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Quebra de safra pressiona a inflação

A seca que atingiu nos últimos meses os três Estados do Sul e Mato Grosso do Sul e a chuva torrencial no Nordeste começaram a apresentar a conta. Estimativas da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) apontam, até o momento, uma quebra de 25,2 milhões de toneladas na produção de grãos por causa da estiagem. Neste pacote, estão soja, arroz e as primeiras safras de milho e feijão.

A oferta mais apertada de alimentos já bateu nos preços ao produtor e começa a chegar ao prato do brasileiro e aos índices de inflação. Em janeiro, a alta dos alimentos respondeu sozinha por 43% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), de 0,54%, a medida oficial de inflação. Também em janeiro, o valor da cesta básica de alimentos apurada pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) subiu em 16 de 17 capitais pesquisadas.

“Alimentos poderão ser de novo uma surpresa negativa na inflação deste ano”, diz o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sergio Vale, que revisou de 4,7% para 5,8% o IPCA de 2022, em razão dos preços da comida e da gasolina.

André Braz, coordenador dos índices de preços da Fundação Getúlio Vargas (FGV), subiu de 5% para quase 6% a expectativa de inflação para o ano. “Metade desse aumento é por conta da alimentação, e o restante é petróleo e tarifas.”

O milho, que tinha encerrado 2021 com recuo de 0,02% ao produtor, aumentou 8,40% em janeiro. A soja subiu 0,89% em dezembro e 5,55% em janeiro, e o farelo de soja, 2,14% em dezembro e 14,17% em janeiro.

EFEITO CASCATA

A disparada das cotações do milho, da soja e do farelo provavelmente terá desdobramentos nos preços ao consumidor das carnes de suínos e aves e do leite nos próximos meses, já que esses insumos são a base da criação dos animais, observa Braz.

“É prematuro dizer que há pressão inflacionária”, pondera o diretor de Política Agrícola e Informações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) do Ministério da Agricultura, Sergio De Zen. Ele argumenta que a segunda safra, que responde por 80% da produção brasileira do milho, ainda está sendo plantada.

A Conab estima que a safra total de grãos do País para este ano deve atingir 268,2 milhões de toneladas, portanto 22,8 milhões a menos do que as projeções iniciais, mas, mesmo assim, mais do que a anterior, de 252,7 milhões de toneladas.

CUSTO DA ESTIAGEM

Produtores de grãos dos três Estados do Sul e de Mato Grosso do Sul vão deixar de embolsar R$ 71,87 bilhões nesta safra por causa da forte estiagem. O prejuízo, calculado pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), considera as perdas registradas até o momento, conforme os preços de mercado dos produtos. Se forem incluídas as quebras da produção de frutas do Vale do São Francisco, em razão das chuvas no Nordeste, essa conta sobe para R$ 72,47 bilhões.

Maciel Silva, coordenador de Produção Agrícola da CNA, responsável pelas projeções, ressalta que estão de fora dessa cifra os efeitos negativos da estiagem sobre as pastagens, que têm desdobramentos sobre a produção de carne bovina e de leite. “Houve perdas expressivas nas pastagens, mas ainda a gente não consegue mensurar.” Na sua avaliação, o milho que é o grão essencial para alimentação de suínos, bovinos e aves, deverá ser o produto mais crítico no abastecimento nos próximos meses.

No Rio Grande do Sul, por exemplo, a seca provocou a quebra de 70% na produção do milho da primeira safra e 48,7% na soja. “Essa é a estimativa até 22 de janeiro, mas de lá para cá as coisas pioraram”, afirma o presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado do Rio Grande do Sul (Fecoagro-RS), Paulo Pires.

André Dobashi, presidente da Associação dos Produtores de Soja (Aprosoja) de Mato Grosso do Sul, outro Estado afetado pela seca, conta que os agricultores que acionaram o seguro enfrentam dificuldades por causa da grande quantidade de sinistros. “Há disputa por peritos nas seguradoras”, conta.

Já no Paraná, outro Estado também afetado pela seca, apenas 40% das áreas têm seguro agrícola. Flávio Turra, gerente técnico da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), explica que a maior parte dos produtores paranaenses planta com recursos próprios e, portanto, acaba não fazendo seguro vinculado ao crédito rural. “O produtor das regiões mais afetadas vai ter prejuízo, e será grande”, observa.

SECA

O produtor e agrônomo José Antônio Borghi, de 62 anos, que cultiva 500 hectares de soja em Maringá, no norte do Paraná, nunca tinha presenciado uma seca tão forte. “Faz 50 anos que planto soja com a minha família e não vi nada parecido.” Foram cerca de 80 dias, desde fins de novembro, praticamente sem chuvas e com temperaturas extremamente altas. “As plantas foram morrendo”, conta.

Enquanto o produtor do Paraná sente no bolso os efeitos da estiagem, Jailson Lira de Paiva, que há 22 anos cultiva 40 hectares de uva de mesa em Petrolina (PE), no Vale do Rio São Francisco, enfrenta uma realidade completamente diferente. Desde 20 de outubro, um mês antes do habitualmente previsto, o período de chuvas começou em Petrolina.

Neste ano, já choveu mais de 500 milímetros em algumas áreas, e o normal é em torno de 450 milímetros o ano inteiro.

O produtor, que esperava colher 1 milhão de toneladas de uva de mesa nesta safra, calcula que vai tirar entre 500 mil e 600 mil toneladas. E a quebra na produção, segundo ele, já começou a se refletir nos preços. “Mas não há resultados positivos para o produtor porque os volumes colhidos são muito pequenos e, mesmo com as cotações elevadas, não é possível recuperar as perdas.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Márcia de Chiara

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