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Reprovação e notas são polêmica durante pandemia

Depois de mais de dois meses de aulas a distância e com o fim do semestre chegando, escolas passam a se preocupar com a possibilidade de se avaliar ou não os alunos durante a pandemia. Estudo feito pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) mostra que em todos os 50 Estados americanos houve flexibilização de exames e aprovações durante a quarentena. No Brasil, as redes públicas, em geral, deixaram de dar notas e já se discute até um ano sem reprovações. Muitas escolas particulares, no entanto, passaram a aplicar provas online e até a avaliar por meio de projetos sobre a quarentena.

“Não tem ninguém te controlando, você está com a própria ética e moral”, conta Bernardo Savaya Lima, de 17 anos, sobre sua experiência em fazer provas pela internet, de casa, durante a pandemia. “É bem difícil se controlar, porque é só abrir uma aba no Google ou perguntar para alguém em casa. Mas a gente está no 3.º ano, vai fazer vestibular, não posso me enganar”, diz ele, que é aluno do Colégio Porto Seguro, onde agora as avaliações remotas se tornaram frequentes.

“É responsabilidade da escola ter estratégias para diferenciar a aprendizagem nesse momento”, diz a educadora e mestre pelo Teachers College da Universidade de Columbia, Leticia Lyle. Este ano, ela abriu a Camino School, uma escola trilíngue na Barra Funda, que já teve mais aulas online do que presenciais por causa da pandemia. “A criança que está em casa pode estar aprendendo outras coisas que não têm na escola.” Para avaliar os alunos, os professores pediram que eles elaborassem projetos sobre como tem sido o período de quarentena, houve quem enviasse vídeos, desenhos e até um trabalho sobre Minecraft, o jogo de videogame.

Estudo feito pelo Teaching Systems Lab, do MIT, analisando escolas americanas em todos os Estados durante a pandemia mostrou um consenso: fazer ajustes para ajudar os alunos do último ano a se formar. A pesquisa, trazida ao Brasil pela Fundação Lemann, também demonstrou preocupação com questões de equidade, já que os alunos que mais reprovam são de bairros pobres. “Não faz sentido, de forma nenhuma, penalizar os estudantes que estejam em condições desfavoráveis de aprendizagem por causa do seu contexto social e familiar. É preciso atenção às necessidades de cada estudante”, diz o diretor de políticas educacionais da Lemann, Daniel De Bonis

Estados como Massachusetts e Delaware, por exemplo, incentivaram as escolas a não dar notas e apenas avaliar os alunos pela participação em atividades. Em Nova York, os estudantes que se saíram bem no período pré-pandemia já podiam receber os diplomas, já que o coronavírus chegou aos EUA faltando poucos meses para o fim do ano letivo, que é em junho.

“Não é ano para a escola se preocupar com nota e, sim, para acolher, incluir, remotivar os alunos”, diz o especialista em educação Mozart Neves, titular da cátedra Sérgio Henrique Ferreira, da Universidade de São Paulo (USP). Ele se diz totalmente contrário à reprovação em 2020, principalmente na rede pública. “Os meninos estão vivendo um momento muito difícil de isolamento social, pais perderam emprego, parentes perderam a vida. Quando a escola deveria ser mais solidária, para que não abandone de vez os estudos, vai reprovar?”

Pesquisas internacionais mostram que a repetência é um dos principais fatores para evasão de jovens. Ele recomenda que, mesmo as escolas particulares, façam apenas avaliações para verificar a aprendizagem. “Mesmo no ambiente mais favorecido, há estresse, ansiedade, desigualdade”, diz Mozart.

Aprovação automática

Redes públicas de ensino do País ouvidas pela reportagem informaram que não estão fazendo provas ou dando notas aos alunos neste momento. “Nem todos poderiam ser avaliados porque nenhum Estado conseguiu dar acesso à educação a distância para 100% dos alunos”, diz o vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e secretário de Pernambuco, Fred Amâncio. “A nota não deve ser a prioridade neste momento.”

O consenso aqui, segundo ele, é que as redes precisam fazer uma grande avaliação diagnóstica na volta às aulas para entender o que cada aluno conseguiu aprender no período em casa. “Os Estados Unidos estavam encerrando o ano letivo. Nós não precisamos definir questões de aprovação agora, podemos acompanhar e analisar no fim do ano.”

