Pela primeira vez desde 2014, o investidor brasileiro é maioria na Bolsa de Valores de São Paulo (B3). No ano passado, com a queda na taxa de juros para o menor patamar da história, a participação do capital nacional no mercado de ações ultrapassou a do estrangeiro – 52% ante 48% – e sustentou a alta do Bolsa paulista. A expectativa para 2020 é que esse movimento se mantenha diante da crescente demanda interna, com investidores em busca de novas alternativas para remunerar o capital.
Os estrangeiros, por sua vez, pegaram o caminho inverso. Em 2019, diante de um cenário internacional mais adverso com a guerra comercial entre Estados Unidos e China e crises nos países latino-americanos, eles retiraram cerca de R$ 40 bilhões da Bolsa paulista, contrariando as previsões de que após a reforma da Previdência haveria uma enxurrada de dinheiro para o País. Neste ano, o movimento de aversão aos ativos brasileiros continuou com saída de R$ 16 bilhões até o dia 29.
“Ainda há um ceticismo por parte do investidor estrangeiro em relação às questões econômicas do Brasil. Eles não foram contagiados pelas mudanças”, diz o economista da Tendências Consultoria Integrada, Silvio Campos Neto. Ele destaca, entretanto, que o estrangeiro ainda tem presença relevante nas ofertas públicas (IPO e Follow-on), que devem voltar neste mês com a venda de ações por parte de empresas do governo.
Esse movimento, porém, não deve tirar o protagonismo do investidor brasileiro da Bolsa, avaliam os economistas. A expectativa do mercado é que, na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que ocorre nesta terça, 4, e quarta, 5, os diretores decidam por um corte de 0,25 ponto porcentual, levando a Selic a 4,25% ao ano. A redução deve empurrar outros investidores para a Bolsa, seja de forma individual (pessoa física) ou por meio de fundos de investimentos.
“O cenário é muito favorável com juro baixo e perspectiva de maior crescimento econômico”, afirma a analista de ações da XP Investimentos, Betina Roxo. Segundo ela, um dos números que comprovam o potencial de crescimento do mercado no cenário atual é a participação dos fundos de investimentos na Bolsa, que em dezembro alcançou 9,2%. Apesar da forte evolução no ano passado, a fatia está longe dos 14% de 2007, diz ela.
Fundos de investimento
De acordo com a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), em 2019, a captação líquida dos fundos de ações cresceu quase 200%, para R$ 86 bilhões. Enquanto isso, a captação dos fundos de renda fixa ficaram negativas em quase R$ 70 bilhões. “Depois de décadas de retorno fácil, o investidor brasileiro está tendo de se acostumar com riscos novos. É uma revolução. Saímos de um mundo fácil para outro que tem de tomar risco”, afirma Campos Neto, da Tendências.
No caso do investidor pessoa física, a expectativa também é de forte crescimento. Hoje, diz o sócio da assessoria de investimentos Monte Bravo, Rodrigo Franchini, são 1,65 milhão de CPFs. Esse número, nos cálculos dele, deve saltar para 2 milhões de CPFs – avanço de 21%. Segundo o executivo, esse movimento mais forte do investidor local na Bolsa torna o mercado mais saudável e mais suscetível aos solavancos do mercado externo.
“Nesses casos, de estresse internacional, a Bolsa cai, mais sem desespero, pois o investidor local sustenta o mercado”, diz ele, que prevê o Ibovespa em 140 mil ponto no fim do ano. Franchini acredita que, com maior perspectiva de crescimento econômico e dissipação dos riscos do coronavírus, o investidor estrangeiro voltará ao mercado brasileiro.
O estrategista do Itaú BBA, Lucas Tambellini, concorda. Na avaliação dele, o que está ocorrendo é que o movimento do brasileiro na Bolsa está mais forte que o do estrangeiro, diz o executivo. “E vai continuar assim. O investidor local continuará sendo o protagonista da bolsa. É ele que vai ditar a movimentação do mercado em 2020”, diz Tambellini, que projeta o Ibovespa em 132 mil pontos e não vê com preocupação o risco de uma bolha.
Betina Roxo também é cética em relação ao assunto. Alguns fatores explicam o motivo do otimismo, como a manutenção dos juros baixos por um tempo mais longo, o crescimento econômico acima de 2% depois de uma longa recessão e a discussão de novas reformas, como a administrativa e a tributária. Tudo isso tende a sustentar o Ibovespa, que no ano passado subiu 32% pelo terceiro ano seguido. “A Bolsa não está supervalorizada. Há fundamento para a valorização de muitas empresas”, corrobora Alexandre Silverio, CIO da AzQuest.
COLABOROU TALITA NASCIMENTO
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