Agora que a campanha eleitoral está nas ruas, candidatos a comandar prefeituras de todo o País começam a prometer soluções mágicas para combater deficiências e ampliar a qualidade do atendimento prestado à população. Mas nem tudo o que funciona precisa ser novo. Soluções de sucesso desenvolvidas por um município vizinho, por exemplo, ou mesmo por outro Estado podem e devem ser copiadas como forma de reduzir custos e evitar desperdícios.
É o que comprovam os três exemplos a seguir selecionados pelo Estadão em parceria com o Centro de Liderança Pública (CLP). Nesta reportagem que encerra a série sobre boas práticas de gestão, o foco são os serviços públicos de qualidade.
Em Petrolina, no interior pernambucano, a iniciativa de uma servidora pública deu tão certo que virou projeto intersetorial, unindo as pastas de Saúde e Educação para tratar dos dentes dos alunos da rede municipal. Em dois anos, já foram atendidas 2 mil crianças de 3 a 7 anos e 51 profissionais da rede estão capacitados a participar do Projeto Sorrisinhos.
Da mesma forma, a prefeitura de Santos, no litoral paulista, aplicou na cidade um programa já desenvolvido de forma semelhante na capital. Para reduzir a mortalidade infantil, passou a oferecer um pré-natal mais completo às gestantes atendidas pelo sistema público. O resultado apareceu: em três anos, o índice de 14 óbitos para cada mil bebês nascidos caiu pela metade.
Replicar programas de sucesso pode dar certo em todas as áreas. Birigui, no interior de São Paulo, é prova disso. Criou um festival literário para incentivar a leitura e, mesmo na pandemia, encontrou uma maneira de manter o evento.
Dentista na escola
O Ministério da Saúde recomenda aos gestores dos municípios que incentivem os profissionais de odontologia a promover ações preventivas em locais como escolas, creches e asilos. Geralmente, esse tipo de atividade envolve palestras, higiene supervisionada e aplicação de flúor. Mas em Petrolina (PE), o quadro foi além: passou a oferecer tratamento de cáries para crianças de 3 a 7 anos dentro das próprias escolas, com o Projeto Sorrisinho.
A história começou em 2017, por iniciativa de uma dentista da Secretaria de Saúde, Tamires Coelho, de 33 anos. De jaleco colorido e acompanhada de um cachorro de pelúcia, chamado Dudu, Tamires atendeu as primeiras crianças na EM Professora Maria Odete Sampaio Gomes.
O tratamento de cáries é possível fora da unidade de saúde por meio de uma técnica pouco invasiva – o Tratamento Restaurador Atraumático (ART) – que substitui o “motorzinho” e outros equipamentos por instrumentos manuais. O consultório é montado na sala de aula ou no laboratório de informática.
“Mesmo sendo pequenininhos, muitos reclamam que sentem dor de dente”, afirmou a diretora do Centro Municipal de Educação Infantil João Paulo I, Rosalina Santana, 47 anos. Tamires esteve na escola entre março e julho de 2019, e cerca de metade dos 400 alunos foram atendidos. A intenção era completar o trabalho no primeiro semestre deste ano, mas as aulas foram interrompidas pela pandemia do novo coronavírus.
“Tem muito pai que trabalha e não tem condição de levar o filho ao dentista”, disse Roseane Araújo, 35 anos. A dona de casa é mãe da Sara, de 6 anos, uma das crianças atendidas no ano passado na CMEI João Paulo I. “Uma criança com dente saudável vai ser um adulto que não vai sofrer.”
Desde 2017, o Projeto Sorrisinho já atendeu 2 mil crianças em 14 unidades da rede municipal de ensino, segundo a coordenadora de Saúde Bucal da Secretaria de Saúde de Petrolina, Roberta Araújo. O número se refere às crianças de 3 a 7 anos que receberam restaurações e não inclui outros estudantes, de até 12 anos, envolvidos na parte educativa do projeto.
