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O homem dorme ao lado de mais de mil homens todas as noites no albergue Arsenal da Esperança, o maior centro de acolhimento de São Paulo, na zona leste da capital. Dividindo espaço com moradores de rua em beliches a um metro de distância uma da outra, o homem, de 30 anos, sente medo de a aglomeração de pessoas no local virar um foco de disseminação do coronavírus.
“Os abrigos têm pouca ventilação e quartos grandes com exaustores ligados a noite toda… fica batendo vento e quem tem complicação respiratória sempre começa a tossir e espirrar”, relata. Assim como ele, grande parte das mais de 24,3 mil pessoas em situação de rua da cidade não tem onde se abrigar com segurança.
Dados do último Censo da População em Situação de Rua de São Paulo apontam que 11,7 mil delas dormiram em centros de acolhida em 2019.
Outro morador de rua, de 34 anos, dorme no mesmo abrigo há mais de um ano e conta que ele e colegas não receberam amparo suficiente. “(Não estão oferecendo) máscara, álcool gel (para levar para fora do albergue, já que não podem passar o dia dentro da unidade) e fecham completamente parques e locais públicos onde a gente poderia se abrigar sem ficar amontoados.”
No Centro Temporário de Acolhimento (CTA) da Mooca, funcionários disseram ao jornal O Estado de S. Paulo que a única recomendação que haviam recebido até quinta-feira, 19, era de que servidores deveriam usar máscaras e os moradores de rua entrariam no local em pequenos grupos para fazer a triagem, reduzindo o contato. Assistentes sociais disseram que estão com pontos de álcool gel dentro das unidades, pedindo para todos lavarem as mãos com frequência e voltarem para a casa de parentes, se possível. Relataram ainda que máscaras estão sendo distribuídas.
O Ministério Público de São Paulo recomendou à Secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social (Smads) da Prefeitura, na segunda-feira, medidas para ampliar a prevenção, como obras emergenciais para reforçar a ventilação natural dos dormitórios. Ao todo, o município conta com 89 centros de acolhimento, totalizando 17,2 mil vagas. A Smads informou que “prestará os esclarecimentos”.
Pias serão instaladas no centro da cidade, onde se concentra o maior número de pessoas nesta situação para que possam fazer higienização. Ao jornal O Estado de S. Paulo, o governador João Doria (PSDB) disse que não faltará assistência. “Não seremos omissos nem levianos com a população de rua e estaremos ao lado das prefeituras no acolhimento de quem mais precisa.”
Solidão
O problema se repete em Brasília. Na rodoviária da capital federal, a três quilômetros do Palácio do Planalto, onde o presidente Jair Bolsonaro abraçou pessoas uma semana atrás, um morador de rua de 53 anos – que, como os outros, não quis se identificar – afirma que está com medo da doença, mas que vê riscos de, antes, morrer de fome. “A gente fica com medo. Mas para mim, a tristeza mesmo é não ter o que comer. Eles fecharam tudo. A gente tá ficando sozinho na rua.”
Sem abrigo para todos, em muitas situações essas pessoas preferem seguir nas ruas. “Eu prefiro a rodoviária, melhor que ficar no albergue. Aqui tem luz, tem câmera filmando a gente, é menos perigoso”, diz outro morador de rua de 45 anos.
Em Brasília, o governo começou a catalogar a população em situação de rua – foram identificados, até o momento, 1.851 cidadãos.
Os idosos são prioridade. A primeira medida tomada foi verificar a existência de algum vínculo familiar ou comunitário, para que o idoso retorne à família de origem. Se não houver, a pessoa será encaminhada para uma unidade de acolhimento. Um serviço especializado em abordagem social tem procurado informar as pessoas sobre os riscos da doença e distribuído máscaras.
Na Esplanada dos Ministérios, sentado em uma calçada, Marlon Alves ajusta uma máscara suja de fuligem em seu rosto. “Falaram para eu usar. Vai ficar tudo bem. Não tenho medo, não.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por André Borges e Caio Nascimento
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