Com um Programa Nacional de Imunizações que é referência internacional e uma tradição de vacinação já consolidada na população, o Brasil atingiu a marca de 100 milhões de pessoas totalmente vacinadas contra a covid-19 nesta quarta-feira, o que representa 47,11% da população. O País também está próximo de bater a marca de 150 milhões de pessoas vacinadas com ao menos uma dose. São até o momento 149.950.990, ou 70,29% da população que iniciou o esquema vacinal contra a doença.
O início da vacinação foi lento no País, com cerca de 300 mil vacinas aplicadas por dia nos primeiros dois meses. A campanha ganhou força em junho e, desde então, são vacinados entre 1,5 milhão e dois milhões de brasileiros diariamente. Em setembro, o País entrou numa fase diferente da campanha de vacinação e passou a aplicar majoritariamente a segunda dose.
Hoje, o Brasil já supera a Alemanha e os Estados Unidos no total de pessoas vacinadas com ao menos uma dose. Esses países têm disponibilidade muito maior de vacinas e começaram a vacinar primeiro, em dezembro do ano passado.
O avanço da vacinação no País ocorre mesmo com o presidente Jair Bolsonaro contrariando autoridades de Saúde. “Eu decidi não tomar mais a vacina. Eu estou vendo novos estudos, e minha imunização está lá em cima. Para que vou tomar? Seria a mesma coisa que você jogar R$ 10 na loteria para ganhar R$ 2. Não tem cabimento isso daí”, disse o presidente na terça-feira à rádio Jovem Pan.
O imunologista Gustavo Cabral, que lidera o desenvolvimento de vacinas contra a covid e outras doenças na Universidade de São Paulo, credita as altas taxas de vacinação à vontade do brasileiro de tomar a vacina e à existência de um Programa Nacional de Imunizações bem estruturado. A pressão exercida pela CPI da Pandemia e pela mídia são outros pontos citados pelo pesquisador para explicar o alto porcentual de vacinados em comparação a outros países.
Referência
“Nosso PNI é uma referência internacional e funciona independentemente de quem está no poder. Daria muito trabalho fazer as coisas darem errado. Nós somos feras em vacinação”, diz Cabral. Ele lembra que o País poderia vacinar até cinco milhões de pessoas por dia, mas faltou responsabilidade por parte do governo para fazer isso acontecer.
Os EUA, um dos primeiros países a oferecer o imunizante em larga escala à população, não conseguem ampliar a taxa de vacinados. A vacina está disponível para todos acima de 12 anos, mas só 64,6% dos americanos aceitaram recebê-la. As doses foram compradas em alto volume, há pontos de vacinação em farmácias, supermercados e shopping centers, mas nada disso enfraqueceu o movimento antivacina. “O problema é a falta de aceitação. No Brasil, por outro lado, mais de 95% da população quer se vacinar”, diz o imunologista.
Em alguns países europeus, o problema começa a se repetir. A vacina está disponível desde junho na maioria dos países mas a cobertura vacinal empacou. A Alemanha já foi ultrapassada pelo Brasil na porcentagem de vacinados com uma dose e o Reino Unido deve ficar para trás em breve. Países como Suíça, Áustria, Grécia, Hungria e Polônia também aplicaram menos que o Brasil a primeira dose.
Israel, na Ásia, chegou a ser exemplo de vacinação, exibindo uma das taxas mais altas do mundo. Agora, vê a campanha de imunização travar e está quase empatado com o Brasil, com 70,44% da população vacinada com uma dose. Ao todo, 64,73% dos israelenses estão completamente imunizados.
Os antivacina
Apesar de os brasileiros terem aderido em massa à vacinação, a epidemiologista Denise Garrett, vice-presidente do Sabin Vaccine Institute, em Washington, acha que seria um erro subestimar os grupos contrários à imunização. “O movimento antivacina era incipiente quando começou nos EUA. Ele não ganhou força da noite para o dia. Foi crescendo aos poucos até se tornar um dos maiores do mundo”, afirma. Hoje, adverte Denise, os EUA são uma espécie de “super disseminador do movimento antivacina. Muitas dessas teorias nascem aqui, nesse movimento ligado a extremistas de direita que espalham fake news”, diz.
O fato de o Brasil ter alcançado quase metade da população imunizada traz otimismo, na opinião de Denise Garret. “Mais uma vez o país mostra a força de sua cultura vacinal, mesmo em uma campanha que não contou com esforços publicitários”, afirma.
Para Gustavo Cabral, o Brasil deve começar a formar a imunidade de rebanho a partir do fim do ano, quando pelo menos 70% da população deverá estar totalmente vacinada. Isso só será possível porque as taxas de vacinação são uniformes no Brasil, não há grandes disparidades entre cidades ou estados diferentes. “Isso nos dará certo respiro e permitirá que a gente faça testes para voltar à vida normal”, diz o imunologista.
“Não sabemos se a vacinação precisará ser anual, como a da gripe, ou bianual”, diz a pneumologista Margareth Dalcomo, da Fiocruz. Ela explica que apenas os estudos poderão responder a essa questão. “Diferentemente das coronaviroses anteriores, o Sars-CoV não vai desaparecer; ele ficará entre nós”.
A pneumologista diz que o Brasil deveria ter atingido a marca de 70% da população vacinada até a metade deste ano, mas isso não foi possível porque “a coordenação central foi um desastre”. O Programa Nacional de Imunizações, em seu entender, “entrou nesta pandemia esfacelado. Deixamos de ter a organização homogênea e harmônica que tivemos durante a epidemia de H1N1”, diz. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Cristiane Segatto e Mariana Hallal
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