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Para recuperar Flórida, democratas buscam levar jovens latinos a votar

A língua oficial nas ruas de Doral, cidade no subúrbio de Miami, é o espanhol. A dificuldade para se pedir orientações em inglês é uma peculiaridade de localidades da Flórida, uma das regiões que, por não terem clara preferência por democratas ou republicanos, são as mais disputadas na campanha presidencial. Em 2016, o Estado elegeu Trump com 49% dos votos, depois de dar a vitória duas vezes a Obama. Para ganhar em 2020, democratas apostam no comparecimento em novembro de jovens de origem latina. E o primeiro passo para isso é fazê-los participar das primárias desta Terça-feira.

Enquanto cubanos anticastristas são em geral conservadores, os estudantes descendentes de outras nacionalidades tendem a votar por democratas. Entre 2000 e 2017, a população de venezuelanos nos EUA cresceu mais de 300% e superou as 420 mil pessoas. Mais da metade do grupo vive na Flórida, e Doral se tornou o coração dos venezuelanos no país.

Em frente ao restaurante El Arepazo, o venezuelano Oscar Rivas é minoria. Ele não votou em Trump em 2016, apesar de se definir como republicano. “Trump é muito egocêntrico, não entregou suas declarações de imposto de renda. Tenho a sensação que ele tem ligações com Vladimir Putin”, diz o aposentado. Ele mesmo alerta que os venezuelanos de sua geração pensam diferente.

Recuperar em novembro os 29 delegados que a Flórida possui no Colégio Eleitoral não seria suficiente para os democratas vencerem em novembro Donald Trump. Mas uma vitória diminuiria a distância que o republicano teve sobre Hillary Clinton em 2016.

O El Arepazo virou um comitê informal de apoio ao Juan Guaidó, o opositor a Nicolás Maduro reconhecido pelo governo Trump e por outros países, como o Brasil, como presidente interino da Venezuela. Em abril do ano passado, venezuelanos lotaram as mesas do pequeno restaurante para assistir pela televisão aos desdobramentos de um dos protestos antichavista na Venezuela, como se fosse uma final de campeonato de futebol.

“Já é hora de os jovens começarem a tomar as rédeas da política”, afirma Oscar Rivas, que vive há 10 anos na Flórida e era engenheiro civil na Venezuela. O conflito geracional na região é explícito. Os jovens de origem hispânica não vacilam para dizer que votarão em um democrata neste ano. Questionados sobre a opção de seus pais, a resposta também é padronizada: votaram e votarão em Trump.

“Não tenho um partido definido, mas tenho preferido os democratas, afinal eu tenho origem hispânica”, disse Jenifer Azevedo, de 21 anos, cujos pais são de El Salvador. Ela vai votar pela primeira vez para presidente, assim como Erik Espinoza, 18 anos, de origem peruana.

Espinoza disse que sua família foi muito beneficiada durante o governo Trump e apoiará a reeleição do presidente. Ele afirmou preferir Joe Biden, apesar de reproduzir um discurso crítico à imigração comumente visto em casas republicanas. Para o jovem, que tem colegas de faculdade descendentes de cubanos e venezuelanos, a imigração da Venezuela está “estragando” o Peru. O único candidato que ele rejeita é o senador Bernie Sanders.

Com uma tradicional comunidade de cubanos e a diáspora mais recente de venezuelanos, a política externa é um pilar importante dos candidatos a presidente no local.

Em pesquisa recente conduzida pelo instituto Mason-Dixon Polling & Strategy, apenas 18% dos eleitores de origem hispânica no Estado disseram que votariam em um candidato que se define como socialista, como Bernie Sanders.

Trump tem direcionado esforços de campanha para manter sua força repetindo mantras contrários ao socialismo, que impulsionaram sua candidatura na Flórida. Foi em Miami que John Bolton, ex-conselheiro de Segurança Nacional de Trump, classificou Cuba, Nicarágua e Venezuela como a “troika da tirania”.

Se confirmadas as pesquisas, Joe Biden sairá muito na frente na primária de terça-feira. Até sexta-feira, o ex-vice-presidente tinha 66,4% das intenções de voto, ante 23,6% dos eleitores que planejam votar em Sanders. A última pesquisa que prospecta o resultado de novembro no Estado mostra Trump com vantagem sobre os dois democratas, mas no caso de Biden a vitória seria apertada: um ponto porcentual de diferença. Desde 1996, o candidato que vence na Flórida triunfa também na eleição para presidente.

Estado estratégico

A Flórida é o quarto Estado com mais peso na escolha democrata, com 219 delegados na convenção partidária, perdendo apenas para Califórnia, Texas e Nova York.

Até agora, Joe Biden tem 889 dos delegados partidários e Bernie Sanders, 735. A distância entre os dois tende a se ampliar nesta terça-feira e a Flórida pode ser uma pá de cal sobre as intenções de Sanders. No mesmo dia, Ohio, Illinois e Arizona também fazem prévias. Em todos, Biden aparece com folga nas pesquisas de intenção de voto.

Isabella Ashby, de 19 anos, e Fiorella Biagioni, ou Fifi, como ela pede para ser chamada, de 21 anos, concordam em quase tudo. As duas amigas estudam ciência política na Flórida International University, onde Donald Trump esteve ano passado para um comício, e fazem questão de mostrar os conhecimentos em política internacional ao discutir as eleições deste ano.

Isabella tem pais porto-riquenhos e Fifi, origem venezuelana e colombiana. As duas votarão por democratas “não importa o que aconteça” e rejeitam as políticas de Trump, especialmente as restrições a imigrantes.

Elas divergem quanto ao candidato preferido na oposição. Isabella quer ver Biden nas urnas em novembro porque “não concorda com o socialismo” de Sanders. Já Fifi prefere o senador “apesar” da sua classificação como socialista democrático: “Eu queria votar em Elizabeth Warren. Mas agora votarei no Bernie. Não acredito que ele seja totalmente socialista”.

O desafio do partido é fazer com que latinos de outros países, que não Cuba, votem, especialmente os jovens. Enquanto 54% dos cubanos no Estado tendem a votar pelos republicanos, eleitores de origem hispânica de outras nacionalidades pendem para os democratas – a porcentagem de apoio ao Partido Republicano é de 26% considerando as demais nacionalidades. Em 2016, 41% dos cubanos na Flórida votaram em Hillary Clinton, enquanto o apoio entre latinos que não são da ilha foi de 71%.

“É uma loucura que cubanos e venezuelanos daqui gostem de Trump. Uma maluquice!”, afirmou Fiorella. A amiga, Isabella, diz que estudou no norte da Flórida quando criança e todas as famílias eram cubanas e republicanas. “Depois de já terem passado por isso (migrar), eles se tornam conservadores, criticam a imigração. Depois que conseguiram, não querem que ninguém mais consiga. Miami foi construída com a imigração. E temos um presidente contra imigrantes, racista, sexista, é um absurdo”, criticou a jovem.

A porcentagem de latinos aptos a votar na Flórida cresceu nos últimos anos, com a chegada de venezuelanos e porto-riquenhos. Com isso, a fatia de cubanos neste eleitorado caiu para perto de 30%. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Beatriz Bulla, enviada especial

Estadão Conteúdo

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