Os promotores linha dura se insurgiram contra o que classificam de ‘destinação indiscriminada’ de recursos públicos a partidos políticos com base no bilionário Fundo Especial de Financiamento de Campanha.
Por meio de Ação Direta de Inconstitucionalidade protocolada no Supremo Tribunal Federal, a Associação Nacional do Ministério Público Pró-Sociedade, entidade que reúne promotores e procuradores de Justiça em quase todo o País, fustiga os artigos 1.º a 3.º da Lei federal 13.487, de 6 de outubro de 2017, que autoriza a criação do Fundo, e a Rubrica 71906 da Lei federal n.o 13.978, do último dia 17 de janeiro (Lei Orçamentária Anual 2020), que, ao estimar a receita e fixar a despesa da União para o exercício financeiro deste ano, prevê despesa de R$ 2,034 bilhões para a campanha eleitoral.
“É incompatível com a Constituição da República a destinação indiscriminada de recursos públicos a uma entidade privada, no caso, os partidos políticos sem que haja uma destinação pública ou social para a referida verba de natureza pública, bem como sem a necessária previsão constitucional de tal gasto, tal como se dá com a fundo partidário previsto no artigo 17, parágrafo 3.º”, sustentam os promotores.
Eles destacam aos ministros do Supremo que o texto constitucional – artigo 165, § 5.º -, prevê que a Lei Orçamentária, ao fixar as despesas da União para aquele exercício financeiro, deve prever num único documento os três tipos de orçamentos – o orçamento fiscal, o orçamento de investimento e o orçamento da seguridade social.
“No caso da Lei federal 13.487, de 2017, que cria o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, não há qualquer interesse público ou social na realização do referido gasto, já que nos termos da legislação civil (Código Civil, artigo 44, V), os partidos políticos são pessoas jurídicas de direito privado”, alerta MP Pró-Sociedade.
Os promotores argumentam que a previsão de tal despesa não encontra qualquer amparo constitucional, diversamente do que ocorre com o Fundo Partidário.
“Cria despesa pública para atender a interesses meramente privados, configurando uma imensa improbidade administrativa autorizada por lei inconstitucional!”
A ação diz que ‘o rigor com que o gasto de dinheiro público é tratado pela Constituição, que previu regras rígidas na previsão, glosa e fiscalização da aplicação de todo recurso financeiro, não pode ser ignorado pelo legislador ordinário, uma vez que no Brasil a gestão fiscal pressupõe uma ação planejada que previna riscos e corrija desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas’ – nos termos do artigo 1.º da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Os promotores consideram que ‘não se pode permitir que o legislador ordinário, ignorando o arcabouço constitucional e legal que trata da despesa pública, toda informada pelos princípios da legalidade, moralidade e eficiência, fixe despesa sem atender aos parâmetros mínimos da gestão fiscal e destine dinheiro público em favor de entidades privadas sem qualquer interesse social relevante’.
Eles são taxativos. “Não se ignora que parte desse recurso de ordem bilionária será gasto em desvios e corrupções, como mostra a farta jurisprudência dos Tribunais Regionais Eleitorais espalhados pelo Brasil.”
Adiante, ponderam. “Não se justifica, com efeito, num país com 52 milhões de pobres a destinação de bilionária cifra orçamentária para satisfação de interesses meramente privados de candidatos ao pleito municipal de 2020, em absoluta inversão e violação a um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, que consistem em ‘erradicar a pobreza e marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais’.”
Comparam o montante previsto para abastecer o grande Fundo. “O valor bilionário destinado ao Fundo Especial para Financiamento de Campanha neste ano é suficiente para sustentar quase 4 milhões de pessoas assistidas pelo programa federal do Bolsa Família em 2020. Logo, não se justifica minimamente tal tipo de gasto público, sob pena de se incorrer numa enorme improbidade administrativa legalizada e uma grave violação às prioridades de nossa República.”
MP Pró-Sociedade indica ‘prejuízo direto para as políticas públicas de 2020 que envolvem os direitos sociais à saúde, à educação e a assistência aos menos favorecidos, as quais poderiam receber valores maiores na LOA 2020 caso não fossem destinados mais de R$ 2 bilhões ao inconstitucional Fundo Especial de Financiamento de Campanhas’.
A entidade requer medida cautelar ‘a fim de que seja suspensa a aplicação do artigo 16-C da Lei das Eleições, acrescido pela Lei federal n.o 13.487, de 6 de outubro de 2017, que autoriza a criação do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas, bem como a anulação da previsão orçamentária constante do Autógrafo 71906 do Anexo I da LOA 2020, que prevê a despesa de mais de R$ 2 bilhões para o Fundo Especial de Financiamento de Campanha’.
Após a citação da União (Congresso e Presidência da República) e a manifestação da Procuradoria-Geral da República, MP Pró-Sociedade requer declaração de inconstitucionalidade, com efeitos retroativos, dos artigos 1.º a 3.º da Lei federal n.o 13.487, de 6 de outubro de 2017, que autoriza a criação do Fundo, e da Rubrica 71906 da Lei federal n.o 13.978, de 17 de Janeiro passado, que prevê a despesa de R$ 2 bilhões para financiamento de campanha eleitoral.
Por Pepita Ortega e Fausto Macedo
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