Um movimento coordenado de conselheiros indicados pelo governo está por trás da decisão da Petrobras de não pagar dividendos extraordinários relativos ao balanço do quarto trimestre de 2023. O anúncio feito pela Petrobras na noite de quinta feira, 7, junto com a divulgação dos números do balanço de 2023, de que não iria distribuir dividendos extraordinários – num total de R$ 49,3 bilhões – fez despencar as ações da empresa nesta sexta, 8, na Bolsa de Valores (B3). Os papéis chegaram a perder mais de 13% ao longo do dia, e encerraram o pregão com baixas de 10,37 (ON) e 10,57% (PN). Foi o pior desempenho das ações da estatal desde 22 de fevereiro de 2021.
Com o recuo das ações, a Petrobras perdeu R$ 55,3 bilhões em valor de mercado no pregão de ontem. Sob o peso da estatal, o Ibovespa, principal indicador da B3, recuou 0,99% no dia, a 127,0 mil pontos. Em outro movimento, Bank of America (BofA), Bradesco BBI e Santander rebaixaram os papéis da Petrobras para recomendação neutra de compra.
Sobre o impasse no conselho de administração, o Estadão/Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) apurou que a decisão de não pagar dividendos extraordinários neste momento prevaleceu por seis votos a quatro, com uma abstenção. Teriam votado contra a distribuição – e pelo envio de R$ 43,9 bilhões para a chamada reserva de remuneração – cinco conselheiros indicados pelo governo e a representante dos trabalhadores. Os quatro representantes de acionistas minoritários votaram a favor da distribuição de 100%.
‘Notícias falsas’
Tentando desfazer a repercussão negativa da decisão no mercado, a direção da estatal afirmou durante teleconferência com analistas que, em algum momento ainda não definido, os dividendos extraordinários serão pagos aos acionistas, pois não podem ser usados para outros fins, como investimentos, por exemplo.
“O dividendo é para distribuição de qualquer forma. Não pode pagar dívida ou investir, como (afirmam) falsas notícias que andam por aí. Isso é lucro, portanto, dividendo. Clarificando isso, todo esse susto aí desaparece, porque sabe-se que essa reserva é dividendo e uma hora volta”, disse o presidente da empresa, Jean Paul Prates.
Ele acrescentou que, inicialmente, a diretoria da estatal propôs 50% dos dividendos extraordinários para reserva e 50% para pagamento agora. Mas que, diante da resistência dos representantes do governo, ele se absteve de votar na reunião. “Essa novela (dos dividendos) continua, não acabou.”
Questionado, Prates negou ter havido pressão do governo. “Creio que foi uma questão de timing, o dividendo é para distribuição de qualquer forma.”
Decepção faz bancos ‘rebaixarem’ ações
A decisão do conselho da Petrobras de reter os dividendos extraordinários fez com que grandes bancos rebaixassem as ações da estatal, retirando a recomendação de compra dos papéis para colocá-los em indicação “neutra”. Foi o que fizeram o Bank of America (BofA), o Bradesco BBI e o Santander.
Para o BofA, a decisão de pagar apenas dividendos ordinários aumenta a percepção de risco sobre a influência do governo nas decisões de alocação de capital da estatal. “Em nossa opinião, isso sugere que a empresa poderia estar migrando para uma agenda mais focada no crescimento em energias renováveis (desencadeando maiores investimentos com menores retornos) e aumento da probabilidade de realizar fusões e aquisições (refinaria RLAM, petroquímica, distribuição de combustíveis)”, disseram os analistas Caio Ribeiro e Leonardo Marcondes.
Já o Santander fala em “sinais confusos”. “Acreditamos que a falta de dividendos extraordinários envia sinais confusos em relação à estratégia de alocação de capital de curto prazo, especialmente porque vemos a Petrobras detendo cerca de US$ 18 bilhões em dinheiro no final de 2023”, afirmam os analistas Rodrigo Almeida, e Eduardo Muniz, em relatório enviado a clientes.
Também em relatório divulgado ontem, a XP disse que os investidores iriam repensar a visão sobre os riscos da Petrobras, após a “grande decepção” com a ausência de dividendos extraordinários. “Vemos a tese de investimentos agora como uma questão de avaliar a probabilidade de grandes movimentos de M&A (fusão e aquisição) ocorrerem no curto prazo. Se isso foi o que levou à decisão do conselho de administração, as ações provavelmente cairão ainda mais, devido a uma combinação de má alocação de capital com dividendos mais baixos”, disseram os analistas André Vidal e Helena Kelm, da XP.
‘Gerar valor’
Em teleconferência com analistas, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, saiu ontem em defesa dos resultados de 2023. Ele ressaltou que o retorno das ações da estatal ao longo do ano passado foi “muito superior” ao de outras petroleiras do mesmo porte em outros países. “Em 2023, o retorno total das nossas ações na Bolsa de Nova York alcançou 112%, valor muito superior ao maior dos retornos das ‘majors’, de 20%”, disse.
O lucro da Petrobras em 2023 foi de R$ 124,6 bilhões e, embora 33,8% menor que o de 2022, foi o segundo melhor resultado da história da companhia. “É por isso que sempre digo que a Petrobras voltou para prosperar, a gerar valor a longo prazo. Vamos encarar os desafios aproveitando sinergias com nossos negócios e alavancados em nossas expertises”, disse Prates.
Citando recordes operacionais e prêmios, Prates disse que o resultado do primeiro ano de sua gestão serve ao investidor que “fica com a Petrobras”, ou seja, aos seus investidores de longo prazo.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Caroline Aragaki, Denise Luna e Gabriel Vasconcelos
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