O temor de alguns secretários é de que alunos ou professores se esforcem menos na volta às aulas para recuperar o aprendizado se houver uma determinação para não reprovar ninguém. Fora isso, há a lembrança da chamada “aprovação automática”, como ficou conhecido o sistema de progressão continuada que permitia repetência em apenas algumas séries.

Como ela foi mal implementada no País, sem preparação dos professores para uma avaliação contínua dos alunos, governadores e prefeitos foram acusados de passar as crianças de ano sem que elas aprendessem. “A discussão sobre reprovação tem que ser feita com calma, há ainda uma lembrança ruim na população da aprovação automática”, diz a secretária de Educação de Minas Gerais, Julia Sant’Anna.

Vestibulares

Nos EUA, dezenas de instituições, como Harvard e Universidade da Califórnia, deixaram de exigir este ano que os vestibulandos fizessem o SAT e o ACT, exames de admissão importantes do país.

No Brasil, só depois de muita pressão, o Ministério da Educação (MEC) adiou o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para data ainda indefinida. O governo já estuda também fazer a prova em apenas um dia este ano para diminuir aglomerações e torná-la mais simples. Na semana passada, o vestibular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) anunciou que a prova terá menos questões e será dividida em dois dias. Esperam-se também mudanças no vestibular da Fuvest.

Provas

Apesar da dificuldade na rede pública, não há proibição para que as provas aconteçam no período de fechamento das escolas e educação a distância. O Conselho Nacional de Educação (CNE), em parecer homologado pelo MEC na semana passada, recomenda cuidado para não criar desigualdades, mas sugere algumas formas de se examinar os alunos. Entre elas, provas orais e discursivas, a participação em aulas online e pedidos de pesquisas.

O Colégio Porto Seguro tem avaliado durante a quarentena todos os alunos, até os da educação infantil. Segundo a diretora geral pedagógica Silmara Rascalha Casadei, as professoras estão fazendo relatórios sobre a adaptação das crianças de 4 e 5 anos às aulas ao vivo. Para os do ensino fundamental, são enviados formulários online com exercícios. Elas também precisam gravar vídeos de 5 minutos contando o que aprenderam. “Outras competências acabaram sendo desenvolvidas, como o uso da tecnologia pelas crianças e a apresentação oral.”

Outras escolas têm feito muitas adaptações para conseguir fazer provas. “Não abrimos mão da avaliação, mas fizemos ajustes ao cenário, a cada idade. Quanto menores as crianças, mais usamos novos recursos”, diz a diretora pedagógica da Escola da Vila, Fernanda Flores. Os pequenos dos 1.º e 2.º anos registraram em áudios o que estão vivendo neste momento. Os maiores apresentaram muitos seminários e trabalhos em grupo, em vez de provas.

O parecer do CNE diz que as “avaliações e exames de conclusão do ano letivo de 2020 das escolas deverão levar em conta os conteúdos curriculares efetivamente oferecidos aos estudantes, considerando o contexto excepcional da pandemia, com o objetivo de evitar o aumento da reprovação e do abandono”. E o calendário poderá invadir o ano de 2021, se houver necessidade.

O Colégio Bandeirantes, que tinha segurança rígida durante a semana de provas, agora abrandou a vigilância para avaliações online. “Não tem como ter controle sobre cola e consulta com a prova de casa. Então fazemos questões abertas para que seja mais fácil de perceber se colarem algo do Google e falamos sobre a importância da avaliação”, explica a diretora pedagógica da escola Mayra Ivanoff.

“Deu vontade de olhar a minha apostila para acertar uma pergunta que valia meio ponto, mas mantive a honestidade”, conta Julia Pedra, de 17 anos, aluna do Bandeirantes. Ela diz que antes de saber que haveria provas online ficou preocupada porque achou que poderia não se formar por causa do isolamento. “Como vou ter o diploma do ensino médio se não tiver avaliação”, pensou ela, que está no 3.º ano. Julia conta que tem estudado até mais do que antes da pandemia. “Agora, o aprendizado depende mais de mim.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Renata Cafardo

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