A América Latina é considerada o novo epicentro da pandemia de covid-19 e a projeção é de que o Brasil pode chegar a 88.300 óbitos em agosto deste ano.
A conclusão é da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), divulgada hoje (26) em entrevista coletiva semanal sobre o novo coronavírus, realizada de forma virtual. A organização ressaltou a importância de atenção à associação da covid-19 com outras doenças não transmissíveis, como câncer, diabetes, hipertensão e obesidade.
A diretora da Opas, Carissa Etienne, disse que a organização utiliza um modelo próprio de projeções diárias para respaldar a avaliação das necessidades dos países e que o modelo tem limitações, mas projeta cenários que variam de acordo com a resposta de cada país à pandemia.
“Na América do Sul, o Brasil, o Peru, o Chile, o Equador e a Venezuela seguem aumentando (os números de casos diários e mortes). Bolívia e Paraguai mostram uma diminuição pequena. Mas, no Brasil, o modelo informa que as mortes diárias apresentam um aumento exponencial, chegando, no dia 4 de agosto, a 88.300 mortes. É o que se projeta”, afirmou Carissa.
A América Latina ultrapassou a Europa e os Estados Unidos em número diário de infecções pelo novo coronavírus. São números menores do que a realidade, suspeitam os especialistas da Opas. A diretora ressaltou que dois dos três países no mundo com maior número de casos registrados se encontram atualmente nas Américas (Estados Unidos e Brasil).
“Na América do Sul, estamos especialmente preocupados com o número de casos novos registrados na semana passada no Brasil, que foi o mais alto durante um período de sete dias, desde que começou o surto. Peru e Chile registraram também uma alta incidência, sinal de que a transmissão ainda está acelerando nesses países”, afirmou.
Segundo Carissa, para a maioria dos países das Américas, este não é o momento de flexibilizar as restrições e reduzir as estratégias de prevenção. “É o momento de seguir fortes, vigilantes e implementar agressivamente as medidas de saúde pública comprovadas. A vida e o bem-estar de milhões de pessoas em nossa região dependem disso.”
Distanciamento
O vice-diretor da Opas, Jarbas Barbosa, ressaltou a importância das medidas de distanciamento para achatar a curva de contaminação do vírus e reduzir a velocidade de transmissão.
“Já temos experiências de países e cidades em que, quando a transmissão ocorre sem medidas para deter a velocidade (de propagação), os serviços de saúde podem e vão ter suas capacidades esgotadas. E é muito importante também revisar o que está acontecendo com a adoção das medidas, porque, para que se tenha sucesso, é importante a adesão da população. Ao mesmo tempo, tem que ampliar a capacidade de testar. Testar todos os pacientes suspeitos, os que tiveram contatos com esses pacientes e isolá-los de maneira adequada – essa é uma maneira muito efetiva de seguir detendo a transmissão do vírus. E o terceiro pilar é uma boa preparação dos serviços de saúde. Essa é a combinação que pode propiciar que o país tenha a redução que precisa”, afirmou.
Barbosa destacou também a trajetória de propagação do novo coronavírus, começando na Ásia e se espalhando por Europa e América do Norte, chegando depois na América Latina.
“Os países da América Latina tiveram um período de preparação, e isso foi muito importante, pois muitos países implementaram seus planos e adotaram medidas de distanciamento social, que retardaram a transmissão. Mas, agora, temos uma transmissão muito forte e, por isso, é necessário chamar a atenção de todos os ministérios de saúde, para avaliar a efetividade das medidas que estão adotando. Vamos ter semanas duras por diante”, disse o vice-diretor.
Informações corretas
O diretor do Departamento de Doenças Transmissíveis da Opas, Marcos Espinal, afirmou que a América Latina é uma região de grande iniquidade e que é importante que as pessoas recebam informações corretas. “Estamos em uma pandemia com um vírus muito difícil, mas também há muitas notícias falsas e é importante educar as pessoas sobre os fatos reais.”
Espinal afirmou que a Opas está preocupada com Brasil e que o mais importante agora é aumentar o número de testes. “As previsões para o Brasil, não só no modelo da Opas, mas em vários modelos, mostra que se a epidemia segue em aumento”.
Associação a outras doenças
A diretora da Opas chamou a atenção para o impacto desproporcionado que o novo coronavírus tem em pessoas que sofrem de doenças não transmissíveis como hipertensão, doenças cardiovasculares, diabetes, câncer, asma e outras doenças respiratórias, além da obesidade.
“Nunca vimos uma relação tão nefasta entre uma doença infecciosa e as não transmissíveis. Alguns dados são verdadeiramente alarmantes, especialmente em nossa região, onde há muitíssimas doenças não transmissíveis. Estudos na China mostram que mais de 28% dos pacientes com câncer que contraíram a covid-19 morreram, comparado com somente 2% do total de pacientes. Há 1,2 milhão de pessoas que vivem com câncer na América Latina e no Caribe”, relatou Carissa.
Outra fonte de preocupação é com os fumantes. “Fumar causa câncer, doenças pulmonares e está associado diretamente à redução da capacidade respiratória. Aliás, fumar aumenta a probabilidade de se desenvolver uma doença grave, resultado da covid 19. Cerca de 15% dos adultos nas Américas ainda fuma e podem enfrentar esse risco.”