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Grupo CasaPound reinventa o fascismo italiano

Eles ocupam prédios públicos na capital italiana. O direito à moradia é só uma das pautas sociais e políticas que o movimento propõe. Inconformistas, antiglobalização e críticos do capitalismo internacional. Tudo leva a crer que seja mais um movimento de esquerda, mas não é. Na verdade é CasaPound, o movimento de extrema direita que reinventou o fascismo italiano. Nasceu como uma ocupação em 2003 e virou um movimento político tendo participado, inclusive, as eleições europeias.

Segundo Gianluca Iannone, fundador do movimento, CasaPound vai além da divisão tradicional entre direita e esquerda. Fiéis seguidores de Benito Mussolini, ex-ditador italiano, e admiradores Che Guevara ao mesmo tempo, eles são os “fascistas do Terceiro Milênio”. O nome CasaPound não foi escolhido a caso, é uma homenagem Ezra Weston Loomis Pound (1885-1972), um poeta americano fascista e anti-semita.

Quem chega em Roma não imagina que a três quadras de Termini, a estação central de trem, exista uma ocupação e muitos menos que essa ocupação seja CasaPound. Localizada em um prédio de tijolos da década de 1930, na rua Napoleão III, é fácil identificá-la: bandeiras vermelhas que carregam uma tartaruga como símbolo esvoaçam com o vento. Uma fica no cume do prédio, a outra na fachada, no centro do edifício. Abaixo da bandeira, até pouco tempo atrás, se via a escrita CasaPound em gigantes letras metálicas. Um quadro perfeito da arquitetura fascista.

História da ocupação

“Escolhemos aquele edifício por ser uma propriedade do governo, se fosse privada, provavelmente teríamos sido despejados muito facilmente”, disse Simone di Stefano, vice presidente nacional do movimento, durante uma entrevista exclusiva ao Estado. Atualmente vivem no prédio 18 famílias, cerca de 70 pessoas, e quase todas estão ali desde o começo da ocupação. “É um prédio normal, somente a portaria é gerenciada pelos militantes que controlam quem entra e sai. Temos uma sala de reunião onde fazemos encontros e conferências”, explica Di Stefano.

As letras que marcaram a entrada do prédio por anos foram retiradas por ordem da prefeita da cidade Virgina Raggi. “Talvez, quando ela não for mais prefeita, colocaremos novamente. Não pensamos que aquela escrita causasse tanto dano a cidade.”

“Já se passaram 16 anos e muita coisa mudou nesse tempo, inclusive a emergência habitacional não é mais a mesma. Roma é uma cidade de prédios ocupados, hoje são cerca de 80 em toda a cidade. Os aluguéis são sempre altos e é impensável comprar uma casa. Por outro lado, o Estado não constrói mais moradias populares”, contou o italiano. Se para o movimento a ocupação é uma resposta à crise habitacional, os 16 anos que vivem dentro do prédio produziram um dano ao fisco igual a 4,5 milhões de euros por falta de cobrança de impostos. Dinheiro que talvez pudesse ter sido investido numa política de moradia.

Bairro multiétnico

O prédio de seis andares fica em Esquilino, um dos bairros mais multiétnicos da cidade. A comunidade chinesa está ali desde 1970 e, provavelmente, a maioria dos militantes de CasaPound não eram nem nascidos. Barracas de mercadorias de indianos dividem as calçadas com lojinhas de bugigangas chinesas, mercadinhos paquistaneses e kebabs árabes. E, curiosamente, neste contexto mais improvável possível para um radical de extrema direita viver, nasceu CasaPound.

Para Di Stefano, o movimento tem “uma ótima relação com a comunidade chinesa”, tanto que uns cinco anos atrás até os convidaram para participar a uma conferência que porque queriam entender como viviam. Porém, para as comunidades estrangeiras, essa convivência parece gerar medo ou desconforto. Como explicar, senão, o fato de que a reportagem esteve em sete lojas para conversar sobre o tema e somente uma pessoa aceitou falar, desde que o anonimato fosse preservado.

Segundo esse simpático senhor que está no bairro há poucos anos, de vez em quando alguém do movimento vai à sua lojinha. Um dia, curioso, perguntou o que pensavam em relação aos estrangeiros, visto que ele é um. “Se tem trabalho, não é um problema, se não tem, que volte para seu país”.

O que condiz com o pensamento do grupo. “Queremos as fronteiras fechadas porque a imigração faz mal à Itália, simplesmente, porque são trabalhadores a baixo custo importados e isso dificulta uma política de aumento de salários. Enquanto não encontrarmos uma solução de trabalho para os italianos e para os estrangeiros que já moram aqui, é inútil fazer com que outras venham. Estamos já cheios de imigrantes que são mantidos pelo Estado. Devemos pensar em como desenvolver a África ou países de onde provêm essas pessoas”, disse Di Stefano.

O posicionamento radical contra a chegada de imigrantes não se abala nem mesmo diante a casos de pessoas que fogem de situações de guerra ou discriminação sexual. “Não podemos nos ocupar dos problemas do mundo, quantos serão realmente os homossexuais que escapam não sei. A maioria dos que vêm para cá são imigrantes econômicos, alguns vêm para trabalhar, outros para traficar. os que vêm para trabalhar vão parar nas fazendas ganhando 30 euros por dia. O preço do trabalho diminui e os italianos também acabam sendo explorados por isso.”

Para ele, a questão dos direitos é um discurso perigoso. “A constituição italiana diz que qualquer um que não tenha os mesmos direitos que existem na Itália pode ser receber o asilo humanitário. Mas isso foi pensado em uma época em que as pessoas não haviam toda essa capacidade de locomoção.”

Radicalismo e violência

Hoje o movimento conta com cerca de 15 mil inscritos nas 120 sedes espalhadas pela Itália. Ano passado o movimento elegeu 63 vereadores pelo país, mas resolveu se afastar da política depois do fiasco das eleições europeias. “Saímos da política porque não nos deixaram falar. Existe uma oferta de partidos soberanistas, mas que dizem as mesmas coisas e uma coalizão seria impensável porque CasaPound é um pouco mais radical”, explicou o líder do movimento.

O radical talvez pela violência a qual é ligado o movimento. “De 2011 a 2016, 359 militantes e líderes de CasaPound foram denunciados por agressões, roubos, ocupações abusivas”, segundo reportagem publicada pela revista Donna Moderna, em maio de 2019.

CasaPound poderia ser a casa onde mora o antagonismo.Afinal foi o próprio Di Stefano a dizer que o movimento é soberanista com raiz socialista e ele um fascista e socialista. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Janaina Cesar, especial para o Estado

Estadão Conteúdo

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