Press "Enter" to skip to content

As ações chinesas conseguirão se recuperar em 2022?

Veja os cenários possíveis para as ações chinesas em 2022 (Foto: Magda Ehlers/Pexels)

Por Hugo Pan, do Investing.com China

2021 foi um ano monumental para as ações chinesas negociadas nos EUA, tanto para o bem quanto para o mal. Por um lado, as empresas chinesas estabeleceram um recorde de número de IPOs nos EUA. Por outro lado, os desafios nesses processos de IPO e as condições regulatórias levaram a uma grande venda nos índices da China e de Hong Kong, com algumas dessas ações registrando mínimas de vários anos. À medida que entramos em 2022, há motivos para esperar uma mudança?

SÉRIE: Perspectivas de Mercado do Investing.com para 2022

Ações chineses passaram de truques para investimentos de valor

As chamadas “Ações do Conceito China” (em inglês, China Concept Stock) é um termo geral para todos os ativos chineses listados no exterior.

Na década de 1990, as empresas chinesas começaram a experimentar abrir seu capital nos EUA. A Shanghai Petrochemical (Sinopec) tornou-se a primeira empresa estatal chinesa a ser oficialmente cotada e negociada na NYSE como empresa-piloto, em julho de 1993.

Ao longo dos últimos 20 anos do crescimento econômico da China, o “Conceito China” se transformou de um truque para um investimento rentável. Diversas empresas chinesas abriram seu capital nos EUA e cresceram significativamente em termos de valuation. A Alibaba (NYSE:BABA) (SA:BABA34), atualmente a maior empresa chinesa no mercado de ações dos EUA, foi avaliada em US$ 21,8 bilhões quando estreou nos EUA em 2014, e num determinado momento, alcançou um valor superior a US$ 860 bilhões, um crescimento de 40 vezes.

A presença de ações chinesas nos EUA se expandiu rapidamente nos últimos 15 anos. Em 2005, apenas 36 empresas chinesas estavam listadas nos EUA, com um valor total de mercado de cerca de US$ 260 bilhões entre si, representando apenas 1% do valor total do mercado de ações dos EUA. No final de 2020, havia mais de 600 empresas chinesas listadas nos EUA, com uma capitalização de mercado de cerca de US$ 6 trilhões, representando cerca de 9% do total.

Em 2021, com o momento favorável de dados promissores quanto à recuperação da pandemia, além da flutuabilidade do mercado dos EUA, o número de empresas chinesas realizando IPOs nos EUA explodiu. Os dados da Refinitiv registraram 34 IPOs de empresas chinesas nos EUA apenas no primeiro semestre do ano, muito acima dos níveis anteriores.

As empresas chinesas tornam-se os mendigos chineses

Mas com o passar de 2021, o clima do mercado mudou de repente. O índice Nasdaq Golden Dragon China atingiu uma alta recorde de 20.893,02 em fevereiro, chegando a uma mínima de 8.275 (em 20 de dezembro), queda de 60%. A Alibaba caiu 58% em relação à sua máxima, a Didi Chuxing recuou 64% e a Pinduoduo (NASDAQ:PDD) despencou 73%, sendo estes apenas alguns exemplos. Muitas ações chinesas apresentaram queda de mais de 90%. Ninguém esperava que as prósperas ações chinesas iriam passar tão rápido de objetos de desejo a ativos insustentáveis que precisaram sair em vendas relâmpago de queima de estoque, custando muito dinheiro aos investidores.

O que nos trouxe a este ponto

Houve uma série de eventos que levaram à tumultuada negociação de 2021.

Em março de 2019, os Estados Unidos propuseram a Lei de Responsabilização das Empresas Estrangeiras (ou HFCAA, do inglês Holding Foreign Companies Accountable Act), que estabelecia um alto nível de exigência para s ações chineses listadas nos EUA. A lei obriga que as empresas forneçam primers de auditoria à Public Company Accounting Oversight Board (PCAOB), dos EUA, em até três anos após sua estreia na bolsa, sob pena de deslistagem.

