O Tribunal de Contas da União (TCU) fez nesta terça-feira, 5, uma série de recomendações para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) corrigir falhas que geraram prejuízo em operações de financiamento de obras no exterior, realizadas nas antigas gestões petistas. A decisão foi resultado da primeira parte da sessão do TCU dedicada a fazer um escrutínio do histórico da política de apoio à exportação.
Como mostrou o Broadcast(sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) mais cedo, a Corte de Contas convocou sessão extraordinária nesta terça para julgar três processos sobre o tema no momento em que o governo Lula tenta retomar a participação do Estado no financiamento à prestação de serviços, como obras de engenharia, no exterior.
Além da ação já julgada, os ministros ainda analisam outros dois processos, que atingem decisões tomadas no passado pelo Comitê de Financiamento e Garantia das Exportações (Cofig) e pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), que funcionam na estrutura do Ministério de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic).
Ao fim do primeiro julgamento, o presidente da Corte, ministro Bruno Dantas, destacou que o BNDES já informou ao TCU que está no processo de construir uma nova governança e um conjunto atualizado de normativos para balizar o crédito à exportação de serviços. No fim do ano passado, com apoio do banco, o governo enviou um projeto de lei para criar um novo marco regulatório para essas operações. “Creio que toda essa discussão do TCU, seja por recomendação ou determinação ao banco, não será inútil”, comentou Dantas.
A posição foi reforçada por um representante do BNDES durante o julgamento, que garantiu que a instituição não fará nem retomará “nenhuma” operação de exportação de serviços sem que os critérios de transparência e procedimentos de economicidade sejam bem definidos. Técnicos do governo também ressaltaram à reportagem, reservadamente, que os apontamentos do TCU serão levados em conta pelas instâncias do Executivo que aprovam negócios garantidos pela União.
Entre as recomendações, a Corte pediu que o BNDES estabeleça que os postulantes aos financiamentos apresentem documentos como o orçamento de bens e serviços exportáveis e não exportáveis, e estudo de viabilidade técnico e econômico-financeiro do empreendimento ou do projeto.
Desvio de finalidade
O processo foi relatado pelo ministro-substituto Augusto Sherman, que havia sugerido multas e inabilitação de diversos funcionários do BNDES que trabalharam na operação de 67 empréstimos realizados dentro do BNDES Exim Pós-embarque. Segundo o voto do ministro, essas operações somaram US$ 2,115 bilhões financiados, dos quais US$ 1,7 bilhão teriam sido emprestados com desvio de finalidade.
“É um desvio de mais de 100% do valor que foi exportado. Isso é um acinte ao povo brasileiro. Não pode acontecer de o porcentual de custos indiretos superar 100% do custo da operação”, disse o ministro. Isso porque, segundo a análise feita por Sherman, parte do crédito concedido financiou gastos locais do país beneficiado pelo empréstimo, o que não poderia ter ocorrido nestas operações – analisadas dentro do período de 2006 a 2014 (governos Lula e Dilma).
O caso começou a ser julgado em outubro do ano passado, quando o relator foi acompanhado pelo ministro Walton Alencar. Três ministros, conduto, pediram vista do caso, e a análise foi retomada só nesta terça. O primeiro a votar foi o ministro Benjamin Zymler, cuja posição foi seguida pela maioria dos integrantes da Corte. Zymler discordou do relator em parte para afastar a aplicação de penalidades a gestores do BNDES, por entender que não teria ficado comprovado erro grosseiro ou dolo por parte do corpo técnico do banco público.
“O processo deixa bem claro que aquilo era costumeiro, não havia regulamentações do BNDES estabelecendo de forma detalhada qual padrão de comportamento se esperava desses servidores”, apontou o ministro, que também discordou do relator sobre o que pode ser classificado como financiável e não financiável nessas operações.
Apesar de afastarem a punição, todos os ministros criticaram o que chamaram de “vácuo” normativo sobre a concessão desses empréstimos pelo banco à época. Parte dos ministros ainda criticou a atuação da Câmara de Comércio Exterior (Camex), responsável por estabelecer as balizas dessas operações, que contavam com a garantia da União.
Sem citar nomes diretamente, o ministro Jorge Oliveira afirmou que o presidente da República à época “se comprometia com governos estrangeiros” já definindo valores a serem financiados, com estruturação feita então pela Camex. “O Comitê de Financiamento e Garantia das Exportações (Cofig) chegava a apontar que as taxas de juros estavam sendo excepcionais. E quem decidia sobre isso era a Camex. O BNDES operacionalizava uma decisão que não era do BNDES”, disse Oliveira. Segundo Zymler, dos 67 contratos analisados, a grande parte beneficiou Angola.
Apesar de já ter votado em outubro, o ministro-relator voltou a falar nesta terça, relatando o trabalho “penoso” que teve na relatoria do caso. Sherman disse ainda que, apesar de não haver provas nesse sentido, seria “plausível” a hipótese de ter havido corrupção nas operações, que envolveram empreiteiras que, anos depois, se tornaram alvo da operação Lava Jato. “Esse grande volume de dinheiro foi entregue a empreiteiras na época envolvidas em grandes escândalos de corrupção”, disse.
Por Amanda Pupo
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