Por 18 a 9, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira, 1º, a indicação do ex-advogado-geral da União André Mendonça para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). O nome de Mendonça será agora submetido ao plenário da Casa.
Para ter o nome aprovado na CCJ, Mendonça precisava do apoio de 14 dos 27 senadores do colegiado. No plenário ele necessita de 41 votos – são 81 senadores.
Indicado pelo presidente Jair Bolsonaro, que o carimbou como “terrivelmente evangélico”, Mendonça adotou na sabatina um discurso alinhado à classe política, na tentativa de romper resistências à sua escolha. Disse que não vai reforçar a ala punitivista da Corte, acenou a pautas progressistas, como casamento gay, e descartou agir para atender aos evangélicos.
“Na vida, a Bíblia. No Supremo, a Constituição”, destacou o ex-advogado-geral da União, que também foi ministro da Justiça no governo Bolsonaro. Na sabatina, Mendonça disse saber separar sua religião da atuação como magistrado, defendeu o Estado “laico” e o respeito à independência entre os Poderes. A declaração o afasta também de Bolsonaro, que já disse que Mendonça, uma vez aprovado, puxaria uma oração uma vez por semana nas sessões do STF.
Em outro momento, pressionado pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES), disse que deixaria de lado sua ideologia para votar a favor do casamento gay. Ao falar com senadores, o ex-advogado-Geral da União também fez um aceno à ala anti-Lava Jato ao minimizar a defesa que fez da tese de prisão após condenação em segunda instância – oriunda da sua proximidade com os procuradores de Curitiba – e disse que “não se pode criminalizar a política”, mantra repetido por críticos da maior operação contra a corrupção do País.
Aprovado na CCJ, Mendonça falou aos senadores que não vai reforçar a ala punitivista da Corte, acenou a pautas progressistas, como casamento gay, e descartou agir em nome dos evangélicos. “Ainda que eu seja genuinamente evangélico, entendo não haver espaço para manifestação pública ideológica durante as sessões do Supremo Tribunal Federal”, declarou logo na primeira fala na sabatina.
O ex-advogado-geral da União afirmou ainda que a Constituição vai ser mais importante que a Bíblia caso seja confirmado na vaga. “A Constituição é e deve ser o fundamento para qualquer decisão por parte de um ministro do Supremo. Como tenho dito a mim mesmo, na vida, a Bíblia, no Supremo, a Constituição”, disse o escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro para a vaga.
Pastor da Igreja Presbiteriana Esperança de Brasília, o ex-ministro da Justiça é o nome preferido do segmento religioso. Sob pressão do governo e do Judiciário – o STF está com um ministro a menos desde julho, quando Marco Aurélio Mello se aposentou -, o presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (DEM-AP), cedeu e agendou a sabatina, que dá início ao rito. Alcolumbre demorou três meses para marcar a data e agia para emplacar na Corte outro nome: o do procurador-geral da República, Augusto Aras.
Sabatina teve tom ameno e opositores declarando voto
Em meio às resistências, alguns senadores viram desinteresse de Bolsonaro em ajudar Mendonça. A avaliação foi compartilhada pela relatora da indicação, Eliziane Gama (Cidadania-MA). “Seria tanto uma despreocupação como uma falta no sentido prático de interesse, mas eu acredito que o André vai ser aprovado”, afirmou a senadora, que deu parecer favorável para a escolha.
Apesar disso, a sabatina foi marcada por um tom predominantemente ameno. O senador Jorge Kajuru (Podemos-GO), que havia declarado voto contra, abriu a possibilidade de mudar a posição. Já a senadora Simone Tebet (MDB-MS), crítica do Palácio do Planalto, tornou público na sessão da CCJ que vota pela aprovação do nome dele.
Filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) fez uma série de elogios ao ex-ministro da Justiça. “Quem está nos assistindo percebe a sinceridade, a humildade com que o senhor tem se colocado, enfrentando todas as questões sem desviar, sem tergiversar, sem agredir os seus princípios e sem falar para agradar ninguém atrás de voto”, afirmou. O PL, partido ao qual Jair Bolsonaro entrou nesta semana, foi uma das poucas legendas que orientaram na votação para a vaga, encaminhando a favor de Mendonça.
Quando foi anunciado que ele seria escolhido por Bolsonaro à Corte, parlamentares avaliaram que Mendonça tem pouca interlocução política. Havia um temor de parte da classe política de que ele fortaleceria a “ala punitivista” no Supremo, impondo derrotas a senadores e deputados em processos criminais.
O ex-ministro foi apelidado pelos críticos como “Fachin de Bolsonaro”, em referência ao ministro do STF Edson Fachin, que foi indicado pela então presidente Dilma Rousseff (PT), em 2015, e era visto como simpático ao PT, mas depois ajudou a reforçar revezes para os políticos na Operação Lava Jato.
Um episódio que reforçou a impressão de perfil “lavajatista” de Mendonça foi um encontro que teve com procuradores da Operação Lava Jato em 2019, quando era ministro da AGU. O episódio desgastou o sabatinado por reforçar elos dele com a força-tarefa no Ministério Público que mirava suspeitas de corrupção.
Procurando afastar essa impressão, Mendonça falou em seu discurso que defende o “devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa e a presunção de inocência”. O ex-chefe da AGU ainda disse que “juiz não é acusador, acusador não é juiz. Não se deve fazer prejulgamentos”.
Em outro aceno para a ala anti-lava jato, indicado para o Supremo, também disse que “não se pode criminalizar a política” e que delação premiada não é elemento de prova. “Eu não posso basear uma convicção com base em uma delação. Delação não é acusação”, afirmou.
Antes de virar ministro de Bolsonaro, André Mendonça teve experiência como servidor na Controladoria-Geral da União (CGU) e na Advocacia-Geral da União (AGU). Na CGU, Mendonça ajudou a organizar acordos de leniência com as empresas alvos da Lava Jato e na AGU já participou da área que recuperava ativos no exterior desviados.
Mendonça também já foi advogado da Petrobrás Distribuidora entre 1997 e 2000. Em instituições privadas, cursou Direito em Bauru (SP) e Teologia, em Londrina (PR). Fez pós-graduação em Direito Público na Universidade de Brasília (UnB), mestrado e doutorado na Universidade de Salamanca, na Espanha.
Agora indicado ao STF, chegou perto de ser alvo do próprio Supremo quando era ministro da Justiça. Em agosto de 2019, ele foi protagonista de uma crise quando vieram à tona dossiês montados pela pasta contra servidores públicos considerados antifascistas.
Mais tarde, o ex-titular da AGU sofreu nova dor de cabeça por causa da estratégia de Bolsonaro de usar exageradamente a Lei de Segurança Nacional (LSN) para conter opiniões negativas contra o governo. Quatro ações chegaram ao tribunal para questionar o uso da LSN pelo Palácio do Planalto.
Mendonça negou perseguir opositores de Bolsonaro e disse que liberdade de expressão não pode ser confundida com ofensas à honra. “O Supremo Tribunal Federal em nenhum país do mundo diz que qualquer direito fundamental é absoluto”, declarou. Apesar disso, Mendonça também declarou ser a favor da revogação da Lei de Segurança Nacional aprovada pelo Congresso e sancionada por Bolsonaro.
Por Lauriberto Pompeu, Weslley Galzo e Pepita Ortega
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