A Technos está presente há mais de um século no pulso dos brasileiros. O grupo, que também é dono das marcas Euro e Mormaii, passou por um recente processo de reestruturação pelo qual fincou raiz na sua origem: os relógios.
Ao fazer a virada depois de um período de crise, a empresa não só buscou deixar a operação mais eficiente, mas dobrou a aposta nos relógios inteligentes – tecnologia que havia abalado suas estruturas no passado e que acabou se tornando o maior trunfo para atravessar a turbulência.
Guinadas de direção dos negócios foram uma estratégia recorrente para a fabricante de relógios. A empresa, que nasceu em 1900, na Suíça, como um ateliê de relógios de mesa, teve de acompanhar todas as revoluções e tendências do mercado para se manter de pé.
Desde os anos 1970, a Technos tem o Brasil como seu principal mercado – e, a partir de 1994, tornou-se uma marca de capital brasileiro. Logo, há muito tempo a Technos lida com as flutuações da economia nacional.
Na década de 1980, conseguiu sair de um período de sufoco por conta dos relógios que trocavam as pulseiras – algo que foi uma febre por anos no Brasil. O tradicional modelo de diferentes pulseiras coloridas foi a “pedra fundamental” para a transformação do simples marcador de horas, como eram vistos os relógios, para um item de moda, o que fez com que os consumidores passassem a ter gavetas repletas dos mais diferentes modelos.
Mas foi após 2014, quando a economia do Brasil já estava na corda bamba, que a crise se instalou de vez na companhia. Naquele momento, a competição chegou por todos os lados, especialmente da produção chinesa, mais barata, que invadiu o País, e também pelo início da chegada dos primeiros “smartwatches”.
Naquele momento, o negócio se viu diante de um precipício. A companhia apostou que seria difícil sobreviver só com base na tradição de seus relógios. Logo foram lançadas linhas de óculos e joias, com o objetivo de diversificar para ajudar nas receitas – mas a tática se revelou malfadada.
“Na tentativa de abrir novos caminhos e questionar o negócio tradicional, fizemos muitos investimentos que não foram frutíferos”, diz o presidente da companhia, Joaquim Ribeiro, que assumiu em 2019, pela segunda vez, a presidência da companhia. “Desde então, estou liderando esse processo de reformulação e de rejuvenescimento da companhia”, conta o executivo, que também é acionista da empresa, com cerca de 6% do capital.
Não é fácil uma empresa conhecida por um único produto dar uma guinada em um momento difícil. Especialista em marcas, Jaime Troiano afirma que é comum as empresas passarem pela “tentação” de estender o portfólio de produtos. “Um dos pecados das empresas é tentar pisar em territórios nos quais não têm uma autoridade”, afirma. “A empresa precisa pensar em sua razão de ser, em seu verdadeiro propósito. É a partir daí que se deriva a extensão de uma marca mais autêntica.”
Virada
Dentro desse processo de revisão geral dos negócios, a pandemia acabou ajudando a Technos a colocar o pé no acelerador. Foi a partir de então que se bateu o martelo de que era necessário enxugar o quadro de funcionários e voltar os olhos ao negócio central – os relógios.
Aí se percebeu também que a ameaça poderia virar um trunfo: a companhia decidiu, então, investir mais fortemente nos relógios inteligentes, opção que existia em seu portfólio desde 2015.
Se competir pelo mesmo público que Apple e Samsung estava completamente fora de questão, a empresa percebeu que existia um público imenso não atendido por essas marcas. “O que vimos é que existe um estrato da população sedento por produtos tecnológicos”, comenta Ribeiro.
Esse público, segundo o executivo, não tem poder aquisitivo para desembolsar os valores dos relógios cobrados pela Apple, por exemplo, cujos preços alcançam mais de R$ 5 mil.
Como base de comparação, a Technos tem um relógio inteligente que estampa a grife esportiva Mormaii e é vendido por R$ 699. E também pulseiras fitness, ainda mais baratas. “Vemos que o consumidor depois vai migrando para os produtos mais sofisticados da marca”, conta Ribeiro.
Os resultados comprovaram a tese de negócios. A empresa não informa quanto das vendas totais vieram dos relógios tecnológicos, mas o presidente da Technos diz que essa participação vem subindo. “O último trimestre foi o melhor nos últimos cinco anos”, afirma Ribeiro.
Considerando apenas os dados do segundo trimestre de 2021, a receita líquida da empresa atingiu R$ 76,5 milhões, um aumento de 329% na relação anual.
O lucro líquido ainda é tímido: R$ 7,6 milhões. No entanto, o número significa que a empresa saiu do vermelho. Mais recentemente, investidores têm reconhecido as mudanças e as ações da companhia listadas na Bolsa brasileira têm saído do limbo. Em um ano, os papéis da fabricante de relógios acumulam alta de 250%.
De acordo com Ribeiro, foi a partir da aposta nos relógios inteligentes que o ponteiro da rentabilidade da companhia migrou do vermelho para o azul. O total de relógios vendidos saiu de 130 mil, no segundo trimestre do ano passado, para nada menos do que 446 mil no mesmo período de 2021.
Inovar para sobreviver
A empresa, segundo o executivo, colocou o pilar da inovação no centro de sua estratégia, já que isso é fundamental para sobreviver em um mercado em constante transformação. Apesar desse direcionamento, percebeu que o tradicional não pode ser deixado de lado.
A prova está no portfólio de produtos. Quem quiser um relógio de bolso, comum há cem anos, poderá sempre encontrar um da Technos. “É preciso saber equilibrar. Não precisa renunciar ao sucesso anterior para se construir o novo.”
Os números, até agora, têm comprovado a tese: metade das vendas vem dos lançamentos, sejam eles mecânicos ou com tecnologia embarcada. Com oito marcas, o grupo tem nada menos que mil itens no portfólio. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Fernanda Guimarães
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