de forma bastante robusta nos autos, a gente consegue demonstrar que a moradora não fez e ela própria admite isso. Somando a outros elementos de prova, a exemplo do depoimento da manicure que lá trabalhava, de que a moradora retorna ao apartamento para retomada do serviço de manicure, do tratamento e embelezamento das unhas, quando rapidamente acontece a tragédia”, destacou Ramon Teixeira afirmando que isso já configura o dolo de abandono.
O que diz a defesa
Procurado pelo Estadão nesta quarta-feira, 1º, O advogado de defesa de Sarí, Pedro Avelino, disse que não havia previsibilidade de que uma tragédia acontecesse a Miguel. “Não havia, naquele contexto, previsibilidade da tragédia. O filho dela (de Sarí), e isso está demonstrado nos autos (do inquérito policial), andava no elevador sozinho e outras crianças do prédio também, como a amiga do filho dela, que tinha 5 anos também e ia para a casa dela desacompanhada. Você pode criticar, condenar, essa conduta, mas essa conduta não é criminosa”, afirmou Avelino.
Já o delegado disse que as investigações perceberam que o crime era totalmente previsível. “Segundo o levantamento do perito criminal André Amaral, aproximadamente 60% das unidades condensadoras das lajes técnicas daquela coluna apresentavam tela de proteção, 40% não. Nós temos um cenário em que uma pequena maioria de moradores enxergou os riscos daquela área desprotegida e, ao mesmo tempo, parcela expressiva das áreas técnicas não tinham proteção”, disse.
A conduta de permitir o fechamento da porta do elevador, segundo Teixeira, “claramente intencional, com dolo de abandonar, conduziu a criança à área de insegurança e não é difícil de prever que, tendo incontáveis áreas, espaços comuns e privativos de um condomínio vertical, incontáveis eram os riscos existentes, a exemplo de escadarias, lajes técnicas desprotegidas, piscina”. “Diversas poderiam ser as formas de alcançar resultados trágicos indesejáveis”, continuou.
Por Pedro Jordão, especial para o Estado
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