Com os resultados obtidos, Tamires passou a trabalhar exclusivamente nas escolas. Agora, 51 profissionais de atenção básica estão treinados e devem atuar, cada um, em uma escola após a retomada das aulas presenciais. A cidade tem 37 mil alunos matriculados em creches, pré-escolas e anos iniciais.
“Se vamos para uma sala de aula e atendemos 20 ou 30 crianças, já diminui a demanda por restaurações na Unidade Básica de Saúde”, afirmou Roberta. Enquanto as aulas não voltam, o Sorrisinho tem feito atendimentos em Centros de Referência de Assistência Social.
Queda na mortalidade infantil
A cidade de Santos (SP) estava em 2014 entre os dez municípios com maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do País. Mas um indicador incomodava a gestão municipal: o coeficiente de mortalidade infantil, que estava em 13,9 – ou seja, eram registrados quase 14 óbitos a cada mil bebês nascidos. O número estava bem maior que a taxa de até 10 óbitos por mil estabelecida como aceitável pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
A saída encontrada para tentar reverter este quadro, depois de um estudo de diagnóstico da situação, foi investir na “ponta” do serviço de saúde municipal, com orientações e cuidado especial às gestantes. Assim surgiu o programa Mãe Santista, no qual mulheres grávidas recebem acompanhamento e atenção específica em exames pré-natais, no parto e no período pós-parto.
As mulheres participantes do programa recebem dois kits de materiais para a gravidez. O primeiro, entregue na primeira consulta, é composto por materiais educativos, com cadernetas de consultas, vacinas e orientações sobre exames necessários. O segundo, entregue mediante a realização de exames e consultas feitos no próprio sistema público, a gestante recebe um enxoval, com camisola, chinelo e roupinhas para o bebê.
Bons resultados começaram a aparecer em menos de três anos e, agora, em 2020, o coeficiente de mortalidade infantil do primeiro semestre de 2020 na cidade foi de 7,2. “Vidas foram salvas”, disse o secretário de Saúde do município, Fábio Ferraz. Para ele, o segredo de uma política pública de qualidade está no planejamento. “Os municípios devem se aprimorar no fator de planejamento. Aprimorar o planejamento e a verificação de resultados é uma agenda necessária para o setor público”, afirmou Ferraz.
Festival na Internet
Com 71 mortes e 2.422 casos positivos de covid-19 na cidade de 120 mil habitantes, Birigui (SP) fará seu Festival Literário, a Flibi, no ambiente virtual, na internet. Os mais de 20 espaços – escolas, praças e teatro – que recebiam os eventos só devem voltar a reunir o público para ouvir escritores e assistir a shows e peças em 2021, em razão da pandemia.
A Flibi nasceu em 2014. Segundo o ex-secretário de Desenvolvimento Econômico da cidade Tadeu Saravalli, a ideia de usar um festival como forma de incentivar a expressão artística local nasceu da constatação da ausência desse tipo de política na cidade. “Políticas como a Flibi devem ser vistas como suprapartidárias”, afirmou.
De acordo com o diretor-geral da Flibi, Paulo Bernardes, o custo médio de produção é de R$ 250 mil – neste ano será de R$ 200 mil -, sendo que 80% vêm de parcerias com instituições culturais e editoras. “A verba efetiva para o festival é captada por meio da Lei de Incentivo ProAC ICMS, do governo do Estado”, afirmou.
Desde sua criação, 600 artistas participaram dos eventos em cerca de 300 atividades. Bernardes disse que o festival resultou na doação de 8 mil livros, atingindo mais de 50 mil pessoas em 43 municípios. Neste ano, o primeiro impacto da pandemia no festival foi a queda da captação de recursos por meio do ProAC ICMS.
“Como alternativa, submetemos o projeto na Lei Federal de Incentivo à Cultura, mas, devido à impossibilidade de seguir as etapas de planejamento da produção executiva, iremos pedir prorrogação do prazo de captação e execução do projeto para 2021”, contou o diretor-geral do festival. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Adriana Ferraz, Samuel Lima, especial para o Estadão, Matheus Lara e Marcelo Godoy
Be First to Comment