O arrefecimento das preocupações com as contas públicas, após dados fortes da arrecadação em julho, e a perspectiva de alta mais intensa da taxa Selic, na esteira da divulgação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – 15 (IPCA-15) de agosto acima das expectativas, abriram espaço para queda firme do dólar no pregão desta quarta-feira, 25.
Em terreno negativo já pela manhã, a moeda norte-americana acentuou as perdas e tocou no patamar de R$ 5,20 ao longo da tarde, em sintonia com a melhora da performance de outros ativos domésticos, com o Ibovespa virando para o lado positivo e as taxas de juros longas registrando mínimas – movimento atribuído, em parte, aos números positivos da arrecadação federal.
Também contribuíram para a arrancada do real no fim do dia a leve queda do índice DXY, que chegou a operar em alta pela manhã, e o avanço dos preços do petróleo, em dia marcado por apetite ao risco, com alta das taxas dos Treasuries e das Bolsas americanas. Apesar do clima positivo no exterior, as dividas emergentes tiveram desempenho misto, com queda do rand sul-africano e leve alta do peso mexicano, ambos tidos como pares do real.
Por aqui, após correr entre a máxima a R$ 5,2708 e a mínima a R$ 5,2068, o dólar à vista encerrou o pregão em queda de 0,97%, a R$ 5,2113 – o menor valor desde 4 de agosto (R$ 5,1858). Foi o segundo dia consecutivo de recuo firme do dólar, o que praticamente apagou a valorização acumulada da moeda americana no mês (+0,03%).
A avaliação é que a diminuição das tensões fiscais – desencadeada após a fala firme da terça-feira do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a favor da manutenção do teto dos gastos – reduz o prêmio de risco dos ativos locais. A diminuição da temperatura da crise político-institucional, na ausência de novo tiroteio entre o presidente Jair Bolsonaro e ministros do Supremo Tribunal Federal, também é vista como alavanca para melhora da percepção de risco.
Em tal contexto, o real poderia passar a espelhar com um pouco mais de fidelidade os fundamentos das contas externas e se beneficiar do aperto monetário, que aumenta o diferencial de juros e estimula as operações de arbitragem.
“A taxa de câmbio vinha refletindo muito a delicada combinação de crise política e fiscal. E houve um certo alívio com a fala do Lira ontem, de respeito ao teto de gastos, apaziguando um pouco os ânimos. Além disso, o IPCA-15 de hoje, mais alto do que se esperava, chama mais juros, o que, na teoria, ajuda o real a performar bem”, afirma o gerente da mesa de derivativos financeiros da H.Commcor, Cleber Alessie, que ainda vê “muito prêmio de risco” embutido na taxa de câmbio. “Ainda teria espaço para o real se apreciar. Mas a crise política ainda está viva e o mercado não está com muita boa vontade com o Brasil. Qualquer estresse lá fora, pode disparar venda do real”.
Pela manhã, o IBGE divulgou que o IPCA-15 acelerou de 0,72% em julho para 0,89% em agosto, acima da mediana da projeções Broadcast (0,84%). O resultado alimenta as expectativas de que o Banco Central possa acelerar o passo e elevar a taxa Selic em 1,25 ponto porcentual em setembro. Ganham também mais forças as apostas de que a Selic possa atingir 8% no atual ciclo de aperto monetário. Investidores monitoram também o impacto da crise hídrica sobre a dinâmica inflacionária e a possível reação do BC.
A arrecadação em julho somou R$ 171,270 bilhões, melhor resultado da série histórica e acima da mediana de Projeções Broadcast (R$ 157,85 bilhões). No ano, até julho, a arrecadação tem aumento real de 26,11% em relação a igual período do ano passado.
O ministro da economia, Paulo Guedes, aproveitou os números positivos para “bater o bumbo” em torno da recuperação da atividade econômica. “Os nossos fundamentos fiscais estão mais fortes ainda”, disse Guedes, afirmando que possivelmente haveria superávit primário no ano que vem, não fosse a reforma tributária.
Além das declarações de Lira a favor do teto de gastos, o economista-chefe da Integral Group, Daniel Miraglia, chama a atenção para o fato do presidente da Câmara ter adiado a votação da reforma do Imposto de Renda e ter dito que vai pautar a reforma administrativa. “O Brasil estava descolado do exterior desde que foi enviada a proposta de reforma fiscal para o Congresso, que o mercado entende como populista. O adiamento foi positivo”, afirma Miraglia, acrescentando que a alta das commodities, após a informação de que a China conseguiu controlar a variante dela do coronavírus, também ajudou a dar fôlego ao real. “O cenário de médio prazo continua desafiador. Vai entrar na pauta até o fim do ano com mais força a discussão do orçamento de 2022. E a gente tem o 7 de setembro. Precisamos ver como vai ser o movimento de rua a implicação disso na relação entre os Poderes”.
Do lado das contas externas, o BC divulgou, pela manhã, que a conta corrente foi deficitária em US$ 1,584 bilhão em julho, bem acima da mediana das projeções (déficit de US$ 300 milhões), resultado atribuído, sobretudo, à despesa líquida de lucros. Do lado positivo, destaque para a entrada de US$ 6,103 bilhões em julho, acima da mediana de Projeções Broadcast (US$ 4,550 bilhões). Foi também o melhor resultado para o mês desde 2014.
O BC também informou que o fluxo cambial em agosto (até o dia 20) foi positivo em US$ 4,607 bilhões, com entrada de US$ 2,171 bilhões pelo lado comercial e US$ 2,436 bilhões no canal financeiro.
Em relatório, a Genial Investimentos afirma que os “fundamentos da economia brasileira” indicariam uma taxa de câmbio de R$ 4,30 no fim deste ano e que o atual patamar da moeda americana é, em grande parte, determinado pela questão fiscal. “Sinalizar de forma crível que o teto será respeitado, é o instrumento para que o valor de mercado da taxa de câmbio se aproxime do valor determinado pelos fundamentos, contribuindo para o controle da taxa de inflação”, afirma.
Por Antonio Perez
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