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PMs apontam armas para adolescentes negros filhos de diplomatas em abordagem no Rio

Policiais militares apontaram armas para um grupo de adolescentes com idades entre 13 e 14 anos durante abordagem na porta de um condomínio em Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro. Dos quatro meninos, três eram negros e um era branco.

A abordagem foi registrada por câmeras de segurança. As imagens mostram os policiais descendo com pressa da viatura e apontando armas contra os jovens, que são conduzidos até um muro. Depois de revistar os adolescentes, os policiais os liberam e vão embora.

Os jovens negros são filhos da embaixatriz do Gabão e de diplomaras de Burkina Faso e do Canadá, que viajaram à cidade para passar férias. O adolescente branco é neto do jornalista Ricardo Noblat – em uma rede social, ele disse que os meninos estavam jogando futebol em uma praça do bairro momentos antes da abordagem.

O episódio motivou um pedido formal de desculpas do Itamaraty aos embaixadores do Gabão e de Burkina Faso, e o anúncio de que o governo do Rio de Janeiro será acionado para que apure rigorosamente o ocorrido e responsabilize adequadamente os policiais envolvidos.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, um pedido de desculpas será entregue em mãos ao embaixador do Canadá ainda nesta sexta-feira.

Em relato publicado no X (antigo Twitter), a mãe do adolescente branco, Rhaiana Rondon, conta que os quatro amigos moram em Brasília e planejaram a viagem de férias há vários meses.

Eles tinham acabado de deixar um amigo na porta do prédio, por volta das 19h, “quando foram abruptamente abordados por policiais militares, armados com fuzis e pistolas, e sem perguntar nada, encostaram os meninos (menores de idade) no muro do condomínio”, disse ela.

“Com arma na cabeça e sem entender nada, foram violentados. Foram obrigados a tirar casacos, e levantar o ‘saco'”, acrescentou a mãe do jovem, que classificou a abordagem racista. O relato foi publicado na rede social pelo cunhado de Rhaiana, o jornalista Guga Noblat.

No texto, ela afirma adolescentes foram questionados sobre o que faziam na rua, e só foram liberados quando o menino brasileiro disse que eram de Brasília e estavam lá a turismo, já que os demais não falam português. Antes de serem liberados, os meninos teriam sido alertados “que não andassem na rua, pois seriam abordados novamente”.

Procurada, a Polícia Militar do Rio de Janeiro disse que os policiais envolvidos na ação usavam câmeras corporais e que as imagens serão analisadas para verificar se os agentes cometeram algum excesso.

“Em todos os cursos de formação, a Secretaria de Estado de Polícia Militar insere nas grades curriculares como prioridade absoluta disciplinas como Direitos Humanos, Ética, Direito Constitucional e Leis Especiais para as praças e oficiais que integram o efetivo da Corporação”, acrescentou a instituição.

‘Forças de segurança veem no negro uma ameaça’, diz reitor
José Vicente, reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, diz que o caso enfatiza “as duas dimensões que nós temos discutido nesta agenda, sobre racialidade e fator socioeconômico”.

“Havia, em algum momento, uma teoria em que se dizia que o preconceito seria social e não racial. Ou seja, que se um negro tivesse dinheiro no bolso, ele não sofreria discriminação. Isso foi desmentido e este caso novamente desconfirma esta teoria. A descriminalização não é só social. Ela é racial, é aguda e é violenta”, afirma.

Mesmo sendo filhos de diplomatas, ressalta Vicente, e tendo boas condições financeiras, “esses adolescentes negros foram abordados pela polícia de forma violenta por conta da sua cor, pelo preconceito de cor”.

“Jovens negros são constantemente hostilizados e agredidos pela polícia, por agentes do Estado. Isso é rotina para esta população. Todos os dias temos jovens negros violentados e isso se tornou tão comum que eles sequer se tornam estatística ou têm seus casos veiculados pela imprensa, principalmente quando são negros e pobres”, aponta.

Neste caso, fica claro também, de acordo com o reitor, que, “se for contra filhos de diplomatas, as pessoas se levantam”. “Mas se for contra filhos de lavadeiras, ninguém se levanta. A agressão não pode ser justificada contra ninguém. Precisamos de uma polícia cidadã, que não distingua as pessoas pela sua classe social e a sua raça”.

“É preciso transformar a mentalidade do Estado, que é um Estado que agride os negros, e da policia, das forças de segurança, que veem no negro uma ameaça, um suspeito, para que ela possa ser, de fato, uma amiga e aliada do cidadão. É preciso parar de desumanizar o cidadão negro do nosso País.”
*Este conteúdo foi produzido em parceria com a Faculdade Zumbi dos Palmares.

Por Redação

Estadão Conteúdo

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