Em 2 de abril de 2020, a Luckin Coffee publicou um comunicado em que admitia transações falsas no valor de RMB 2,2 bilhões, e o preço de suas ações caiu 80%. Em maio de 2020, o Senado norte-americano aprovou por unanimidade a Lei de Responsabilização das Empresas Estrangeiras após o caso de fraude financeira da Ruixing (Luckin). A lei foi sancionada e entrou em vigor ao final de 2020.

Em 1º de julho de 2021, a Didi Global abriu seu capital silenciosamente nos EUA sem tocar o sino do pregão ou qualquer outro tipo de publicidade. A listagem sorrateira de um gigante de US$ 400 bilhões em capitalização alarmou o mercado, fazendo o índice Nasdaq Golden Dragon China recuar 2,5% nesse dia.

Em 2 de julho de 2021, a Secretaria Chinesa de Análise de Cibersegurança anunciou o lançamento de uma investigação de cibersegurança da Didi Chuxing, e o índice Golden Dragon China caiu mais 1,9%.

Em 6 de julho de 2021, a China publicou os “Pareceres sobre a Repressão Rigorosa das Atividades Ilegais de Valores Mobiliários nos Termos da Lei”, que mencionava o fortalecimento da cooperação regulatória transfronteiriça e a exigência da implementação da responsabilidade principal pela segurança da informação das empresas listadas no exterior. O índice Golden Dragon China caiu mais 3%, tendo diminuído 12,7% desde 1º de julho.

Em 24 de julho de 2021, a Secretaria-Geral do Comitê Central do CPC e a Secretaria-Geral do Conselho de Estado emitiram “Pareceres quanto à Redução Adicional do Ônus dos Trabalhos de Casa dos Estudantes e da Formação Fora do Campus na Educação Compulsória”, e foi a vez das ações do setor de educação despencarem. Naquele dia, a New Oriental caiu 54.2%, a TAL Education afundou 70,8% e a Gaotu Techedu despencou 633%. Isto arrastou o índice Golden Dragon China consigo, fazendo-o recuar por três dias consecutivos, numa queda de 16%, com uma baixa acumulada de 22% em julho.

Em setembro de 2021, foi revelado que a China Evergrande Group (HK:3333) (OTC:EGRNY) tinha RMB 2 trilhões em dívidas, e os rumores de falência começaram a se agravar. O preço das ações da Evergrande também começou naufragar, caindo mais de 60% desse ponto em diante depois de já ter caído 75% até o início de setembro. A mídia estrangeira comparou a situação à época do “Lehman”, o que agravou as vendas de ações chinesas. O índice Golden Dragon China caiu quase 10% no mês.

Em 2 de dezembro de 2021, a SEC adotou as regras finais da Lei de Responsabilização das Empresas Estrangeiras. A implementação significa que, a partir de 2022, se a PCAOB não tiver revisado a firma de contabilidade do emissor por três anos consecutivos, as ações terão sua negociação em bolsas domésticas proibidas e serão compulsoriamente excluídas do mercado de capitais dos EUA (ou seja, em 2025). Na esteira dessa notícia, o índice Golden Dragon China caiu 2,1%.

Em 3 de dezembro, a Didi Chuxing anunciou em um microblog que “a empresa iniciará o trabalho de deslistagem da NYSE e iniciará os preparativos para a listagem em Hong Kong com efeito imediato”. Embora a empresa ainda não tenha feito um anúncio formal, a declaração da Didi reflete regulamentações adicionais de segurança. O índice Golden Dragon China mergulhou mais de 9%, outra vez.

A sequência de notícias negativas esmagou as ações chinesas e deixou os investidores estupefatos ao longo de 2021. Esta venda contínua foi um forte contraste com o Nasdaq Composite Index, que apresentava alta de 16,2% no ano até 20 de dezembro. A diferença era como dia e noite.

 

Olhando adiante para 2022 – Perspectivas das ações chinesas

Então, para onde vão as ações chinesas? Aqui estão três cenários possíveis.

