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Alternativa ao auxílio é remodelar programas

(Foto: Divulgação)

Com o fim do auxílio emergencial, o Bolsa Família volta a ser o principal mecanismo de transferência de renda do País. O problema é que, além de atender a um número menor de pessoas, ele já estava defasado antes mesmo da pandemia. Há inúmeras propostas sobre a mesa para substituir o auxílio, e a maioria passa pelo aperfeiçoamento de programas que existem – até porque qualquer aumento de despesa esbarraria na completa falta de recursos do governo e no teto de gastos.

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Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper, é um dos autores do Programa de Responsabilidade Social, que visa a aprimorar a rede de proteção social. Pela proposta, é essencial saber a diferença entre dois perfis: aqueles que já são muito pobres e não conseguem se encaixar no mercado de trabalho e os que conseguem se sustentar, mas têm oscilação de renda.

“Para o primeiro grupo, é necessário o Bolsa Família. Já para o segundo, a proposta não é uma renda mínima, mas um seguro: todo mês você deposita um valor para a pessoa e, quando ela precisar, ela saca”, diz.

Já o economista da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) João Romero defende que será preciso rever o teto de gastos, que limita as despesas do governo ao orçamento do ano anterior corrigido pela inflação. “A pandemia trouxe para o centro do debate a necessidade de reforçar mecanismos para garantir o mínimo de dignidade para a população.”

Correções

Enquanto não há uma movimentação política em direção a um esquema mais estruturado, o presidente da Rede Brasileira de Renda Básica, Leandro Ferreira, defende que, ao menos, o Bolsa Família seja corrigido de forma a não ter filas de espera para o programa, hoje em torno de 1,3 milhão de famílias. Com o fim do auxílio emergencial e alta do desemprego, a tendência é que a espera pelo benefício cresça. “Corrigir os valores é urgente. A linha de extrema pobreza do programa, de R$ 89, faz com que muitos pobres não se enquadrem. Não precisa pagar R$ 600 para todos, mas o Bolsa Família precisa ser reajustado”, diz Ferreira.

Rogério Barbosa, pesquisador do Centro de Estudos da Metrópole, da USP, avalia que uma reforma tributária mais progressiva, que taxe mais quem tem mais, será inevitável. “É mais viável um programa de renda que custe R$ 100 bilhões por ano, bem menos do que o auxílio emergencial, que chegou a custar R$ 50 bilhões por mês.”

Para Naércio Menezes Filho, do Insper, é importante que a política de transferência de renda evolua para um sistema que tenha nos jovens de até 18 anos seu público-alvo. “A renda básica deve acompanhar os brasileiros desde a primeira infância. Não é gasto, é um investimento que melhora a produtividade.”

Dependência do Bolsa Família

Ex-morador de rua e integrante de um movimento que luta pelo direito dessa população, Anderson Lopes de Miranda, de 45 anos, pensa em utilizar o apartamento da família como garantia para acesso a crédito e “botar comida em casa”, como ele diz.

“Há mais de dez anos temos o apartamento, mas a gente vai ter de dá-lo como garantia até eu me reorganizar. O auxílio emergencial estava nos dando suporte; deu até para a gente aumentar algumas coisinhas, como a internet, mas agora vamos ter de cortar. A gente comia melhor também, mas vamos precisar reduzir tudo isso.”

No início do pagamento do auxílio, a família tinha uma renda que, se comparada com a atual, pode ser considerada bem alta. A ex-mulher de Miranda já recebia R$ 170 do Bolsa Família antes da pandemia. Por viver com as filhas de 12 e 14 anos, ela passou a receber o auxílio de R$ 1.200. Na mesma época, por ser informal, Miranda também recebia a ajuda, só que no valor de R$ 600 e repassava uma parte para a família.

Conforme o valor do benefício foi sendo reduzido, ele voltou a morar sob o mesmo teto que a ex-mulher e, agora, os mesmos R$ 170 são a única renda fixa que eles têm. “Estamos dependendo do Bolsa Família dela para sobreviver.”

Sem expectativas

“Não tem nada mais doído do que ver um filho passando necessidade”, conta Lucimar Silva, de 50 anos. Informal há quase 30 anos, demorou um mês para começar a receber o auxílio emergencial. Como é mãe solteira, ela teve direito ao benefício de R$ 1.200, dinheiro que usava para as compras do mês e pagar aluguel e as contas básicas, além dos gastos mensais com o tratamento do filho mais novo, que é autista.

Com o fim do auxílio, em dezembro, e o filho mais velho desempregado por causa da pandemia, ela teve de voltar ao trabalho na rua e passou a vender máscaras no centro do Rio. “Evito pegar condução lotada, ando sempre de máscara e com álcool em gel na bolsa. Mas o medo de ficar doente existe, claro. Perdi muitos amigos nessa pandemia e todo mundo conhece alguém que ficou doente. Agradeço por estar saudável.”

O fim do benefício emergencial pesou no orçamento de Lucimar. Com o dinheiro, ela custeava parte do tratamento para o filho, mas mesmo antes da pandemia, a família dela era uma das que estavam na fila do Bolsa Família. Sem o auxílio, ela vai voltar para a lista de espera. “O auxílio me ajudou muito, mas não acredito que coloquem nada no lugar. Só nos resta tentar sobreviver.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Érika Motoda e Douglas Gavras

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