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Covas cita hospital para morador de rua em plano

Candidato à reeleição, o prefeito Bruno Covas (PSDB-SP) propôs, no plano de governo entregue à Justiça Eleitoral, transformar o Hospital Bela Vista, no centro, em unidade de atendimento exclusiva para moradores de rua – modelo inexistente na rede e considerado ilegal por especialistas ouvidos pelo Estadão.

A campanha de Covas informou que o Hospital Bela Vista não terá atendimento exclusivo a moradores de rua, como está escrito no plano de governo, mas, sim, atendimento preferencial. Após ser questionada pela reportagem, a campanha informou que vai alterar o texto do plano de governo.

Reinaugurado em abril para atender pacientes com covid-19, o equipamento já conta com 20 leitos dedicados à população sem-teto desde o mês passado. No total, são 118 vagas que, segundo o plano, ficariam reservadas ao tratamento apenas de pessoas em situação de rua.

Na avaliação do promotor de Justiça Arthur Pinto Filho, especializado em saúde pública, a proposta é discriminatória e, portanto, ilegal. “Agora a discriminação não se dá pela doença, mas pela questão social”, afirmou. A ilegalidade está, segundo Arthur Pinto Filho, no artigo 196 da Constituição Federal, que classifica a saúde como direito de todos e dever do Estado, responsável por promover “acesso universal e igualitário às ações e serviços”.

O promotor também citou o inciso IV do artigo 7.º da Lei Orgânica da Saúde, que determina ao Sistema Único de Saúde (SUS) atender mediante “igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie”.

Símbolo da atenção à população de rua, o padre Júlio Lancellotti, vigário episcopal da Pastoral do Povo da Rua, defendeu a proposta. “Não é um hospital único para atender ‘diferenciados’. É um hospital para atender a área central e também aprofundar questões (ligadas às condições de vida na rua)”, afirmou Lancellotti. “Achamos que é uma coisa boa porque pode, inclusive, aprofundar estudos sobre patologias específicas da população de rua.”

Higienista

Secretário nacional de Assistência Social durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, Marcelo Reis Garcia disse que a proposta é um equívoco sob todos os pontos de vista. “Isso seria puro segregacionismo. As políticas desenvolvidas para a população de rua devem ser baseadas na inclusão.”

Para o assistente social, um hospital exclusivo para moradores de rua representaria ainda uma prática higienista. “O que faremos em seguida? Criar um hospital para prostitutas? Vamos segregar tudo o que a sociedade não gosta?”, questionou.

Professor da Faculdade de Saúde Pública da USP, Mário Scheffer disse que hospitais podem ser referência em determinados tratamentos ou mesmo populações, como mulheres, mas não podem escolher quem atender de acordo com a condição social. Scheffer ressaltou que toda unidade do SUS deve estar aberta para receber um morador de rua. “Isso é reforçado pela Lei 13.714, de 2018, que assegura o direito dessa população à saúde integral, de ser atendida sem necessidade de comprovar domicílio”, disse.

Os problemas de saúde relacionados à população de rua, ainda de acordo com o professor, podem ser tratados, em sua maioria, nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) ou nos consultórios de rua ligados à atenção primária. “Um hospital exclusivo não tem justificativa técnica nem ética. Parece uma proteção adicional, mas não é. Com ele, cria-se uma espécie de ‘apartheid hospitalar’.” Segundo o censo mais recente da Prefeitura, realizado ano passado, a capital tem 24 mil moradores de rua. A contagem, porém, não levou em consideração pessoas que vivem debaixo de viadutos. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Adriana Ferraz, com colaboração de Brenda Zacharias

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