Por Ana Julia Mezzadri
Investing.com – Desde a incorporação de suas operações pela SLC Agrícola (SA:SLCE3), a Terra Santa Agro passou por uma transformação. A empresa, que antes tinha mais de mil colaboradores, passou a ter um time enxuto, de cerca de 15 funcionários, e a atuar em apenas um dos braços do negócio da antiga companhia: o segmento de imóveis rurais.
A principal atividade da Terra Santa Propriedades Agrícolas (SA:LAND3), então, é a gestão de um portfólio de fazendas, arrendadas em sua maioria para a própria SLC.
Ainda que a perspectiva seja de expansão nos próximos anos, o foco da companhia no curto prazo é consolidar sua nova estrutura, reverter todo o seu lucro em dividendos aos acionistas e mostrar ao investidor pessoa física as vantagens do investimento em terras.
Confira a entrevista completa com José Humberto Teodoro Jr., CEO da Terra Santa Propriedades Agrícolas.
Investing.com – O senhor pode começar contando um pouco sobre o crescimento da empresa até aqui?
José Humberto Teodoro Jr. – A Terra Santa teve origem em três empresas distintas que se fundiram por volta de 2009 e 2010: a Brasil Ecodiesel, a Maeda e a Vanguarda. A Brasil Ecodiesel, que fez IPO em 2006, era uma empresa que tinha como modelo de negócio produzir e vender biodiesel. Seu business model focava em uma cultura nova para produzir o biodiesel, e não ficar só no biodiesel de soja, mas esse negócio não prosperou e eles fizeram a fusão com a Maeda.
A Maeda era uma empresa familiar, que estava na agricultura desde a década de 40 do século passado, muito forte no algodão, que no ano seguinte fez a fusão com a Vanguarda, uma empresa também familiar, fundada na década de 1980, que vinha crescendo em um ritmo muito acelerado. Isso deu origem ao que era a Terra Santa, uma empresa agrícola operadora.
Mas tanto Maeda quanto Vanguarda estavam muito alavancadas e, em 2013, a companhia estava em uma situação muito difícil e precisou de um aumento de capital. Nessa época entrou como acionista o Gávea, fundo do Armínio Fraga, que demandou a troca do management. Então a Terra Santa trouxe para assumir a posição de presidente o Arlindo Moura, que era o presidente da SLC até aquele momento.
Com essa mudança, a companhia mudou seu foco e passou a se preocupar em gerar caixa, porque tinha uma dívida muito grande e muitos projetos que demandavam caixa. Nos cinco anos que o Arlindo ficou à frente ele diminuiu muito o tamanho da companhia. Saímos de mais de 300 mil hectares em 2013 para os 150 mil hectares que cultivamos na última safra.
Em 2018 eu vim para a companhia e o Arlindo foi para o conselho de administração, já em um momento diferente, em que precisávamos olhar para o futuro, pensar em crescimento, trazer sofisticação nas operações de comercialização e na gestão de risco. O resultado veio cada vez mais forte. Batemos nossos próprios recordes de produtividade e de geração de caixa, reduzindo endividamento.
Inv.com – Como se deu a fusão com a SLC Agrícola?
JHT – A SLC fez uma proposta para comprar as operações agrícolas da companhia. Nosso objetivo com essa transação era liquidar o endividamento, que foi, nos últimos anos, uma pedra no nosso sapato. Então conduzimos toda a negociação com objetivo de terminar com dívida zero.
A companhia já estava dividida em duas empresas. Havia uma empresa operadora e uma imobiliária, dona das fazendas. Vendemos a empresa operadora e entregamos a empresa imobiliária para os acionistas da Terra Santa. Cronologicamente, o que aconteceu foi: a Terra Santa Agro, que era a empresa operadora, era dona da TS Brasil, dona das terras. Fizemos uma redução de capital, tiramos a TS Brasil debaixo da Terra Santa Agro e entregamos aos acionistas. Foi um processo de listagem. No primeiro momento, os acionistas tinham ações da Terra Santa Agro e ações da Terra Santa Propriedades Agrícolas. No minuto seguinte, a SLC levou as ações da Terra Santa Agro e entregou algumas ações da SLC, e fez a incorporação.
Com isso a SLC leva a dívida e a operação, e nós ficamos com a Terra Santa Propriedades Agrícolas, com uma dívida bem menor e com um fluxo de caixa, nesses primeiros meses, que deveria equacionar e deixar a dívida muito próxima de zero. Essa foi a transação.
