Relator de um processo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) que investiga uma ação do Itaú e da Rede, o conselheiro Gustavo Augusto votou nesta quarta-feira, 5, para vedar definitivamente que as empresas condicionem o adiantamento da liquidação de transações feitas com cartão à abertura de uma conta bancária na instituição financeira. O julgamento, por sua vez, foi suspenso por pedido de vista do conselheiro Victor Fernandes.
Em seu voto, Gustavo Augusto orientou pela condenação das investigadas por abuso de poder dominante, ao entender que a prática ofertada em 2019 seria um “empacotamento” de serviços ilícito, violando a lei de defesa da concorrência. Por outro lado, livrou as empresas de pagamento de multa, uma vez que, durante as investigações, o Itaú e a Rede cessaram a estratégia comercial, tendo ainda havido dúvidas durante as apurações sobre a ilicitude da conduta – a Superintendência-Geral do Cade, por exemplo, sugeriu o arquivamento do processo.
A única pena proposta pelo relator, portanto, seria a conversão de uma medida preventiva dada pelo Cade em 2019 em definitiva, por um período de cinco anos. “Se o mercado tiver se alterado significativamente, a conduta poderá ser reanalisada pelo tribunal”, assinalou.
O caso chegou à autoridade antitruste após as empresas lançarem uma estratégia em que, para terem acesso antecipado à liquidação de suas vendas no crédito à vista, os clientes da Rede deveriam abrir ou manter uma conta bancária no Itaú. Ou seja, não haveria cobrança adicional pela vantagem da antecipação, existindo, contudo, a condição da existência da conta. O faturamento da empresa também deveria ser inferior a R$ 30 milhões.
Com isso, as instituições passaram a ser investigadas por supostas condutas de preço predatório e venda casada. No ano de instauração do processo, o Cade chegou a determinar uma medida preventiva que proibiu a exigência de abertura da conta bancária, sem vedar, contudo, a antecipação da liquidação do recebível.
O relator da apuração destacou em seu voto que esse adiantamento não é ilegal e que, uma vez que a operação continua sendo cobrada, não seria possível falar em concorrência predatória. “Desde que os valores cobrados não sejam inferiores ao custo da operação, não temos custo predatório, porque no fundo o que está se dizendo que é gratuito, não é, porque a taxa de intercâmbio é cobrada”, apontou o conselheiro, descartando, portanto, que a antecipação do recebível de D+30 para D+2 caracterizaria uma prática de preço predatório.
Por outro lado, atrelar o serviço de antecipação do pagamento à abertura de uma conta no Itaú, em seu entendimento, seria anticoncorrencial porque a política permitiria uma execução de estratégia de alavancagem ilícita. “O serviço de antecipação do recebível é um serviço que sempre foi oferecido, e pode ser contratado de forma separada. Mas estamos falando aqui de um empacotamento”, disse Gustavo Augusto, lembrando que, para receber o pagamento de valores recebidos por cartão, o lojista não precisa necessariamente abrir uma conta bancária.
“Exigir que o estabelecimento comercial tenha que abrir ou manter conta corrente do banco para a antecipação caracteriza a prática de empacotamento ilícito, e viola a lei da defesa de concorrência. As empresas devem se abster de exigir domicílio bancário para ofertar uma política de recebimento antecipado em condições mais favoráveis”, concluiu Gustavo Augusto, segundo quem o Banco Central informou ao Cade existir vedação em se vincular serviço de credenciamento a serviço de domicílio bancário.
Um estudo realizado pelo Cade também constatou que nenhuma das concorrentes das duas investigadas antecipa os recebíveis de forma gratuita, além de não exigirem abertura de conta corrente em qualquer instituição bancária. Na avaliação do conselheiro, a estratégia da ação seria utilizar o poder do Itaú para aumentar a participação de mercado da Rede, “que efetivamente aumentou” no período.
Advogado das empresas, José Carlos da Matta Berardo defendeu no início do julgamento que o processo deveria ser arquivado. Ele alegou que o Cade não poderia classificar como ilícito um ato de concorrência “agressiva”. “Tratar essa conduta como ilícito é equívoco e cria incentivos perversos para agentes de mercado. O que confiamos é que a defesa que apresentamos nos autos reforça que esse tipo de concorrência agressiva não pode ser coibido”, disse.
Por Amanda Pupo
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