O ambiente externo de apetite ao risco e a aprovação da PEC dos Precatórios em dois turnos no Senado abriram espaço para uma queda do dólar na sessão desta quinta-feira 2, embora não em magnitude suficiente para pôr a taxa de câmbio abaixo da linha de R$ 5,65.
A despeito do desenlace positivo para a novela da PEC, que passará agora por uma nova votação na Câmara devido às alterações realizadas no Senado, o ambiente ainda é de cautela e impede a desmontagem de posições defensivas.
Pesa contra a moeda brasileira a perspectiva de um dólar mais forte no mundo, diante da expectativa de que o Federal Reserve promova uma redução mais rápida dos estímulos monetários e antecipe da alta de juros nos Estados Unidos, após declarações duras do presidente do BC americano, Jerome Powell, ao longo desta semana.
Eventuais dados positivos do relatório de emprego nos EUA (payroll) em novembro, que sai amanhã, podem dar força às apostas em elevação dos juros por lá já no segundo trimestre de 2022, a despeito das incertezas geradas pela variante ômicron do coronavírus.
Por aqui, a queda de 0,1% do PIB do terceiro trimestre na margem, que colocou o Brasil em recessão técnica, esfriou as apostas em uma aceleração do ritmo de alta da Selic no encontro do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central na próxima semana.
Afora um movimento de alta na abertura dos negócios, ainda se ajustando ao avanço mais expressivo do dólar futuro na noite de ontem, a moeda operou em terreno negativo ao longo de toda a sessão. A máxima, a R$ 5,6787, veio na primeira meia hora de pregão. Já a mínima, a R$ 5,6145, coincidiu com o início da votação da PEC dos Precatórios no Senado.
Ao longo da tarde, o dólar desacelerou o ritmo de queda nos e passou a operar na casa de R$ 5,65, diante da redução das perdas da moeda americana frente o peso mexicano e o rand sul-africano, considerados pares do real. Além disso, o índice DXY – que mede a variação do dólar frente a seis divisas fortes – trocou de sinal e passou a operar leve alta, acima dos 96,00 pontos.
Com uma leve aceleração nos minutos finais da sessão, o dólar à vista encerrou a sessão em baixa de 0,19%, a R$ 5,6600. Na semana, contudo, a moeda americana ainda acumula valorização de 1,15%. Na B3, o dólar futuro para janeiro recuou 0,92%, a R$ 5,6780, com giro de US$ 11,18 bilhões.
Para o líder de renda fixa e produtos de câmbio da Venice Investimentos, André Rolha, é fato que a aprovação da PEC dos Precatórios trouxe certo alívio para o dólar ao longo da sessão de hoje, mas não há motivos para apostar em uma rodada de apreciação do real daqui para frente. “A PEC pode acarretar mais gastos públicos, porque mexe com o teto de gastos. Mas o mercado prefere ter um terror com fim que um terror sem fim. É um pouco do que estamos vendo hoje”, diz.
Aprovada com placar de 61 votos a favor e 10 contrários em segundo turno, a PEC dos Precatórios abre um espaço fiscal de R$ 106,1 bilhões no orçamento de 2022 – mais do que o suficiente para o governo por em pé o Auxílio Brasil de R$ 400, principal bandeira do presidente Jair Bolsonaro na busca pela reeleição.
Na avaliação de Rolha, dada toda a confusão política local e o ambiente de fortalecimento da moeda americana no exterior, o dólar só não voltou a superar R$ 5,70 ainda por causa do aumento da atratividade das operações de carry trade, na esteira dos aumentos sucessivos da taxa Selic pelo Banco Central.
Números fortes do payroll amanhã, diz Rolha, podem dar subsídios ainda mais fortes à tese de alta antecipada de juros nos EUA e, por tabela, à moeda americana. “Não vejo motivos para ter um dólar enfraquecido. Se o Brasil não fizer a lição de casa podemos ter taxa acima de 5,70”, afirma.
O economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho, estima que o payroll de novembro apresente uma geração líquida de 550 mil a 560 mil empregos, além de recuo da taxa de desemprego nos EUA em 0,1 ponto porcentual, para 4,5%. Dados positivos da economia americana e a persistência da inflação, admitida pelas declarações recentes do presidente do Fed, fazem com que o fôlego mais reduzido do dólar no exterior hoje, com queda em relação à maioria das divisas emergentes, seja pontual.
Depois de dois dias seguidos de falas duras de Powell, hoje foi a vez da presidente do Fed de São Francisco, Mary Daly, chamar a atenção para as pressões inflacionárias. Daly disse que há um conflito entre as metas de estabilidade de preços e pleno emprego, mas que, com as fortes leituras de inflação, é possível que o Fed tenha de acelerar o tapering e montar um plano para aumentar os juros.
Por Antonio Perez
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