Com essa transação surge uma empresa 100% imobiliária rural. Ou seja, eu tinha, sob a minha liderança, 1.300 colaboradores. Agora tenho cerca de 15. Temos as fazendas, que estão arrendadas, e nossa receita vem do arrendamento. E da receita para o lucro a única coisa que precisa tirar são as despesas de escritório, salários, aluguel, governança, impostos… O resto vai ser o lucro da empresa. E a intenção é pegar esse lucro e distribuir como dividendos.
Temos a intenção de comprar fazendas e crescer o nosso negócio, mas a ideia não é usar a receita do arrendamento para compra de fazenda. A ideia é que esse dinheiro seja distribuído como dividendos, e para as compras de fazenda vamos buscar funding outro lugar.
Inv.com – Vocês já têm algum plano de crescimento delineado?
JHT – Ainda não. Não temos um target. Estamos em uma fase de consolidar a empresa. Nossas fazendas estão todas no Mato Grosso, todas arrendadas, a maior parte arrendada para a SLC. Contratamos a Deloitte para fazer uma avaliação de quanto valem as nossas fazendas para podermos divulgar para o mercado.
A negociação com a SLC ainda tem um ajuste de preço, que vai ser calculado durante o mês de setembro. Então teremos uma nova rodada de negociação. Então a energia e o foco nos próximos meses estão em consolidar essa operação, dar uma clareza para o acionista de como vai ser o fluxo de dividendos e como a companhia vai se organizar societariamente.
Mas isso não significa que estamos parados. Estamos montando time e já estamos prospectando algumas áreas, analisando. Mas não indo ativamente ou caminhando muito forte no sentido de comprar ou de fazer uma fusão.
Inv.com – Por que o investimento em uma empresa imobiliária rural é interessante para o investidor pessoa física?
JHT – Tem alguns fatores que diferenciam bastante. Primeiro: é uma classe de ativos nova. Não está amplamente disponível no mercado de capitais.
Recorreremos ao banco de dados histórico dos EUA, que tem um período longo, para tentar entender alguns comportamentos. Fomos estudar períodos de inflação alta, em que tipicamente todo mundo sofre, para entender o que acontece com as fazendas. Houve três períodos nos últimos 100 anos em que a inflação nos EUA ficou acima de 7% ou 8% por um período de 5 a 6 anos. Um no final da década de 1920, um nas décadas de 1940 e 1950, e outro na década de 1970. A terra performou bem em todos os três cenários. Rendeu muito mais do que a inflação. Os outros ativos não performaram bem em todos os três cenários. Todos renderam menos do que a inflação em pelo menos um, dois ou três dos períodos.
Então vimos que, claramente, a terra já é diferente quando se pensa em se proteger de crise e da alta da inflação. É um ativo defensivo, o que já ajuda muito na composição das carteiras dos investimentos.
Também quisemos olhar se a terra está correlacionada com os outros ativos, e vimos que tem uma correlação muito baixa com a maior parte dos ativos, e uma correlação até negativa com a bolsa. Então ela agrega muito valor nas carteiras, por ser um ativo descorrelacionado
Olhamos também para o retorno. Quem investiu em terra nos EUA nos últimos 100 anos, se compararmos com a bolsa, o retorno foi semelhante. Só que o risco, medido pelo desvio padrão dos retornos, é muito menor. A lógica é que, quanto maior o risco, maior o retorno. Mas a terra é um outlier, porque tem um retorno muito alto com risco muito baixo.
Tem um outro ponto: quem disse que esse retorno que aconteceu no passado vai continuar acontecendo no futuro? Aí entramos nos aspectos econômicos do negócio, no racional do investimento. O que enxergamos é que, quando há a necessidade de aumento da área em produção no mundo, o preço da terra sobe, porque é um ativo finito. Com o mundo ficando mais rico, e principalmente países mais pobres ficando mais ricos, essas populações passam a comer mais e melhor. Isso coloca uma pressão grande no lado da demanda.
Temos a demanda por grãos, por exemplo, crescendo a ritmo de 2% a 2,5% ao ano. Do lado da oferta, há ganhos de produtividade que surgem por tecnologia. Mas o ganho de produtividade não tem acontecido no mesmo ritmo e a expectativa é que continue não acontecendo. Isso faz com que seja necessário o aumento da área em produção no mundo. E quando é preciso colocar mais área o preço da terra sobe. Isso é o que vimos acontecer nos últimos anos e é o que esperamos que aconteça nos próximos anos.
Matéria originalmente publicada em Investing.com