A desconfiança nas relações entre a Câmara, o Senado e o Palácio do Planalto travou a discussão sobre quem irá decidir o destino de R$ 30 bilhões do Orçamento deste ano. Na tentativa de encerrar o impasse sobre a obrigatoriedade de seguir a destinação deste valor, definida pelo relator do Orçamento, o governo enviou nesta terça-feira, 3, ao Legislativo o três projetos de lei sobre o assunto. Após quase quatro horas de sessão, porém, o Congresso adiou para hoje a decisão sobre o tema.
Os projetos chegaram ao Congresso por volta de 17h, e nem senadores nem deputados quiseram dar um “cheque em branco” ao presidente Jair Bolsonaro. O argumento era o de que poderia haver uma “pegadinha” nas entrelinhas das propostas que nem técnicos mais experientes haviam conseguido identificar.
O receio aumentou depois que Bolsonaro foi ao Twitter dizer que não havia feito nenhum acordo com o Congresso. “Não houve qualquer negociação em cima dos R$ 30 bilhões”, escreveu ele, numa referência ao valor de emendas parlamentares que a Câmara quer manter sob o controle do relator do Orçamento, deputado Domingos Neto (PSD-CE). “Com a manutenção dos vetos está garantida a autonomia orçamentária do Poder Executivo. O PL (projeto de lei) encaminhado hoje (ontem, terça) preserva a programação original formulada pelo governo.”
O post de Bolsonaro irritou os senadores, que estavam propensos a votar a favor do governo. A avaliação é que o presidente quis capitalizar o episódio com o seu eleitorado, em vez de aproveitar a oportunidade para anunciar o acordo com o Congresso. A informação, revelada pelo site BR Político, do Grupo Estado, de que o ministro da Economia, Paulo Guedes, havia almoçado ontem com representantes dos movimentos de rua foi outro fator que azedou o humor no Congresso. No encontro, Guedes pediu que as manifestações do próximo dia 15 se transformassem em atos a favor das reformas. Esses atos estão sendo convocados para criticar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF).
Na prática, a proposta do governo garante a obrigação de pagamento de todas as emendas parlamentares, mas o ritmo da liberação ficará a cargo do Executivo, e não do Congresso. Pelo acordo, metade dos R$ 30 bilhões previstos como emendas de relator seria “devolvida” ao governo, que ficaria responsável por definir como e onde investir os recursos. No diagnóstico do Planalto, a proposta anterior concedia poder excessivo ao relator do Orçamento.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), cedeu ao apelo de colegas que pediram mais tempo para análise das propostas. “Em uma hora não dá para analisar um texto encaminhado pelo Executivo sobre a regulamentação do Orçamento impositivo”, justificou ele. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse que o grupo Muda Senado, composto por 22 parlamentares, vai trabalhar para obstruir a votação do projeto e criticou Alcolumbre pelas tratativas com Bolsonaro. “Não se defende a democracia e as instituições com distribuição de dinheiro”, protestou.
Em conversa com Bolsonaro, anteontem, Alcolumbre chegou a citar a insatisfação com o vídeo sobre as manifestações compartilhado por WhatsApp pelo presidente. Com temor de que o impasse contaminasse a votação dos vetos, o Ministério da Economia proibiu explicações oficiais sobre o acordo. A preocupação era tamanha entre os principais auxiliares de Guedes que a ordem foi manter silêncio absoluto.
Depois de ter sido criticado por Bolsonaro, Guedes mostrou a ele que o custo seria maior, inclusive para a agenda de reformas, caso não houvesse qualquer acerto com o Congresso. O ministro tem uma lista de 12 projetos que definiu como prioritários para a retomada do crescimento. A divisão dos R$ 30 bilhões de emendas de relator foi considerada pela equipe econômica como “um acordo possível”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Adriana Fernandes, Vinícius Valfré, Jussara Soares, Daniel Weterman, Camila Turtelli e Vera Rosa
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