O governo do presidente Jair Bolsonaro pagou um volume recorde de emendas parlamentares em janeiro. No total, foram destinados R$ 504 milhões para redutos eleitorais de deputados e senadores até o último dia 26, conforme a indicação de congressistas. O valor é maior do que a quantidade paga no mês inteiro em qualquer ano anterior, de acordo com dados do portal Siga Brasil, do Senado Federal, corrigidos pela inflação.
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Todos os anos, o governo é obrigado a pagar essas emendas. O momento de liberação, porém, ocorre a critério do Executivo. O valor pago em janeiro deste ano, às vésperas da eleição no Congresso, supera as emendas transferidas no mesmo mês de anos anteriores.
O recorde ocorre após o Congresso aumentar a quantidade de emendas parlamentares com pagamento obrigatório. Além disso, as liberações foram feitas em janeiro, quando as articulações do Palácio do Planalto para eleger seus candidatos à presidência da Câmara e do Senado se intensificaram. O governo tem usado os recursos para aumentar a base de apoio no Congresso e atrair votos para as candidaturas de Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), respectivamente.
Os R$ 504 milhões pagos em janeiro são de transferências autorizadas no Orçamento de 2020. Nem todos os repasses, porém, foram executados no ano passado, fazendo o governo “pendurar” a conta para este ano. As emendas são recursos indicados por deputados e senadores no Orçamento da União para obras e projetos em redutos eleitorais, com pagamento obrigatório pelo governo. Quem define o momento da liberação, porém, é o Executivo.
O pagamento de emendas impositivas em janeiro, em um volume inédito na comparação com o mesmo mês de anos anteriores, ocorreu no momento em que aliados do Planalto negociavam votos para seus candidatos no Congresso, além das verbas extras de R$ 3 bilhões reveladas pelo Estadão. As extras são recursos diretos dos ministérios. As emendas impositivas, por outro lado, têm a digital dos parlamentares no Orçamento.
No caso das verbas extras, 285 parlamentares foram contemplados com recursos extras que saíram do Ministério do Desenvolvimento Regional, segundo uma planilha à qual o Estadão teve acesso. Deputados que abandonaram a candidatura de Baleia Rossi (MDB-SP) para apoiar Arthur Lira aparecem na lista como destinatários de milhões para seus redutos eleitorais. É o caso de políticos do DEM, que ontem decidiram retirar o apoio ao emedebista, e do PSL, que também rifou Baleia Rossi para aderir ao candidato de Bolsonaro.
O presidente Jair Bolsonaro e outros integrantes do governo fizeram declarações públicas nos últimos dias admitindo a vinculação das emendas com o movimento para construir uma base de apoio no Congresso. “O próprio parlamento sabe, nunca tiveram tanto recurso. A emenda é impositiva, libera. Libera, poxa, para que fazer jogo duro?”, disse o chefe do Planalto a jornalistas neste sábado, 30, ao lado de Luiz Lima (PSL-RJ), o segundo deputado que mais teve emendas pagas em janeiro. “O Parlamento é o nosso parceiro. Agora, para a gente atender aos parlamentares, temos que aprovar certas pautas que interessam para todos nós”, afirmou Bolsonaro.
O ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, responsável pela articulação política, afirmou ao Estadão que o governo não está trocando verbas por votos. “Não está havendo nenhuma conversa relativa a negociação de voto. Seria até ofensivo, de minha parte, negociar voto em troca de cargos e emendas”, afirmou. Procurado nesta segunda-feira para comentar a liberação das emendas, a Secretaria de Governo ainda não se manifestou.
Em 2020, o governo federal reservou (empenhou, no jargão técnico) um total de R$ 33,9 bilhões em emendas parlamentares. Até o fim do ano, foram pagos R$ 16,1 bilhões. O restante ficou “pendurado” e vai disputar espaço com os gastos previstos para o Orçamento deste ano. O cenário acaba pressionando o Executivo. Por um lado, o pagamento é obrigatório. Por outro, o governo precisa escolher o que pagar para respeitar o teto de gastos, que proíbe o aumento de despesas federais acima da inflação do ano anterior.
Do total de emendas pagas em janeiro, a maior parte (R$ 482,8 milhões) foi destinada para atender indicações do relator-geral do Orçamento de 2020, deputado Domingos Neto (PSD-CE). Esses recursos foram colocados pelo relator na peça orçamentária conforme a escolha de deputados e senadores aliados. Também foram pagas emendas de deputados federais (R$ 9,5 milhões), senadores (R$ 259,7 mil), bancadas estaduais (R$ 2,5 milhões) e comissões do Congresso (R$ 9 milhões).
Em janeiro, o governo pagou emendas indicadas individualmente por 172 deputados e 19 senadores. No caso das emendas coletivas, foram atendidas bancadas de 10 Estados: Mato Grosso, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte, Sergipe, Alagoas, Rio de Janeiro, Goiás, Amazonas e Maranhão.
Na Câmara, os dois maiores partidos beneficiados foram o PDT e o PSL. E foi no mesmo mês que o PSL passou a integrar oficialmente o bloco de Arthur Lira na Câmara, após uma vitória interna da ala bolsonarista do partido. O PDT, por sua vez, anunciou apoio a Baleia Rossi (MDB-SP). Lira, porém, espera conquistar alguns votos de deputados da legenda na eleição desta segunda-feira. A votação é secreta, o que acaba facilitando o voto de parlamentares na contramão das lideranças partidárias.
Na quinta-feira, 28, Bolsonaro esteve em Sergipe para inaugurar uma ponte da BR-101, que liga as cidades de Propriá (SE) a Porto Real do Colégio (AL), e fez campanha para Arthur Lira. No mesmo evento, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, relacionou a liberação de emendas com o apoio do Congresso Nacional ao Executivo. O ministério de Tarcísio foi a pasta que mais pagou emendas em janeiro para bancadas estaduais, quando os recursos são indicados por todos os parlamentares de um mesmo Estado, um total de R$ 2,5 milhões.
“A aliança do Executivo com o Legislativo vai ser fundamental para que a gente possa concluir essas obras”, disse Tarcísio durante a cerimônia. “Eu agradeço o apoio que a bancada tem dado e tenho certeza que nós vamos inaugurar outra era no Parlamento a partir deste ano, uma era de aprovação de reformas e transformação do Brasil.”
Por Daniel Weterman
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