Em dia de expectativa pela ata do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), o que mexeu mesmo com o dólar no mercado doméstico de câmbio foi a mão pesada do Banco Central, com o anúncio da oferta de até US$ 1 bilhão em novos swaps cambiais logo após às 15 horas – justamente no momento em que era divulgado o documento do BC americano.
A intervenção da autoridade monetária quebrou a onda de escalada do dólar, que havia corrido até a máxima de R$ 5,5731 no início da tarde, na contramão do comportamento da moeda americana no exterior. Esse descasamento era visto como um sinal de “disfuncionalidade” do mercado em meio à demanda pontual e concentrada por dólares, seja para hedge ou até mesmo por conta de movimentos especulativos.
O dólar começou a murchar assim que o BC anunciou a oferta e se firmou em queda em meio à realização do leilão, com todos os 20 mil contratos (US$ 1 bilhão) sendo absorvidos. Com um vendedor de peso no mercado, o dólar à vista desceu até a mínima de R$ 5,5001. No fim da sessão, era negociado a R$ 5,5091, em queda de 0,51%. O giro com contrato futuro para novembro era elevado, na casa dos US$ 15,6 bilhões.
Analistas ouvidos pelo Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) não acreditam que o BC tenha tentado defender certo nível para o dólar, mas atuado para prover liquidez e atenuar eventuais distorções na formação da taxa de câmbio. Pela manhã, diante do descolamento do real em relação a seus pares, havia rumores até de que o mercado estaria “chamando o BC”, já que não havia um fato forte que justificasse a alta da moeda americana por aqui.
O head de Tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weig, ressalta que dois principais pares do real – o rand sul-africano e peso mexicano – subiam com força enquanto a moeda brasileira se enfraquecia. “Havia muito fluxo comprador de dólares hoje e o BC entrou para suprir essa demanda”, diz Weigt, ressaltando que o BC não tenta defender um valor da taxa de câmbio e atua “quando o mercado está disfuncional ou quando vê uma demanda pontual”.
Na mesma linha de raciocínio, o head de câmbio da Acqua-Vero Investimentos, Alexandre Netto, não viu na atuação do BC uma tentativa de defender determinado patamar para a taxa de câmbio. “Esse BC não tem como característica intervir para defender nível do dólar, mas para prover liquidez em momentos de distorção. Pode ser que tenha havido um fluxo grande de saída, dado que o BC colocou toda a oferta de swaps”, diz Netto, acrescentando que parte do descolamento do real em relação a outros emergentes pela manhã pode ser explicado “em parte pela percepção dos riscos domésticos”.
Pela manhã, o diretor de Política Econômica do Banco Central, Fabio Kanczuk, reiterou que o BC não interfere no câmbio para combater a inflação, papel que cabe ao manejo da taxa Selic no regime de metas. “Não faremos isso intervir no câmbio para controlar a inflação. No curto prazo, o câmbio tem mais efeito, mas, no horizonte relevante, não”, disse, sobre os tempos diferentes de efeito do câmbio e da Selic sobre a dinâmica dos índices de preços.
O mercado segue com um pé atrás por conta das preocupações com a questão fiscal – em meio à tramitação da PEC dos Precatórios e ao impasse em torno da reforma do Imposto de Renda, essenciais para a implementação do Auxílio Brasil. Nesta quarta, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse que a votação da PEC dos Precatórios ocorrerá na próxima semana e deve resultar em uma “vitória tranquila”. Se a proposta for aprovada do jeito que está, será aberto um espaço de aproximadamente R$ 50 bilhões no Orçamento de 2022 – o que permitiria o pagamento das emendas parlamentares e a adoção do Auxílio Brasil sem que se rompesse o teto de gastos.
Rodrigo Friedrich, sócio da Renova Invest, tem uma visão positiva sobre o real e acredita que a taxa de câmbio pode recuar até uma faixa entre R$ 5,25 e R$ 5,30 no fim do ano. “Se na semana que vem tiver o desfecho do precatório e o mercado gostar, podemos ver uma bolsa mais forte e dólar para baixo. Eu acredito numa realização do dólar no curto prazo”, afirma Friedrich, que não aposta em alta dos juros nos Estados Unidos em 2022, o que limitaria o fôlego global da moeda americana.
No exterior, o índice DXY – que mede a variação do dólar frente a seis moedas fortes – operou em queda firme ao longo de todo o dia, flertando com o rompimento do patamar dos 94,000 pontos. A moeda americana também recuou em bloco frente às divisas emergentes (à exceção da lira turca), com perdas de mais de 1% em relação ao rand sul-africano, ao peso mexicano e ao peso chileno.
Esse comportamento não mudou após a divulgação da ata do Federal Reserve. Como esperado, o documento trouxe a informação de que o Fed pode começar a reduzir a compra mensal de bônus (tapering) em meados de novembro ou em dezembro e encerrar o programa de estímulos na metade do ano que vem. Mais uma vez, o Fed reiterou que não há ligação direta entre o fim da injeção de recursos e o início de uma alta dos juros, embora alguns dirigentes da instituição tenham levantado a possibilidade de uma elevação dos juros no fim de 2022.
Por Antonio Perez
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