A ocupação de leitos específicos para o tratamento dos pacientes com suspeita ou confirmação para a infecção pelo novo coronavírus atingiu a capacidade máxima em Natal e Mossoró, as duas maiores cidades do Rio Grande do Norte, ao longo do fim de semana. Foi a primeira vez desde o início a pandemia de covid-19, que estes municípios atingiram o pico de uso desses leitos simultaneamente. Até a noite do domingo, 7, a Central de Regulação da Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap/RN), contabilizava 11 pacientes em estado crítico, aguardando um leito de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).
Apesar da pressão sobre o sistema público de saúde, o titular da Sesap/RN, Cipriano Maia, declara que ainda não é possível afirmar que o Estado encara o pico da doença. Em uma semana, o número de mortes pela covid-19 no Rio Grande do Norte cresceu 26,9% (de 323 óbitos no dia 1.º de junho para 410 no dia 6 de junho), conforme dados mais atualizados da Sesap/RN. Mesmo com todos os leitos para o tratamento da doença ocupados nas cidades consideradas epicentros no Estado, Cipriano Maia evita confirmar que o sistema de saúde local está colapsado.
“A taxa de ocupação de leitos críticos e a crescente demanda nas portas de urgência, associados aos baixos índices de isolamento social vigentes até a semana passada, têm produzido uma situação de estresse máximo sob os serviços de saúde”, explicou Cipriano Maia. O governo do Rio Grande do Norte prevê abrir mais 114 leitos para tratar casos da pandemia nos próximos 15 dias. Desses, 63 serão de UTI.
Dos 219 leitos abertos pelo Estado desde o início da pandemia, 171 estão ocupados hoje. Outros 12 encontram-se disponíveis e 37 bloqueados. O Rio Grande do Norte poderia ter mais leitos à disposição da população com sintomas ou confirmados para o novo coronavírus. Entretanto, 51,4% do total dos leitos bloqueados se encontram nesse status por falta de mão de obra. O Estado enfrenta dificuldades para ampliar o quadro de profissionais de saúde para atuar no combate à pandemia. Nem mesmo os processos seletivos simplificados foram capazes de preencher as vagas temporárias abertas pela Sesap/RN nos últimos 60 dias.
Corrida contra o tempo
Ao longo de 30 anos de funcionalismo público no Hospital Universitário Onofre Lopes (HUOL) em Natal, a enfermeira Neide Rodrigues da Silva Santos, de 69 anos, ajudou milhares de pacientes. Durante quatro dias, vendo o filho apresentar todos os sintomas de infecção para a covid-19 e desenvolvendo quadro de falta de ar, ela entrou em desespero.
“Ajudei salvar muitas vidas e hoje me desespero para salvar a vida do meu filho e tenho as mãos atadas”, relata emocionada. A enfermeira aposentada atuou a maior parte da sua vida profissional tratando de pacientes internados em leitos de UTI. E foi justamente pela falta de um deles, anos depois da sua aposentadoria e dessa vez para o filho de 45 anos, o sargento da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, Robson Cosme de Souza, que ela fez um apelo após tantas negativas das autoridades de saúde locais.
“Fiz um apelo nas redes sociais. Mexi com os grandes, que não querem ser expostos. Eu procurei, falei com A, B e C. Não recebi nenhum apoio da Corporação (PMRN). Ninguém de lá fez nada mesmo sabendo que ele se infectou enquanto trabalhava, defendendo a população. Ele se infectou trabalhando”, afirmou Neide Santos.
Robson Cosme de Souza ficou numa cadeira reclinável, onde recebia soro e respirava com ajuda de aparelhos, por quatro dias. “Meu filho não conseguia se levantar para fazer xixi de tão cansado que ficava. Faltava ar e ele estava piorando”, relembrou a mãe angustiada. Somente após a repercussão do caso nas redes sociais, a Sesap/RN conseguiu transferir Robson Cosme para um leito de UTI do Hospital da Polícia Militar, referenciado para a covid-19, na zona leste de Natal.
No início de maio, dois idosos morreram à espera de leito de UTI. Ambos apresentavam sintomas para a covid-19 e a burocracia da regulação dos leitos retardou a liberação da vaga. Eles não resistiram e morreram nas Unidades de Saúde de Ipanguaçu e São Rafael, na região oeste do Rio Grande do Norte.
Por Ricardo Araújo, especial para O Estado
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