O ambiente externo benigno para ativos de risco na maior parte da sessão desta segunda-feira, 2, abriu espaço para o real recuperar parte das perdas expressivas da semana passada, embora ainda pairem sobre o mercado temores de deterioração do quadro fiscal e recrudescimento de ruídos políticos, com a retomada dos trabalhos da CPI da Covid e os ataques do presidente Jair Bolsonaro ao sistema eleitoral.
Depois de disparar na sexta-feira e fechar em alta 2,57%, acumulando valorização de 4,76% em julho, o dólar à vista trabalhou em queda durante todo o dia e chegou a tocar na casa de R$ 5,11 no início da tarde, ao descer até mínima de R$ 5,1147, em meio à realização de lucros e ajustes de posições.
Com uma leve recuperação nas últimas horas de negócios, em linha com o ambiente externo e a perda de fôlego da Bolsa brasileira, a moeda americana encerrou o dia negociada a R$ 5,1653, em queda de 0,86%.
Lá fora, o DXY – que mede o desempenho do dólar frente a seis moedas fortes – recuava 0,11%, aos 92,069 pontos. A moeda americana tinha um desempenho misto em relação a divisas emergentes, com leve alta ante o peso mexicano e forte queda na comparação com o rand sul-africano, ambos pares do real.
O gestor da Vitreo Rodrigo Knudsen ressalta que o dólar se enfraqueceu hoje em relação às principais moedas do mundo e recuou por aqui em um ajuste natural, com o real recuperando “parcialmente” as perdas de sexta-feira. “Mas o dólar ainda está em um patamar mais alto do que a gente tinha visto na quinta-feira passada. Essa queda hoje é algo, na minha opinião, bem técnico e muito menos relacionada a algum fator econômico ou político”, afirma.
Segundo operadores, podem dar suporte ao real esta semana a entrada de recursos para IPOs e a expectativa, quase unânime, de que o Banco Central acelere o passo e anuncie, na quarta-feira, uma alta da Selic em 1 ponto porcentual, para 5,25% ao ano – o que aumenta, em tese, a atratividade da renda fixa local.
Jogam contra a moeda brasileira as dúvidas sobre o comportamento global do dólar, em meio ao debate sobre o início do “tapering”, que deve se acentuar com a divulgação do relatório de emprego nos EUA (payroll) de julho, na sexta-feira, e as preocupações de uma degringolada das contas públicas locais, em meio a uma possível ofensiva populista de Bolsonaro para recuperar a popularidade.
“Esperamos alta de 100 pontos da Selic, o que, em tese, deveria colaborar para a apreciação do real, porém os riscos fiscais e políticos estão se sobrepondo a esse esperado efeito”, afirma, em relatório, a gestora Armor Capital, no qual que cita as discussões sobre como financiar a ampliação do Bolsa Família e as pressões de gastos por causa da baixa popularidade de Bolsonaro como obstáculos à apreciação do real. “Ademais, possíveis gastos bilionários com precatórios em 2022 constituem pressão adicional sobre as contas públicas”.
Causou apreensão nas mesas de operações a informação de que pode ser inserido no Orçamento de 2022 um valor entre R$ 80 bilhões e R$ 90 bilhões para o pagamento de precatórios, bem acima do previsto pelo Ministério da Economia. A elevação nos gastos com precatórios é o que o ministro Paulo Guedes chamou na sexta-feira de “meteoro” para o Orçamento. Isso complica os planos de ampliar o Bolsa Família sem ferir o teto de gastos, o que assusta o mercado.
Segundo fontes ouvidas pelo Broadcast, o governo pretende bancar uma PEC que pode fixar um limite de 5% de suas receitas para pagamento de precatórios ou até mesmo estabelecer um teto para essas despesas.
Pela tarde, saíram dados da balança comercial em julho. Houve superávit comercial de US$ 7,395 bilhões, abaixo da mediana (US$ 8,9 bilhões) e do piso (US$ 8,2 bilhões) de Projeções Broadcast. Mesmo assim, foi o segundo melhor resultado para o mês na série histórica (iniciada em 1989), atrás apenas de 2020.
A Armor nota que na quarta semana de julho, o exportador deixou de internalizar US$ 1,2 bilhão. “Nas últimas semanas, essa movimentação dos exportadores tem contribuído para a perda de dinamismo do câmbio contratado comercial”, afirma a gestora.
Por Antonio Perez
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