Política

Em derrota para governo, Senado rejeita nova reforma trabalhista

O Senado impôs uma derrota ao governo e rejeitou, por 47 votos a 27, o pacote de medidas trabalhistas que eram a aposta da equipe econômica para impulsionar a geração de empregos. A medida foi alvo de críticas contundentes dos senadores, não só pelo pouco tempo para discussão das ações, mas também pelo risco de fragilização das relações trabalhistas mediante a possibilidade de contratação sem carteira assinada. Lideranças do MDB e do PSD, os dois maiores partidos do Senado, defenderam a derrubada do texto. A derrota se deu em uma sessão marcada também por ataques à inflação elevada e à política econômica do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Ao perceber o clima desfavorável e a derrota iminente, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), que chegou a colocar seu cargo a prêmio como sinalização de disposição do Palácio do Planalto em honrar acordos, tentou articular uma mudança de última hora no relatório e excluir do texto um dos programas, o Requip, que concede bolsas de qualificação para os profissionais mais jovens ou aqueles que estão há muito tempo fora do mercado de trabalho.

A votação da proposta, no entanto, já havia sido iniciada, e a maioria dos senadores se posicionou contra qualquer alteração. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), explicou que a iniciativa violava o regimento interno da Casa e só poderia ser aceita se houvesse apoio de todos os senadores.

Pacheco destacou que a rejeição dos senadores à MP não estava relacionada ao Requip ou a qualquer mudança no texto, mas sim ao fato de que não havia confiança de que a Câmara manteria o parecer aprovado pelos senadores – já que, nas últimas votações de MPs, os deputados têm ignorado as mudanças propostas pelo Senado e retomado os pareceres aprovados previamente na Casa. “Seria inócua (a alteração)”, afirmou.

O texto original da MP reinstituiu o programa que permite redução de jornada e salário ou suspensão de contratos na pandemia. Na Câmara dos Deputados, a proposta foi amplificada e ganhou a previsão de três novos programas de geração de empregos, além de mudanças em dispositivos da CLT, classificados de “jabutis” (matérias estranhas ao texto) por incluírem mudanças em horas extras de categorias profissionais como professores, advogados e jornalistas, ampliação da carga horária de mineiros e mudanças na assistência judiciária gratuita a trabalhadores.

Horas antes da rejeição no Senado, Guedes propagava a empresários que os programas ajudariam a gerar 2 milhões de novas vagas. Ao Broadcast na semana passada, o ministro do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni, chegou a dizer que seriam 3 milhões de empregos.

Na tentativa de evitar a rejeição total do texto, o relator no Senado, Confúcio Moura (MDB-RO), decidiu excluir os dispositivos que alteravam a CLT, atendendo a pedidos de senadores. No entanto, ele manteve a criação dos novos programas de emprego e defendeu as medidas como iniciativa para ampliar a empregabilidade de jovens.

O texto previa três programas: o Priore, que quer desonerar a contratação de jovens de 18 a 29 anos e pessoas com mais de 55 anos, o Requip, que concede bolsas de qualificação para os profissionais mais jovens ou aqueles que estão há muito tempo fora do mercado de trabalho, e o serviço social voluntário, pelo qual prefeituras terão flexibilidade para absorver mão de obra jovem ou com mais de 50 anos.

O senador Paulo Paim (PT-RS) apresentou uma questão de ordem para excluir da medida os artigos que criam novos programas que buscam incentivar a geração de vagas de emprego. Vestindo uma camiseta com a frase “sem emprego e renda não há dignidade”, ele questionou ainda a ausência de discussão aprofundada sobre as medidas.

Em seguida, a sequência de manifestações de senadores da base aliada do governo e da oposição foi uma amostra do clima azedo para a votação. O senador Carlos Portinho (PL-RJ), aliado do Palácio do Planalto, apoiou o questionamento do PT. “Eu não consigo entender o Requip, porque a demanda é a mesma (de público alvo), só que pega esses meninos que estão há dois anos sem carteira e não dá direito nenhum, muito menos assinatura na carteira. Quatro anos depois vai terminar o Requip e não vai ter anotação na carteira de trabalho. Ele não vai encontrar emprego em lugar nenhum, vai empurrar o problema com a barriga”, criticou.

O senador Lasier Martins (Podemos-RS) também teceu críticas e chamou a inclusão dos programas de “contrabando legislativo”. Integrantes da oposição, os petistas Jean Paul Prates (PT-RN) e Paulo Rocha (PT-PA) chamaram as iniciativas de “jabutis”, como são apelidadas as matérias estranhas ao texto original.

“Tem jabuti do tamanho de jacaré. E jacaré morde, morde direitos trabalhistas”, afirmou Prates. “Colocaram jabuti, sucuri, sei lá mais o que colocaram nessa medida provisória”, disse Rocha.

Na tentativa de reverter a tendência negativa, Bezerra ameaçou deixar o cargo caso a Câmara desrespeitasse o acordo pela aprovação da medida trabalhista. Ele partiu para o tudo ou nada. “Se o relatório do senador Confúcio Moura aprovado aqui nesta Casa não for respeitado pela Câmara dos Deputados, eu me retiro da liderança do governo. Não tenho condições de continuar porque os acordos estão sendo feitos para serem cumpridos”, afirmou.

Vice-líder do PSD, o senador Omar Aziz (AM) mostrou que a investida não surtiria efeito. “Vamos votar contra para manter o senhor (Bezerra) na liderança, porque eles (Câmara) não vão cumprir”, disse. O partido reúne 11 senadores, a segunda maior bancada da Casa.

Aziz teceu fortes críticas aos programas de emprego e questionou se eles representam “tudo que o Ministério da Economia tem para oferecer”. “O gás está custando 10% do salário mínimo. Governo quer oferecer R$ 125 por trabalhador e acha que está fazendo grande coisa. Não é com política paliativa que vamos resolver o problema”, afirmou. “A gente precisa de uma política econômica que o Paulo Guedes nunca entregou”, disparou Aziz.

Mais cedo, o senador Weverton (PDT-MA) também citou a inflação elevada e o aumento da pobreza. “Chega! Acabou a paciência. Temos que dar resposta pelo voto”, disse. “A carne está um absurdo, o gás está um absurdo. A economia do governo falhou, a população lá embaixo está com fome”, acrescentou.

O líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM), também declarou voto contrário à proposta. A legenda tem 16 senadores. “Nenhum senador da República neste plenário quer tirar direitos do trabalhador. Queremos, sim, um amplo debate para modernizar as leis trabalhistas, mas não para tirar direito do trabalhador”, afirmou Braga.

Por Idiana Tomazelli e Anne Warth

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Estadão Conteúdo

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