A Kraft Heinz encheu o seu carrinho de compras na última semana. Exatos sete dias após anunciar a compra da fabricante de alimentos Hemmer, a empresa que tem o fundo 3G Capital, do trio Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles, além do megainvestidor americano Warren Buffett, acertou a aquisição do controle da BR Spices, de temperos, e marca a entrada da companhia no segmento. O valor do negócio não foi revelado.
A intenção da Kraft Heinz, com esses dois movimentos, é de se adaptar melhor ao paladar do brasileiro. A empresa chegou a tentar colocar à venda no País produtos de sucesso em outros mercados, como macarrão com queijo e papinha de criança. No entanto, eles não tiveram quase nenhum êxito por aqui.
Segundo o presidente da Kraft Heinz no Brasil, Fernando Rosa, as experiências negativas do passado por aqui foram fundamentais para a mudança de rota. “Entendemos que, para buscar crescimento e relevância no Brasil, tem de ser com produtos locais”, diz Rosa. Com as aquisições, a fabricante de alimentos vai alcançar um portfólio de cerca de 400 itens no País, mais do que dobrando a quantidade atual.
A ideia é utilizar a BR Spices como uma espécie de hub de inovação. Atualmente, a empresa tem um portfólio de 70 itens, como sal rosa do Himalaia e chimichurri, além de uma série de temperos criados para determinados tipos de pratos, como carnes e feijão. O executivo enxerga que a aquisição será fundamental para a criação de novos produtos da companhia.
“Em algum momento, vamos começar a oferecer soluções prontas de temperos com condimentos e vegetais em conserva, por exemplo. Esse é o tipo de escala e eficiência que queremos buscar”, afirma. O presidente e fundador da BR Spices, Gabriel Daniel, continuará à frente da operação e com uma parcela das ações.
Estratos de renda
Com a Hemmer, a Kraft Heinz planeja entrar em um nicho de mercado intermediário, especialmente no segmento de condimentos. Dona das marcas Quero, de entrada, e Heinz, mais voltada para um público premium, a fabricante sentia que faltavam produtos que dialogassem com um cliente que buscava mais qualidade, mas não estava tão disposto a pagar um preço mais alto pelos produtos Heinz.
“As marcas são muito complementares. Ter essa fatia intermediária do mercado aumenta a possibilidade de trazer mais inovações e desenvolver o mercado”, afirma Cecília Alexandre, diretora de marketing da companhia.
Além disso, a Hemmer possui uma série de categorias em que a Kraft Heinz não estava presente, como pepinos em conserva, azeitonas, pimentas, alcaparras, entre outros produtos. Por isso, a companhia acredita que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) não fará objeção ao acordo anunciado com a Hemmer, que faturou R$ 370 milhões no ano passado e possui cerca de 700 funcionários.
De acordo com dados da Euromonitor, caso a compra seja aprovada pela autarquia, a Kraft Heinz vai assumir a liderança do mercado de mostardas com 39%. A Unilever, dona da marca Hellman’s, ficará em segundo, com 27,2% de um mercado que teve vendas de R$ 115 milhões no ano passado. No segmento de ketchup, que movimentou R$ 1,5 bilhão em 2020, a Hellman’s continuaria líder com 31%, 10 pontos porcentuais à frente da americana.
Com as aquisições, a Kraft Heinz passará a ter três fábricas no Brasil e cerca de 4 mil funcionários. A empresa não tem demissões em vista e não quer repetir erros do passado, quando as empresas do grupo 3G tinham a eficiência financeira e operacional como prioridade. Quando a Kraft se juntou com a Heinz, em 2015, a ideia do fundo era fazer da nova empresa uma espécie de AB Inbev dos alimentos.
Não por acaso, durante um evento realizado em 2019, Lemann admitiu que o “sonho grande” do negócio não era mais possível, mas que era possível consertar sua rota. O presidente da Heinz no Brasil garante que a companhia redefiniu a visão de longo prazo.
“Queremos crescer agregando valor e trazendo produtos mais próximos das necessidades dos consumidores. Ganhar eficiência é importante, mas vamos conseguir essa eficiência trazendo e criando categorias novas de produtos”, diz ele.
Essa visão é acertada na opinião do professor de marketing e administração da ESPM, Alan Kuhar. Segundo ele, as duas compras realizadas nos últimos sete dias serão fundamentais para criar um portfólio mais rico de alimentos. “Faz todo o sentido vender produtos como molhos, picles em conserva e temperos, por exemplo. Eles se complementam”, afirma Kuhar.
Ações reagem
Após períodos complicados, que culminaram com a troca da presidência global em janeiro de 2019, as ações da Kraft Heinz estão em processo de recuperação. Neste ano, os papéis apresentam uma valorização de 12%. Porém, o valor de mercado da companhia ainda está 28% abaixo do apresentado na época da fusão entre as duas gigantes de alimentação.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por André Jankavski; colaboraram Fernando Scheller e Ana Paula Grabois, especial para o ‘estadão’
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