Após a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal formar maioria para barrar revistas íntimas em presídios, em razão de práticas “vexatórias”, o ministro Alexandre de Moraes decidiu levar o tema ao Plenário da Corte, ressetando o placar de 6 a 4 que havia sido estabelecido na manhã desta sexta, 18. Moraes, que já se havia posicionado contrariamente à vedação absoluta da revista íntima, pediu destaque do processo – assim a discussão será reiniciada em sessão presencial, sob os holofotes da TV Justiça, sem data para ocorrer.
A movimentação se deu logo após a retomada do julgamento, com o voto-vista do ministro Cristiano Zanin que havia pedido mais tempo para analisar o caso em maio – na ocasião, faltava apenas um voto para que o STF formasse maioria para vedar o procedimento em que visitantes de detentos têm de ficar nus e fazer movimentos, como agachamentos e saltos, enquanto agentes penitenciários inspecionam seus corpos, inclusive munidos de espelhos.
Nesta sexta, 18, Zanin acompanhou o relator Edson Fachin com ressalvas, apresentando um voto médio sobre o tema. Ele fez uma ressalva sobre a aplicação prática da eventual decisão da Corte considerando as “peculiaridades do sistema prisional brasileiro e sua diversidade nos diferentes estados da federação”.
Zanin sugeriu que seja permitida a busca pessoal não vexatória até que equipamentos de segurança – scanners corporais, esteiras de raio X e portais detectores de metais – estejam em pleno funcionamento.
Em seguida, Moraes pediu destaque do caso, zerando o placar de julgamento, com a manutenção apenas do voto da ministra Rosa Weber, em razão de sua aposentadoria.
A tendência é que os ministros mantenham os posicionamentos já externados, mas na prática eles terão de se manifestar novamente no Plenário do STF, podendo inclusive mudar de entendimento.
O pedido de destaque de Moraes não é o primeiro feito no bojo do processo. No ano passado, o julgamento, também em sessão virtual, foi suspenso por solicitação do ministro Gilmar Mendes, para que o assunto fosse debatido em sessão presencial do STF. Posteriormente, o decano cancelou o pedido.
O julgamento trata da validade de provas obtidas a partir de práticas vexatórias na revista íntima de visitantes em presídios. Os ministros discutem se há violação do princípio da dignidade da pessoa humana e ofensa ao direito à intimidade, à honra e à imagem das pessoas.
Antes da retomada do julgamento nesta sexta, havia votos – nos termos do voto do relator Edson Fachin – para que o STF fixe a seguinte tese: “É inadmissível a prática vexatória da revista íntima em visitas sociais nos estabelecimentos de segregação compulsória, vedados sob qualquer forma ou modo o desnudamento de visitantes e a abominável inspeção de suas cavidades corporais, e a prova a partir dela obtida é ilícita, não cabendo como escusa a ausência de equipamentos eletrônicos e radioscópicos”.
Tal corrente chegou a modular a tese para incluir a determinação para que, em 24 meses contados a partir da finalização do julgamento, os presídios de todo o País comprem e instalem equipamentos como scanners corporais, esteiras de raio X e portais detectores de metais.
A corrente divergente foi aberta pelo ministro Alexandre de Moraes. Ele entende que não é o caso de vedar de maneira absoluta as revistas íntimas, mas estabelecer a sua excepcionalidade, a sua especificidade para casos fundamentados e a necessidade de um rigoroso protocolo, para que se vede e se responsabilize, eventualmente, quando ocorrerem o excesso, o abuso. Quatro votos seguiam essa linha.
O que é revista íntima?
Na revista íntima o corpo da pessoa é objeto de análise minuciosa, a pretexto de busca e retirada de objetos ilícitos das cavidades corporais, explicou Fachin em seu voto.
Segundo o ministro, a prática foi abolida em vários Estados, mas ainda é realizada em presídios. Em geral, as averiguações envolvem uma vistoria direta do corpo da pessoa, que fica nua, parcial ou completamente. Os agentes penitenciários ainda podem determinar que a pessoa agache, salte ou realize outros movimentos, como tosse e flexões. Além disso, podem ser usados espelhos e até toque íntimo.
O que diz a PGR?
A Procuradoria-Geral da República sustenta que não há legitimidade na realização generalizada de revistas íntimas com atos de desnudamento e inspeção nos órgãos genitais. Argumenta que a diligência poderia ser adotada quando absolutamente imprescindível para alcançar objetivo legítimo concretamente e previamente fundamentado.
O Ministério Público Federal ainda pede que os efeitos da decisão do STF sejam modulados, pelo período de um ano, para que os presídios possam ajustar os seus protocolos e regras de ingresso dos visitantes.
Qual o caso é discutido no STF?
Os ministros analisam um recurso contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que considerou ilícita prova produzida durante revista íntima, uma apreensão de droga.
A corte absolveu a mulher com quem o entorpecente foi encontrado sob o entendimento de que a prova foi obtida em desrespeito às garantias constitucionais da vida privada, honra e imagem das pessoas, pois a revista nas cavidades íntimas ocasiona uma ingerência de alta invasividade.
Segundo Fachin, as revistas em presídios têm caráter vexatório uma vez que submetem familiares e amigos de presos ao desnudamento e à exposição involuntária das cavidades íntimas, até mesmo toques, em condições duvidosas de higiene e sob o olhar de agentes responsáveis pela segurança das unidades prisionais.
Antes do pedido de Moraes, o STF também havia formado maioria para a manutenção da absolvição da mulher.
Por Pepita Ortega
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