O ataque sem precedentes do Hamas deixou centenas de mortos e expôs a fragilidade do governo de Israel. O país tem um poderoso sistema de defesa aérea, o Domo de Ferro, projetado ao longo de mais de uma década com o apoio americano e um exército que já foi reconhecido como um dos mais bem preparados do mundo. Mesmo assim, foi pego de surpresa pelos radicais da Faixa de Gaza e se viu incapaz de proteger os civis, sequestrados por terroristas.
A ação não foi sequer antecipada pelos serviços de inteligência, agora colocados em dúvida, enquanto o mundo se questiona: como o Hamas orquestrou um ataque dessa magnitude sem ser percebido?
Para o ex-conselheiro de segurança de Israel, Chuck Freilich, foi um fracasso de inteligência comparado ao início da guerra do Yom Kippur. Há exatos 50 anos, uma coalizão árabe liderada por Egito e Síria aproveitou o feriado judaico do Dia do Perdão e avançou sobre os territórios que haviam sido tomados por Israel durante a guerra dos seis dias.
A ofensiva impactou o mundo inteiro com os choques no mercado do petróleo em 1973 e foi traumática para os israelenses, pegos de surpresa assim como aconteceu agora.
Nas redes sociais, ele denunciou que o enfraquecimento das forças de defesa de Israel levou aos “resultados trágicos” vistos na invasão. “O ataque demonstra o fracasso da política de longo prazo de defesa do governo Netanyahu ao longo da fronteira de Gaza”, criticou.
Crise interna
A ação deste sábado, 7, abalou a imagem da defesa do País, que sofre internamente com uma arrastada crise política. Divisões internas colapsaram os últimos governos e levaram os israelenses às urnas cinco vezes em menos de quatro anos. Para voltar ao poder na última disputa, no fim do ano passado, Binyamin Netanyahu lançou mão de uma aliança com a extrema direita e ultraortodoxos, que saíram como os grandes vitoriosos da eleição.
No poder, a coalizão liderada por Netanyahu avançou com uma controvertida reforma do sistema judiciário, apontada pelos críticos como um ataque à democracia. A revolta se espalhou por diferentes setores da sociedade israelense e até os reservistas chegaram a cruzar o braços em meio aos protestos.
No conflito com os palestinos, o novo governo lançou uma operação letal em Jenin, na Faixa de Gaza, que retaliou com foguetes disparados em direção a Israel, uma escalada do conflito que antecipou a guerra. Na Cisjordânia, a ampliação dos assentamentos de judeus, criticada inclusive por aliados como os EUA, acirrou ainda mais os ânimos.
Foi nesse contexto de crise, de divisões internas, com o governo mais a direita da história israelense, que Israel foi surpreendido pelo Hamas, com uma invasão de terroristas que não foi antecipada pelos serviços de inteligência.
“O Hamas só conseguiu entrar pela degradação do exército de Israel”, avalia o coordenador do Núcleo de Estudos Judaicos da UFRJ Michel Gherman lembrando a que as forças armadas israelenses, pelo menos em tese, são mais fortes que os insurgentes.
“Vimos uma invasão por terra, queima de bases militares, sequestros de soltados em serviço e de civis, dentro das suas casas. É uma vergonha, como que o exército, que já foi considerado um dos mais preparados do mundo chega ao ponto de não proteger a sua população na fronteira?”, questiona o pesquisador.
Exposto pela da tragédia, o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu busca unir o País contra o inimigo Hamas. Ele declarou guerra e chamou os opositores Yair Lapid e Benny Gantz para formar um governo de emergência.
“Foi uma resposta muito rápida. Ele já declarou estado de guerra porque está em uma situação doméstica muito complicada. Então tenta criar esse elemento de união contra o Hamas”, avalia o professor de relações internacionais da ESPM, Roberto Uebel.
O analista acredita que, neste momento, Israel deve tentar neutralizar o Hamas e fechar ainda mais o cerco a Faixa de Gaza, que há mais de 15 enfrenta bloqueios israelenses. No entanto, é difícil saber a proporção que o conflito vai tomar. Neste momento, é tudo muito incerto. A reação do mundo árabe deve ser decisiva, assim como os passos que Israel dará a partir de agora.
“Também depende muito do que Israel vai fazer no dia seguinte. A depender da reação, o governo pode perder a pouco legitimidade que conseguiu alcançar agora, porque é muito frágil. É uma situação muito sensível”, conclui Michel Gherman.
Por Jéssica Petrovna
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