A entrada em funcionamento do gasoduto Subida da Serra em São Paulo, como parte da malha de distribuição da Comgás, deve acarretar aumentos entre 6% e 31,2% na tarifa de transporte de gás natural em vários pontos do País, sobretudo nas regiões Sudeste e Sul, estima o Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura (Ceri) da Fundação Getulio Vargas (FGV).
A tarifa de transporte de gás é apenas um dos elementos que compõem o custo do consumidor final. O aumento, portanto, pesa na conta de gás das famílias, mas em porcentuais menores aos apurados pelos técnicos da FGV para o serviço de transporte prestado a distribuidoras e indústrias por NTS, TBG e TAG a depender da região do País.
Encomendado pela Associação de Empresas de Transporte de Gás Natural por Gasoduto (ATGás), o estudo surge em meio à consulta pública da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para reclassificar o Subida da Serra como estrutura de distribuição. O apontamento traz, pela primeira vez, números para uma discussão que se arrasta há anos e opõe transportadores e o grupo Cosan, dono da Comgás.
Imbróglio
Em setembro de 2021, a ANP havia definido o gasoduto como estrutura transporte devido à alta pressão de operação e diâmetro elevado do duto, que permite movimentar até 16 milhões de metros cúbicos por dia (MMm³/d).
Com o investimento e a obra da Comgás já feitos sob autorização da agência reguladora local (Arsesp), a ANP tenta desde o ano passado criar uma exceção à regra para viabilizar o Subida da Serra como gasoduto de distribuição. Isso seria possível por meio de condicionantes, como a proibição de conexões com novas fontes de gás e limitações à sua atuação. Definir essas condicionantes é o objetivo da consulta pública da ANP, que vai até setembro.
Mas o arranjo é contestado pelas três grandes transportadoras de gás do País (NTS, TAG e TBG) reunidas na ATGás, que já levou o assunto à Justiça sob alegação de que o novo gasoduto fere a lógica de integração da malha nacional de transporte de gás.
Em resumo, a associação alega que a permissão a uma conexão isolada entre fonte e malha de distribuição vai retirar volumes de gás hoje demandados da sua rede.
O Subida da Serra liga o Terminal de Regaseificação de São Paulo (TRSP) da Compass, no litoral paulista, à malha de distribuição da Comgás, em São Paulo. Como ambas empresas pertencem ao Grupo Cosan, há acusação de verticalização do negócio, o que vai contra o princípio de competitividade que inspirou as últimas legislações relacionadas a gás no País.
O pleito original das transportadoras é para que o Subida da Serra seja repassado à malha de uma das empresas do setor – pela localização, a NTS – sob acordo de compensação financeira à Comgás.
O sistema de transporte de gás natural respeita a lógica de condomínio, no qual a transportadora é remunerada pela infraestrutura por uma receita permitida repartida entre usuários. Se caem o número de usuários, chamados carregadores, e o volume de gás cai, o valor a ser pago pelos demais cresce.
Essa é a razão para entidades como a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) e Associação Brasileira das Indústrias de Vidro (Abividro) serem contra o Subida da Serra servindo isoladamente à malha da Comgás em São Paulo.
Aumento estimado
A Comgás tem contrato com a Compass, para aquisição de 3,125 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia do TRSP, podendo solicitar a qualquer momento mais 1,5 milhão de m³/dia.
Ante a perspectiva de entrada em operação do TRSP ainda em 2023, a Comgás reduziu justamente em 3 milhões de m³/dia os volumes contratados para 2024 junto à Petrobras, que chegam à sua malha via dutos da NTS. Trata-se de 47% da carga recebida pela Comgás via gasodutos de transporte da NTS.
Nesse contexto, a FGV projetou o impacto nas tarifas de transporte cobradas pela NTS em três diferentes cenários. No primeiro, se forem retirados 3,125 milhões de m³/dia da malha da NTS, que seriam supridos pelo TRSP via Subida da Serra para atender São Paulo, o aumento nas tarifas de transporte para o restante dos usuários será de 6%. Esse é o cenário mais provável e com impacto imediato, haja vista a dinâmica de contratos da Comgás e a inclinação da ANP em viabilizar o Subida da Serra.
Mas, se, além desse volume, for incluído o volume extra de 1,5 milhão de m3/dia previsto no contrato entre Comgás e Compass, o aumento nas tarifas chega a 9%. E, por fim, caso todo o volume que chega à Comgás via gasodutos da NTS for substituído por gás natural liquefeito importado e regaseificado no TRSP, o aumento médio na tarifa de transporte para o restante da malha chegaria a 14%.
Segundo a FGV, a clientes da transportadora TBG também deverão ser impactados pela redução de entrega de gás por meio de sua rede para a Comgás.
“O novo contrato com a Petrobras prevê redução de 52% da quantidade contratada em zonas de saída da TBG até 2031 em relação à quantidade contratada atual de 5,8 milhões de m³/dia, com diminuição gradual nos próximos anos. O impacto desta redução aumentará as tarifas futuras de entrada e saída da TBG”, diz o Ceri/FGV no documento.
O cálculo partiu da supressão de outros 3 milhões de m³/dia das zonas de saída da Comgás, o que resultaria em um aumento médio de 12% nas tarifas atuais de transporte da TBG. Em cenário mais extremo, caso todo o volume entregue atualmente para a Comgás por meio da zona de saída da TBG fosse retirado e deslocado para fora da malha de transporte, o impacto médio nas tarifas atuais alcançaria 27%, chegando a 31,2% no Mato Grosso do Sul.
Ao todo, indica o Ceri/FGV, carregadores de pelo menos sete Estados seriam diretamente afetados pela entrada em funcionamento do Subida da Serra como gasoduto de distribuição: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul.
Os cálculos do Ceri/FGV não levam em conta eventuais entradas de gás novo na malha das transportadoras, o que compensaria a perda dos volumes que hoje abastecem a Comgás.
Por Gabriel Vasconcelos
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