O governador do Ceará, Camilo Santana (PT), afirmou, em entrevista, que o País precisa discutir a “partidarização” das polícias militares. Segundo ele, o motim dos agentes de segurança em seu Estado, encerrado no domingo passado, foi um levante político e o caso cearense deve ser analisado sob uma ótica nacional.
“O que vem acontecendo no Brasil é que está se misturando política partidária com a polícia. Militares que entram em partidos, que são candidatos, que sindicalizam candidatos, o que é proibido por lei. Acho que um debate importante a se fazer é até que ponto essa partidarização da polícia tem prejudicado a qualidade e as ações de segurança no Brasil”, disse o governador.
A paralisação durou 13 dias e resultou em uma escalada de violência no Estado – em fevereiro, foram registrados 456 homicídios, maior número desde 2013. Os dados foram divulgados ontem pela Secretaria de Segurança Pública do Estado. Durante o motim, o senador licenciado Cid Gomes (PDT) foi atingido por dois tiros enquanto tentava negociar a retirada de amotinados em um quartel de Sobral, no interior do Estado. Ele avançou com uma retroescavadeira no 18.º Batalhão da PM, onde se concentraram os amotinados.
A piora na segurança pública do Estado levou o presidente Jair Bolsonaro a assinar decreto que instaurou operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) em Fortaleza – a medida foi revogada com o fim da paralisação.
Para Santana, o cunho político do motim fica evidente quando se observam os atores envolvidos e o processo de negociação com a categoria. No dia 13 de fevereiro, o governo do Estado chegou a um acordo com as entidades que representam as tropas e definiram os novos salários. Menos de uma semana depois, no entanto, o motim foi iniciado.
“Quando aprovamos a reestruturação salarial da categoria, teve liderança que chorou por causa do novo salário. Essas mesmas lideranças que comemoraram iniciaram o motim. Quem são essas lideranças? Um é deputado federal, outro é deputado estadual, outro é vereador Ano eleitoral, um movimento que tem um candidato a prefeito que é policial da reserva… Por isso que eu sempre coloco que há um viés político no movimento”, afirmou o governador.
Uma das figuras políticas que apoiaram o movimento no Ceará foi o ex-deputado federal Cabo Sabino (Avante-CE). Ele chegou a ter a prisão decretada ao fim da paralisação e ser considerado foragido, mas teve o pedido de prisão revogado anteontem, e responderá ao processo em liberdade. Em mensagem publicada em suas redes sociais, Santana afirmou estar “indignado” com a decisão.
De acordo com o governador, todos os policiais militares que foram pegos descumprindo a lei “serão punidos com o rigor da lei”. “Nenhum poderá fugir dos atos cometidos.”
Embate
Os méritos pelo fim da crise no Ceará viraram motivo de disputa. O ex-governador do Estado Ciro Gomes, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, e o presidente Jair Bolsonaro trocaram críticas no Twitter.
Ao comentar as negociações para o desfecho do motim, Santana destacou o papel de atores locais, citando a participação da Assembleia Legislativa, do Tribunal de Justiça e do Ministério Público, e reconheceu a importância da atuação do governo federal. “O que eu posso dizer é que eu fui atendido no que eu solicitei ao governo federal. Eu fui atendido quando solicitei uma GLO e fui atendido quando pedi a renovação. Sempre mantive um contato com os ministros da Defesa, da Justiça e da secretaria da Presidência. Foi uma cooperação de esforços”, declarou.
Questionado sobre um dos momentos de maior tensão, quando o governo federal demorou a renovar o decreto para manter a operação de GLO no Estado, o governador respondeu: “Eu nunca imaginei que o governo federal fosse inconsequente de não renovar a GLO até que fosse resolvido o problema”.
Se quanto às medidas adotadas pelo governo Santana não fez críticas, quando o assunto foram as declarações públicas de figuras ligadas ao Planalto – como Moro e o diretor da Força Nacional, Aginaldo de Oliveira -, vistas como simpáticas aos PMs, o governador marcou posição contrária. “Jamais trataria amotinados daquela forma. Fui muito preciso em relação a cumprir a legalidade. Greve, motim, está previsto no artigo 142 da Constituição, é proibido por lei, não é uma questão político-partidária, a questão é de seguir a lei. Não tenho nem teria o comportamento que eles tiveram.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Renato Vasconcelos
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