Mercados

Bitcoin busca independência da China e mineração sustentável para voltar ao topo

Após ter superado a marca de US$ 63 mil em valor de mercado em meados de abril, o Bitcoin (BTC) passou por uma sequência de quedas e vem sendo negociado a valores próximos de US$ 33 mil. O mercado de criptomoedas vive momentos de instabilidade após as quedas observadas nesse período em meio às discussões sobre o consumo de energia elétrica para mineração de Bitcoin, falas do CEO da montadora Tesla, Elon Musk, contradizendo seu entusiasmo inicial com essa classe de ativos, e medidas restritivas por parte do governo da China contra o mercado de criptoativos.

Essa desvalorização, que contaminou todo o mercado de criptomoedas, pegou muitos investidores menos experientes desprevenidos, causando pânico no mercado. Esse não é o caso, porém, daqueles que estão mais familiarizados com essa classe de ativos, e que já viram o Bitcoin despencar de preço em outras ocasiões apenas para voltar a atingir novas máximas históricas algum tempo depois. Além disso, os adeptos das criptomoedas não estão assistindo a esses fenômenos de braços cruzados, e já iniciam movimentos em busca de fontes de energia limpa e menor dependência das estações de mineração instaladas na China.

Consumo de energia

O alto gasto energético para mineração de Bitcoin tem sido o tema central do debate em torno das criptomoedas nos últimos meses. O consumo elevado de energia, em especial de energia considerada suja, como a proveniente da queima de combustíveis fósseis, foi o motivo declarado por Elon Musk para que a Tesla deixasse de aceitar pagamentos em Bitcoin por seus veículos, que deu início à desvalorização do ativo. A agenda ESG (ambiental, social e de governança corporativa, na sigla em inglês) vem ganhando cada vez mais força, e a busca por uma mineração sustentável de criptomoedas se tornou crucial para o futuro desse mercado.

Olhando para o assunto sob outra perspectiva, Wilton Gomes, analista de operações financeiras da fintech BlueBenx, cita uma pesquisa feita recentemente pela Galaxy Digital, que mostrou que o consumo de energia do Bitcoin foi menor do que o do sistema bancário atual e o uso de energia do mercado para fomentar o ouro. O Bitcoin, consome cerca de 113,89 TWh por ano, a indústria do Ouro consome 240,61 TWh e o sistema bancário, 263,72 TWh.

Felippe Percigo, investidor profissional e professor de MBA em Finanças Digitais e Blockchain na FAE Centro Universitário de Curitiba, traz outro dado positivo para as criptomoedas. Segundo o professor, “um levantamento divulgado na última semana do Bitcoin Mining Council, fórum voluntário e aberto de mineradores de Bitcoin, indica que 56% da energia utilizada no processo de validação da criptomoeda é renovável”. O dado revela, ainda segundo Percigo, que cada vez mais ações estão surgindo com o intuito de tornar a mineração de criptomoedas mais sustentável.

Bruno Milanello, executivo de novos negócios da plataforma de criptomoedas Mercado Bitcoin, menciona ainda a criação do Conselho de Mineradores de Bitcoin, presidido por Michael Saylor, CEO da MicroStrategy, e que conta também com a presença de Musk, como exemplo de como a comunidade está sensibilizada com o assunto e busca trazer soluções.

China x Bitcoin

As recentes investidas do governo chinês contra o mercado de criptomoedas trouxeram ainda mais instabilidade para os ativos. Em 18 de maio as autoridades chinesas reforçaram as restrições já existentes desde 2013 que proíbem instituições financeiras de fornecerem serviços relacionados a criptomoedas no país. Depois disso, o Conselho de Estado da China anunciou medidas para reprimir a mineração de Bitcoin no território chinês, incluindo a proibição nas províncias de Xinjiang e Qinghai, forçando diversas empresas a abandonarem o país. A repressão, evidentemente, fez com que o mercado de criptomoedas despencasse.

Ainda assim, a saída de mineradores da China pode representar uma oportunidade de tornar o processo de mineração de criptomoedas mais sustentável, conciliando interesses de investidores e ambientalistas. Isso porque a China, que já chegou a concentrar quase 70% da mineração global de Bitcoin, de acordo com Wilton Gomes, da BlueBenx, é ainda muito dependente de fontes de energia altamente poluentes, em especial o carvão.

Portanto, os mineradores antes instalados no território chinês têm agora a oportunidade de operar em regiões que utilizem fontes de energia limpa, e Gomes menciona um possível destino: “o estado do Texas, nos Estado Unidos, possui energia barata com produção de fontes renováveis, sendo 20% proveniente de usinas eólicas, além de que o governo é totalmente favorável aos criptoativos, uma possibilidade local bem real que poderá se estender para outros lugares”.

Olhando pelo lado positivo, Daniel Coquieri, CEO e fundador da Liqi, plataforma de tokenização de ativos, cita o progresso da agenda de regulamentação das criptomoedas nos Estados Unidos. “Olhando para o mercado americano com mais atenção, você vê os bancos, fundos e reguladores tentando criar métodos jurídicos para esse mercado. […] Não dá para termos o mercado fora da regulamentação, por isso é importante que continue avançando”, conclui.

El Salvador

El Salvador, país da América Central com pouco mais de 6,4 milhões de habitantes, anunciou no dia 9 de junho deste ano a adoção do Bitcoin como moeda legal, ganhando destaque na imprensa internacional. A nação, que tem o dólar como moeda oficial desde 2001, se tornou a primeira a reconhecer o Bitcoin como moeda legal. A decisão do presidente Nayib Bukele, entretanto, divide opiniões até mesmo entre os adeptos das criptomoedas.

Daniel Coquieri, da Liqi, diz não acreditar no Bitcoin como moeda, mas sim como um ativo de investimento ou uma reserva de valor, comparando-o com metais preciosos como ouro e prata, utilizados por investidores para diversificar suas carteiras e fugir da inflação que atinge as moedas convencionais.

Por outro lado, Bruno Milanello, do Mercado Bitcoin, enxerga a medida com bons olhos, e acredita que a adoção do Bitcoin pode auxiliar na inclusão financeira da população salvadorenha. O executivo também destaca o impacto da proposta sobre o envio de remessas de dinheiro do exterior para El Salvador. “A introdução do BTC como moeda com curso legal também poderia aliviar o fardo da ‘taxa de remessa’ (estatísticas dizem que um em cada quatro salvadorenhos vive no exterior e que três de cada dez dólares que circulam na economia local vêm de fora), que por meios tradicionais é bastante alta se comparada às taxas do BTC.”

Apesar do otimismo, Milanello reconhece que a extrema volatilidade do Bitcoin pode ser um problema para seu uso enquanto moeda, mas acredita que a adoção do ativo por outros países nos próximos anos é possível.

Outros obstáculos para os países que optarem por trilhar o caminho desbravado por El Salvador, conforme a análise de Wilton Gomes, podem vir de órgãos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. “O desafio será criar medidas regulatórias para ganhar a ajuda dos órgãos reguladores de forma diplomática, e o uso do Bitcoin em El Salvador poderá trazer muitas experiências para ajustar as leis visando que, num futuro próximo, outros países possam adotá-lo.”

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João Marinho

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