 

1. Abertura de capital em Hong Kong

Você deve sempre estar preparado para o pior e estar pronto para fazer ambos. Embora a Lei de Responsabilidade das Empresas Estrangeiras dos EUA ainda tenha uma janela de três anos (que se fecha em 2025), caso o mercado ainda estiver apertado no próximo ano, não podemos descartar a possibilidade de um grande número de ações chinesas irem para Hong Kong, para uma segunda listagem.

A CITIC Securities acredita que o reforço das regulamentações internacionais, além do relaxamento gradual das regras de listagem do mercado de ações de Hong Kong e a inclusão de índices, acelerará o retorno dos líderes chineses que se qualificam para listagem em Hong Kong. A lista secundária em Hong Kong só precisa cumprir as exigências regulatórias de ambos os mercados, e o retorno das ações chinesas qualificadas para Hong Kong em uma listagem secundária vai se tornar mainstream.

Para as empresas que não cumprem os requisitos de listagem secundária em Hong Kong, a alternativa provável é o risco de privatização e exclusão da bolsa antes de 2025. Devido à grande parcela de capital consumido para a compra de ações de capital aberto, aos elevados custos de conformidade e à dificuldade de desmantelar as estruturas de uma empresa aberta, é menos provável que esta seja uma escolha popular.

Na verdade, muitos preveem que as empresas chinesas já haviam planejado o caminho de volta. Só em 2021, grandes estrelas do mercado de ações chinês Baidu (NASDAQ:BIDU), Bilibili (NASDAQ:BILI) (SA:B1IL34), Trip.com Group Ltd (HK:9961)(SA:CRIP34), Weibo Corp (NASDAQ:WB) (SA:W1BO34), Li Auto Inc (NASDAQ:LI), Xpeng (NYSE:XPEV) e Autohome (HK:2518) (NYSE:ATHM) foram para Hong Kong em busca de listagens secundárias.

Há opiniões diversas sobre o impacto deste fluxo de entrada de empresas em Hong Kong. Alguns acreditam que isto irá pressionar a liquidez do mercado de capitais de Hong Kong, que é muito menor que a dos Estados Unidos. Em dezembro, o valor de capitalização total das ações chinesas é de cerca de US$ 1 trilhão, e existem 31 ADRs de grandes blue chips no mercado de Hong Kong negociados nos EUA, incluindo a Tencent, ações financeiras imobiliárias e ações de empresas de serviços públicos detidas em Hong Kong. O seu retorno irá gerar uma demanda por financiamento em grande escala, criando um forte efeito de sangria, prejudicando o mercado de Hong Kong. As ações de Hong Kong já tiveram dificuldades em 2021 e dificilmente serão capazes de suportar outra grande queda.

Mas os benefícios da relistagem de grandes nomes que em Hong Kong também são óbvios. Centenas de bilhões ou mesmo trilhões de dólares irão fluir de volta para Hong Kong, o que inevitavelmente fortalecerá sua posição como centro financeiro da Ásia. Algumas pessoas também acreditam que as ações chinesas da melhor qualidade não têm medo de turbulências, porque o fato de listarem ou não um ADR em Hong Kong não afeta suas perspectivas.

2. De volta às A-shares.

Com o lançamento do Conselho de Inovação em Ciência e Tecnologia e do sistema piloto de registro da GEM, as ações chinesas também podem escolher a via de emissão direta de ações listadas em A-shares domésticos.

A Yuekai Securities acredita que, devido à escassez de metas de tecnologia rígida no mercado de A-shares, as ações chinesas que voltarem vão obter um prêmio de valuation mais alto, fazendo subir o valor de mercado e a liquidez das ações. Isto poderia gerar um círculo virtuoso, à medida que os investidores locais fazendo ofertas mais altas pelas companhias recém-(re)listadas, o que seria crucial para promover a volta das ações chinesas para A-shares no futuro.

