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Bolsonaro atrasa promessas contra covid-19

Parte das medidas anunciadas pelo presidente Jair Bolsonaro como forma de combater a pandemia do novo coronavírus está travada há pelo menos 40 dias. A instalação de 2 mil leitos em UTIs, a compra de 3,3 mil respiradores nacionais e a contratação de 6 mil médicos para hospitais universitários foram alguns dos compromissos que o presidente assumiu publicamente entre março e abril e que não saíram do papel. Para analistas, faltam liderança e articulação política ao governo.

O jornal O Estado de São Paulo fez um levantamento de todas as promessas feitas pelo presidente em pronunciamentos na TV e em suas redes sociais oficiais. Foram 17 compromissos sobre medidas de combate à pandemia entre 17 de março e 21 de abril. Dessas, 41% não foram cumpridas integralmente (mais informações nesta página).

Feita em 20 de março em sua conta no Facebook, a promessa de instalar 2 mil leitos de UTI no País caminha a passos lentos. Nos últimos dois meses, segundo o Ministério da Saúde, foram alugados e distribuídos apenas 340 leitos de UTI volantes (de instalação rápida). Enquanto isso, ao menos cinco Estados estão com mais de 75% de seus leitos para pacientes graves ocupados. O aumento de vagas poderia ajudar Amazonas, Ceará, Pará, Pernambuco e São Paulo a ganhar fôlego no combate à doença. Segundo o Ministério da Saúde, o último edital para contratar vagas não recebeu propostas por causa da “escassez de respiradores no mercado”.

Uma nota técnica elaborada por pesquisadores da Fiocruz apontou que quase 6 em cada 10 municípios não possuem respiradores. No dia 21 de abril, quando o País registrava 2.761 mortes, Bolsonaro prometeu 3,3 mil equipamentos. Até agora, com o número de mortes dez vezes maior, o Ministério da Saúde entregou 1.437. A pasta possuía contrato de mais de R$ 1 bilhão com uma empresa chinesa para compra de 15 mil respiradores, mas, depois de levar calote, cancelou a compra e passou a depender da produção nacional.

O contrato com quatro empresas brasileiras prevê a distribuição de 14,1 mil respiradores. Mas com prazo de entrega de até 90 dias, os equipamentos podem chegar até novembro, quando, segundo as previsões de cientistas, o pico da epidemia pode ter passado. O Ministério da Saúde disse que não há previsão de quando todos os respiradores serão entregues.

Outro compromisso que não saiu completamente do papel foi a aquisição de testes. Bolsonaro prometeu a distribuição de aproximadamente 10 milhões de exames e até agora entregou 6,9 milhões, sendo 4,7 milhões de testes rápidos (sorológicos) e 2,1 de RT-PCR (biologia molecular). Mesmo sendo um dos países que menos testou a própria população, o Brasil segue como segundo lugar entre as nações com mais casos de covid-19 no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Com a subnotificação, especialistas acreditam que o Brasil pode ser o próximo epicentro da pandemia.

Falta ao País um plano de integração e coordenação entre governo federal, Estados e municípios, avalia a presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e professora de epidemiologia do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Gulnar Azevedo. “A situação é grave. Além da inexistência de um plano integrado, há uma lentidão em colocar em prática as ações”, disse a professora. “Não adianta receber o respirador em outubro, os leitos para daqui dois meses.”

Além do não cumprimento das promessas, as crises políticas do governo têm atrapalhado a formulação de uma estratégia de combate à doença, segundo analistas. Por divergências em relação às medidas de isolamento social e ao uso da cloroquina, dois ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, deixaram no período da crise a pasta, que, em tese, deveria formular a estratégia de enfrentamento da covid-19.

Uma análise das medidas provisórias editadas pelo governo durante a crise do novo coronavírus mostra ritmo lento de aprovações. Sem uma base ainda consolidada no Congresso, Bolsonaro manteve a tendência de governar por meio de medidas provisórias também em relação à pandemia. Das 49 propostas encaminhadas ao Congresso que tinham relação com o assunto, 46 são MPs. Todas elas têm validade de 60 dias e podem ser prorrogadas por mais dois meses, mas perderão a validade se não forem aprovadas pelo Legislativo.

Congresso

Até o momento, apenas três MPs passaram pelo plenário e viraram leis: a regulamentação de emendas impositivas para o combate à pandemia, a lei que regula situação de emergência para o combate à crise e a norma que permite à Embratur ajudar no processo de repatriação de brasileiros no exterior.
Ao Estadão, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que está tentando avançar com as MPs. “Esta semana devemos votar cinco ou seis. Neste momento de pandemia cabe MP.”

Analistas políticos afirmaram que o uso de MPs é esperado em momentos de crise, mas alertam para o risco de insegurança jurídica causado por regras que duram apenas 120 dias.

Para a professora Joyce Luz, pesquisadora do Núcleo de Instituições Políticas e Eleições (Nipe) do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), falta diálogo entre Executivo e Legislativo, e muitas das propostas do governo estão sendo feitas sob pressão dos próprios parlamentares. “O Congresso pressionou o Executivo para enviar a MP do auxílio emergencial. Assim como há uma pressão para a edição de uma nova MP que facilite a abertura de crédito para os microempreendedores. O governo poderia, sim, estar fazendo mais se tivesse uma coalização.”

Uma análise do conteúdo das propostas enviadas ao Congresso para mitigar os efeitos da pandemia mostra que mais da metade diz respeito a questões financeiras. “Há poucas propostas partindo do presidente voltadas à proteção mais clara da população, tanto em termos de saúde como social e econômica”, afirmou a professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e coordenadora do Núcleo de Estudos da Burocracia, Gabriela Lotta.

A reportagem procurou o Palácio do Planalto para esclarecimento sobre o não cumprimento de algumas propostas do presidente Jair Bolsonaro, mas foi informada que a demanda deveria ser tratada com o Ministério da Saúde. A pasta, que concentra as medidas ainda não cumpridas, não havia respondido até a conclusão desta edição. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Bianca Gomes e Pedro Prata

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