O anúncio pelo governo do Amazonas da reabertura do comércio na capital Manaus ocorreu numa semana em que o número de novos casos de coronavírus continuou crescendo no Estado. Da segunda-feira, 25, até esta sexta-feira, 29, a quantidade de infectados passou de 30,2 mil para 38,9 mil, sendo que 2,7 mil diagnósticos foram confirmados somente da quinta para sexta. O governo diz que a alta se deve a uma melhoria na capacidade de diagnóstico, mas a prefeitura da capital ainda pede que a decisão de abertura seja revista.
Mesmo com divergências em relação ao governador, o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, propôs uma união de poderes para o enfrentamento da pandemia. Em março deste ano, o prefeito gravou um vídeo direcionado ao governador Wilson Lima afirmando que era “hora de esquecer as diferenças” e que a crise estava “acima de tudo, acima de qualquer questão pessoal”.
Apesar de manterem um diálogo constante, o prefeito se posicionou contrário a decisão do governo em reabrir o comércio. Em entrevista ao Estadão, Virgílio Neto afirmou que o governador sofreu muita pressão empresarial para reabertura do comércio, mas que a decisão é prematura e pode trazer consequências trágicas para capital.
“A (reincidência) é sempre pior que a doença inicial, mas eu disse (ao governador) ‘se o senhor está determinado a fazer, faça. O senhor está muito pressionado. Faça, eu vou torcer, vou ajudar no que eu puder. Vou torcer para estar errado e vou torcer para o senhor estar certo. Se o senhor estiver certo e eu errado, eu vou comemorar. Se eu estiver certo e o senhor errado, eu vou lamentar muito, mas muito profundamente”, declarou.
Para o prefeito, a oscilação no número de casos confirmados e óbitos são fatores trazem um cenário inseguro para reabertura do comércio. Ele defendeu o isolamento social completo em Manaus.
“Eu não sinto que seja clima para abertura e eu tenho uma proposta a fazer. A minha proposta é muito clara: nós juntamos todas as forças do governo do Estado, da prefeitura de Manaus e em esforço sobrehumano, prontos para contrariar interesses, contrariar pessoas, nós impormos pelo menos três semanas, ou seja 21 dias, de efetivo isolamento social. Porque esse é o principal remédio, depois vem o resto”, disse.
“Eu torço para o plano dá certo, vou aplaudir, vou dar o braço a torcer. Mas eu entendo que não é o momento e pode puxar um desastre maior, mais grave. Esse desastre pode significar a perda de mais vidas, o atraso de libertação de Manaus”, acrescentou.
Para abertura gradual do comércio em meio à pandemia, o Governo do montou um planejamento com quatro ciclos que serão cumpridos no período de 1.º de junho a 1.º de setembro. Além de lojas, as igrejas voltarão a reabrir.
No primeiro ciclo, que inicia no dia 1º de junho, retomam as atividades: lojas de artigos variados (como cama, mesa e banho, além de roupas e calçados); joalherias, serviços de publicidades e afins, petshops, agências de turismo, concessionárias, óticas, floriculturas e bancas de revistas em locais públicos.
Igrejas e templos também irão reabrir com condições específicas: apenas 30% de ocupação com eventos de 01 hora de duração e intervalo de, no mínimo, 05 horas entre um evento e outro. Apesar da liberação, a Arquidiocese de Manaus prorrogou a suspensão por mais 30 dias afirmando que com “este cuidado a Igreja contribuiu para a diminuição do índice de propagação do vírus”, declarou em comunicado oficial.
Grupos de risco permanecem em casa nesta primeira fase e não retornam às atividades normais. Caso não haja uma nova crescente de casos de infecções pelo novo coronavírus, o ciclo 2 entra em vigor a partir do dia 15 de junho. Lima já havia antecipado, no domingo, 24, a retomada do comércio porque a “a vida precisa voltar à normalidade”, como o Estadão mostrou. Mas em coletiva à imprensa na terça-feira, 26, esclareceu que a suspensão das medidas restritivas iria depender da curva de casos do novo coronavírus, caso contrário, o Estado iria retroceder com a decisão.
Há possibilidades de novas ondas, alerta especialista
Segundo o infectologista André Patrício, ainda que seja importante a reabertura do comércio para retomada da economia, a chance de uma segunda onda de casos de covid-19 é relativamente alta, como aconteceu em países da Europa. Para o especialista, enquanto não houver medidas definitivas contra o coronavírus sempre haverá o risco de novos picos de casos.
“Tem um grande número de pessoas que não foram infectadas ou são assintomáticas. O retorno da circulação dessas pessoas pode causar um novo aumento no número de casos levando aí, consequentemente, a uma segunda onda – como costuma acontecer em várias pandemias quando não existem medidas mais efetivas contra a doença, além do distanciamento social, principalmente por essas doenças transmitidas por vias respiratórias. Então até que se tenha uma vacina que se mostre eficaz, a reabertura do comércio e de atividades não essenciais pode significar um risco de novas ondas de casos e de óbitos, consequentemente”, declarou.
Por Thaise Rocha, especial para AE
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