3. O valor retorna

Sob a influência de uma regulamentação mais rigorosa, de um aumento de investigações antimonopolistas e de medidas políticas crescentes, as ações chinesas sofreram ao longo de 2021.

A Shanghai Securities acredita que, como já faz quase um ano desde a primeira menção de antimonomonopolismo por parte o governo, e que o ponto de partida da política é promover e beneficiar a indústria em vez de acabar com os líderes, o mercado irá se racionalizar gradativamente e as respostas às políticas regulatórias se abrandarão, levando a uma mínima no setor de internet, especialmente entre as empresas de internet de Hong Kong. Existem paralelos na regulamentação dos líderes da internet dos EUA, onde os efeitos negativos são muitas vezes temporários e limitados.

No contexto da transformação econômica da China e da robustez da ciência e tecnologia, a tendência positiva do setor de internet a longo prazo permanece sem alterações. À medida que a regulamentação se normaliza, o mercado pode voltar a se concentrar no desempenho e na qualidade em potencial das empresas.

Como visto no cronograma acima, todo o ambiente macro está arrastando as ações chineses para baixo tanto quanto qualquer outro fator, distraindo-nos das suas perspectivas ainda fortes. Como o mercado pessimista passou dos limites há diversas companhias chinesas cujas ações estão sendo negociadas abaixo do seu valor potencial.

Por exemplo, as ações da Alibaba atingiram o menor patamar em quase 5 anos e estão perto de quebrar o preço de US$ 100 por ação, deixando o ativo verdadeiramente tentador. Com um Índice Preço/Lucro de 17, relação EV/S de 2,5 e uma capitalização de mercado de pouco mais de US$ 300 bilhões, a gigante da internet pode ser atraente.

Havia portos seguros no mercado chinês. Por exemplo, a fabricante de automóveis elétricos Xpeng Inc (NYSE:XPEV). recuou somente 8%, enquanto a Li Auto Inc (NASDAQ:LI) apresenta baixa de apenas 2%, já que sua ação não caiu com o resto do setor.

A Luckin Coffee (OTC:LKNCY) é outra grata surpresa, ganhando 17% em 2021 apesar de ser negociada no mercado de balcão, já que os investidores compraram sua idéia de focar a otimização do controle de custos e se concentrar em sua atividade central a fim de abandonar a reputação de fraude no passado.

Há ainda a JD.com Inc (NASDAQ:JD) (SA:JDCO34), que caiu 17,32% em 2021, mas veio se recuperando entre agosto a novembro antes de ser atingida pela volatilidade de fim do ano.

Isto mostra que ainda há interesse pelas ações chinesas e que a confiança dos investidores nas ações chinesas restantes não foi completamente perdida.

Na verdade, os investidores globais já compraram o que pode ser a baixa. Charlie Munger, sócio de Warren Buffett, High Tide Capital e Bridgewater Associates aumentaram as suas participações na Alibaba; os gigantes do capital Soros e Duan Yongping expandiram as suas participações na Poundland, enquanto Gaoyi Asset Management e Jinglin Assets incrementaram suas participações na BOSS Direct e Shell (NYSE:RDSa).

Os fluxos da ETF também estão crescendo. Tomemos o fundo Efund China Connect 50 ETF como exemplo: ele ganhou subscrições líquidas todos os meses desde 2021, permitindo-lhe comprar à medida que os preços caem, com uma quota de subscrição líquida combinada de 20,998 bilhões de ações em dezembro.

O cenário ideal seria que os EUA e a China voltassem aos trilhos ao nível econômico e em termos de suas relações comerciais. Isso e o fim da pandemia poderiam proporcionar ventos favoráveis significativos às empresas chinesas, que estão sendo negociadas com valuations deprimidas. Basta um ambiente macro mais rosado e as ações chineses podem deixar de lado o desânimo de 2021 para brilharem em 2022. Se isso não acontecer, os investidores poderão ter de se manter atentos aos mercados de Hong Kong e de A-Shares.

Matéria originalmente publicada em Investing.com