O Ministério Público Federal em São Paulo entrou, nesta quarta-feira, 15, com uma ação contra a União pelo abandono da Cinemateca Brasileira, localizada na zona sul da capital paulista. Sem contrato para gestão desde dezembro do ano passado, a instituição sofre com ausência de repasses.
O documento de 83 páginas enviado pelo procurador da República Gustavo Torres Soares para a Justiça Federal detalha as dificuldades enfrentadas pela entidade que, embora tenha previsão orçamentária de R$ 12 milhões para 2020, não recebeu repasses do governo federal este ano.
“A União resolveu – de forma arbitrária, dolosa, voluntariosa e desprovida de motivo juridicamente admissível – abandonar a Cinemateca, sobretudo asfixiando-a financeiramente”, escreveu Soares.
Nos últimos anos, a administração e a gestão da Cinemateca vinham sendo feitas pela União em parceria com a organização social Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp). Como a OS prestava serviços ao Ministério da Educação, os contratos foram firmados na forma de aditivos aos convênios já em curso na pasta – o que deu ao MEC, na condição de órgão supervisor, a prerrogativa oficial sobre a renovação ou não da contratação.
Em dezembro do ano passado, embora os órgãos técnicos da Secretaria da Cultura e dos ministérios da Economia e da Cidadania terem manifestado apoio à continuidade do contrato de gestão, o então ministro da Educação, Abraham Weintraub, determinou unilateralmente o contrário, na iminência do fim do convênio. O MPF diz que o ministro agiu por ‘resistência solitária e exclusivamente político-ideológica’.
“O então titular do Ministério da Educação, Abraham Weintraub, nunca escondeu sua postura radical de ‘guerra ideológica-cultural’ contra órgãos e instituições, públicos ou privados, que promovessem ideias por ele consideradas ‘esquerdistas, marxistas, gramscianas ou algo nesse sentido'”, disparou.
De acordo com a investigação do MPF, mesmo sem ajuda financeira da União, a OS continua mantendo, ‘na medida do possível e com muita dificuldade, a gestão e administração da Cinemateca, para evitar a sua destruição e perda do seu acervo’, mas acrescenta que a situação se tornou insustentável.
Relatórios da Acerp apontam que, além da falta de pagamento da equipe, há débitos junto a Enel e a Sabesp, e comunicados do Serasa sobre a inscrição da OS pelas dívidas. Os contratos para prestação de serviços de vigilância patrimonial, brigada de incêndio, controle de pragas, manutenção predial, climatização e limpeza também foram encerrados.
“Apesar disso, a União permaneceu (e permanece) sem renovar o referido contrato de gestão, nem tampouco avocar para si ou atribuir a outrem a efetiva administração da Cinemateca, deixando esta sob riscos inadmissíveis de degradação e destruição”, argumenta o Ministério Público Federal.
Para a Procuradoria, o governo federal cria instabilidade por da desestruturação administrativa ‘proposital’. O documento cita como exemplos as recentes exonerações do Secretário Nacional do Audiovisual e do Secretário Nacional do Desenvolvimento Cultural. “As comunicações aos entes interessados têm sido feitas por intermédio de chefes ‘substitutos’, ‘interinos’ ou ‘provisórios'”, escreveu o procurador.
O Ministério Público Federal pede que a Justiça determine a renovação emergencial do contrato de gestão com a Acerp em cinco dias e a elaboração de um contrato de um ano com a entidade no prazo de dois meses. Além disso, o órgão requer a reestruturação do Conselho Consultivo da Cinemateca, a apresentação de um relatório e plano de gestão para a entidade e a permanência do corpo técnico especializado que já trabalha no local ou, no mínimo, a transmissão de seu conhecimento, mediante cursos para os eventuais novos funcionários. A Procuradoria também pede que a União apresente à Justiça com antecedência de seis meses antes do final do novo contrato um novo plano de gestão da Cinemateca.
Por Rayssa Motta
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