O mercado financeiro e de infraestrutura segue aguardando mais diretrizes para estruturar operações com as novas debêntures, apesar de já ter sido divulgado na última semana de março o decreto que regulamenta o instrumento para financiar o setor.
A Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib) estima que o setor fará mais de R$ 1 trilhão em investimentos até 2027, levando em conta as concessões e PPPs de origem federal, estadual, distrital e municipal. Mas do lado dos potenciais emissores, por enquanto, o compasso é de espera já que não é possível desenhar uma captação com as novas debêntures sem detalhes de enquadramento que virão de cada um dos ministérios e da Receita Federal. Havia grande expectativa com essa divulgação, aguardada para a segunda semana de fevereiro, após o carnaval.
“É o caminho natural de um novo instrumento de investimento”, disse o sócio e gestor de infraestrutura da Kinea, Aymar Almeida.
Para ele, a primeira emissão pode levar algum tempo, dependendo de complementos pendentes e que ainda faltam ser divulgados. “Uma vez havendo os detalhes, as companhias vão fazer contas entre as debêntures de infraestrutura e as incentivadas. As grandes empresas devem vir primeiro”, acrescenta.
O executivo de um grande banco, que preferiu não se identificar, afirma também que apesar do apelo aos fundos de pensão, não é garantido que esses investidores assumam boa parte dos papéis que vierem ao mercado. Ele diz que os fundos de pensão devem continuar evitando a tomada de risco, já que, as debêntures de infraestrutura não devem oferecer retornos excepcionais em relação a outros instrumentos nos quais esses fundos já investem.
Almeida, da Kinea, diz que o apetite dos fundos de pensão e das seguradoras dependerá da estrutura da emissão, da empresa que estiver acessando esse mercado e principalmente o nível de taxa de retorno. “Esses investidores institucionais têm tudo para fazer o papel de financiar a infraestrutura, mas resta saber se as estruturas farão sentido”, afirma Almeida.
Critérios e Condições
O decreto trouxe as regras de enquadramento e os novos setores e substores que passaram a ser prioritários e passíveis de usar a nova debênture para financiar projetos relacionados à infraestrutura. Mas não veio acompanhado dos critérios e condições complementares para o enquadramento dos projetos de cada um dos ministérios, o que impede que as empresas desenhem os financiamentos nesse momento. Os ministérios poderão, de acordo com o texto do documento divulgado na semana passada, limitar tal enquadramento a determinados subsetores ou tipos específicos de projetos.
Especialistas ouvidos pelo Broadcast ficaram também em dúvida sobre a possibilidade do uso dos recursos das debêntures de infraestrutura para pagamento de outorgas, uma vez que não há nada específico no texto do decreto. “Pode ser que os ministérios setoriais, quando lançarem as portarias específicas de cada setor, esclareçam. Minha impressão maior é que houve uma transferência do assunto para os ministérios, que têm de divulgar portarias específicas e complementares, que poderão limitar (outorga) a subsetores e tipos de projetos”, afirmou o sócio da área de mercado de capitais do Cescon Barrieu, Fernando Gomes em conversa com o Broadcast(sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado).
A questão do uso dos recursos para pagamento de outorga veio ao mercado nos últimos dias, causando preocupação quanto ao impacto de uma eventual vedação na eficiência do novo instrumento de captação. A preocupação é de que uma parte dos possíveis emissores acabe não usando essa opção.
Para o presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Venilton Tadini, o texto é claro. “A rigor, não há impedimento para uso dos recursos no pagamento de outorgas, porque não está vedado no texto do decreto”, afirmou.
Segundo ele, haviam minutas em que se discutia a vedação, o que foi retirado. “A grande preocupação do governo nesse ponto era que, em projetos (concessão) de entes subnacionais houvesse superavaliação de outorgas para levantar caixa por estados e municípios”, disse. Dessa forma, acrescenta, o governo procurou evitar potenciais desequilíbrios financeiros nos projetos e a transferência indireta de recursos federais para estados e municípios.
O sócio da Kinea comenta ainda que faltam os esclarecimentos importantes sobre o cálculo da dedução para emissões que tenham a NTN-B, que é indexado à inflação, como base de referência no juro.
As novas debêntures de infraestrutura oferecem benefício fiscal ao emissor, na forma de uma redução de 30% da base de calculo do IR e da CSLL sobre o lucro de juro pago aos detentores dos títulos. “É preciso aguardar o parecer da Receita Federal sobre qual será a regra para essa dedutibilidade, isso vai ser fundamental para que a empresa decida se vai par um lado ou outro”, afirma Almeida.
Por Cynthia Decloedt
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