Press "Enter" to skip to content

Bolsonaro pode ser acusado de crime de responsabilidade por convocação para ato

Ao divulgar por seu WhatsApp pessoal uma convocação para ato em apoio ao governo e contra o Congresso Nacional, o presidente Jair Bolsonaro pode ter incorrido em crime de responsabilidade, de acordo com juristas ouvidos pelo Estado de S. Paulo. A informação foi divulgada pela editora do site BR Político e colunista Vera Magalhães nesta terça, 25.

O artigo 7º da Lei 1.079/1950 – que define os crimes de responsabilidade – estabelece entre eles, “provocar a animosidade entre as classes armadas ou contra elas, ou delas contra as instituições civis”. Bolsonaro não negou o envio do vídeo e afirmou que “troca mensagens de cunho pessoal, de forma reservada”. “Qualquer ilação fora desse contexto são tentativas rasteiras de tumultuar a República”, afirmou em nota.

O presidente enviou pelo menos dois vídeos convocando a população a sair às ruas, no dia 15 de março, em defesa do governo em atos contra o Congresso. Com imagens e sobreposição de fotos suas, os vídeos têm trechos idênticos, como a frase que classifica Bolsonaro como um presidente “cristão, patriota, capaz, justo e incorruptível”. Nos vídeos, porém, não há críticas diretas ao Congresso Nacional.

O especialista em direito público Saulo Stefanone Alle, doutor em Direito Internacional pela USP, diz que é necessário analisar com calma o conteúdo efetivamente compartilhado por Bolsonaro e o contexto em que este envio se insere. “É preciso que o conteúdo compartilhado nas redes sociais contenha indiscutivelmente a incitação efetiva. A mera convocação para um ato público, sem o conteúdo efetivo de incitação contra os poderes não me parece suficiente, por si só, para uma acusação de crime de responsabilidade do presidente da República.”

O diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Floriano de Azevedo Marques Neto, classificou como um “absurdo” o envio da convocação do ponto de vista da liturgia do cargo de Presidente da República. “Quanto ao aspecto jurídico, vejo dois problemas. O primeiro é incitar ou contribuir para prejudicar o bom funcionamento dos poderes, no caso o Congresso, o que é, por si só, grave. Mas o pior é, em parte da divulgação, a convocação dos militares para a quebra da ordem constitucional. Incitar os militares contra um dos Poderes constituídos é gravíssimo. É uma hipótese expressa de crime de responsabilidade.”

O diretor ainda pontuou que a desculpa dada por Bolsonaro de que as mensagens teriam sido repassadas no âmbito privado não encontram fundamento em razão do cargo ocupado. “Há um ônus e um bônus em ser Presidente da República. Um dos ônus é que você deixa de ter espaço para mensagens reservadas, porque enquanto se ocupa o cargo, não se deixa de ser presidente. O peso de uma declaração, mesmo que no âmbito privado, continua sendo de um presidente.”

Em panfleto que circula pelas redes sociais, assinado apenas por “movimentos patriotas e conservadores”, fotos do general Heleno, do vice-presidente, Hamilton Mourão, e de outros generais com cargos públicos aparecem numa convocação para o ato. No texto, se diz que “os generais aguardam as ordens do povo”. E em seguida um bordão: “Fora Maia e Alcolumbre”.

A advogada constitucionalista Vera Chemim, mestre em Direito Público pela FGV, também diz que a ação de Bolsonaro pode fundamentar um pedido de impeachment. “O vídeo presidencial, embora de caráter pessoal, pode provocar um pedido de impeachment, com base no artigo 6º da Lei 1.079/1950. O referido vídeo incita a população a “protestar contra o Congresso Nacional, cujas Casas Legislativas representam o Poder Legislativo, um dos pilares da democracia e de um Estado Republicano.”

Doutor em Direito Penal pela USP, Conrado Gontijo vê um ataque à democracia. “A manifestação de apoio do presidente Bolsonaro a um ato político contra o Congresso é um escândalo, um grave atentado à democracia. Se efetivamente ele manifestou apoio a esse tal movimento, em minha visão, praticou crime de responsabilidade e deve ser alvo de processo de impeachment.”

Maristela Basso, também da USP, diz que o presidente infringiu o decoro do cargo que ocupa. “(Bolsonaro) ultrapassou todos os limites que seu cargo exige: correção, bom senso, honradez e educação . Ademais, infringe a dignidade, a honra e o decoro que o chefe do Poder Executivo é obrigado a observar.”

O Estado mostrou que o ex-deputado Alberto Fraga confirmou que, antes do carnaval, recebeu um destes vídeos do próprio Bolsonaro, por meio do WhatsApp. A mesma peça foi enviada na segunda-feira, 24, pelo secretário da Pesca, Jorge Seif Jr, a seus contatos no Whatsapp. Seif já foi apelidado por Bolsonaro de “filho zero seis”, tamanha sua proximidade.

Por Matheus Lara e Renato Vasconcelos

Be First to Comment

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *