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No radar de investidores, o setor do luto

O pedido de abertura de capital no mês passado do grupo gaúcho Cortel, de cemitérios, colocou em evidência um mercado com pouca visibilidade no Brasil, mas que fatura R$ 3 bilhões por ano. Conhecido como “death care”, ou assistência à morte, o segmento reúne serviços de funerárias, cemitérios, crematórios e planos funeral, uma espécie de seguro em que a pessoa paga em vida os custos para seu óbito – uma das frentes que mais vêm crescendo no mercado desde o início da pandemia.

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Diante dos quase 1,7 milhão de óbitos no planeta, mais de 180 mil deles no Brasil, a covid-19 obrigou o mundo todo a falar mais sobre a morte e também jogou luz no trabalho das startups do setor, as chamadas “death techs” (ler mais ao lado).

Dono de dez cemitérios e com faturamento anual de R$ 89 milhões, o Grupo Cortel espera levantar R$ 400 milhões na sua oferta inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), prevista para 2021, apurou o Estadão. A empresa quer usar o dinheiro para sair em busca de ativos e cumprir um papel de consolidadora do mercado.

Investidores, entre eles fundos de private equity (que compram participação em companhias), estão mapeando o segmento, que no Brasil conta com mais de cinco mil funerárias, 750 cemitérios, 147 crematórios e 250 empresas de plano funeral – de acordo com pesquisa que acaba de ser feita pela consultoria RGF, que considera apenas os ativos da iniciativa privada. A maior parte das empresas tem perfil familiar.

Diante do aquecimento do setor, e depois de quase duas décadas administrando um cemitério, a executiva Gisela Adissi resolveu abrir uma consultoria dedicada ao mercado do luto, a Flow Death Care. Além de assessorar operações de fusões e aquisições (M&A, do inglês), a empresa planeja fomentar as startups do segmento. “Os fundos ainda não estavam com os olhos tão abertos para o mercado de death care. Agora isso mudou”, comenta Gisela.

Compra

Neste ano, o segmento de assistência à morte acompanhou ainda a maior operação de aquisição já feita no setor: o fundo Crescera (ex-Bozano) fez um aporte de R$ 150 milhões (podendo subir para R$ 350 milhões) no Grupo Zelo, uma das maiores empresas de cemitério do Brasil.

A companhia mineira, alvo do investimento, nasceu, em 2017, da união de duas empresas familiares – a Santa Clara, cujo maior negócio era o fundo funeral, e o Bom Jesus, com foco em cemitérios. De acordo com presidente do Grupo Zelo, Lucas Provenza, os primeiros aportes vieram logo após à fusão, no modelo de investimento chamado de “family and friends” (família e amigos). Até o ano passado, esse grupo, que segue como sócio, já tinha aportado R$ 130 milhões.

Com esses recursos e com a entrada do Crescera, o Grupo Zelo já colocou embaixo do seu guarda-chuva cerca de 40 empresas do setor. O foco da companhia é o plano funeral. “É um produto que dá previsibilidade ao negócio, já que há recorrência de receitas”, explica o executivo.

Embora o Cortel deva marcar a entrada do segmento na B3, já existe hoje no mercado opção de investimento no setor acessível às pessoas físicas. A gestora Zion tem na sua prateleira o fundo Brazilian Graveyard, que investe em seis ativos, entre eles, o próprio Grupo Cortel. “Em reuniões com leigos nesse setor, me perguntam se, ao se comprar uma cota do fundo, haverá, no futuro, incluído, um jazigo”, conta o sócio da Zion, João Santiago, explicitando a falta informação sobre o mercado.

Diversificação

À frente de dois cemitérios – o Terra Santa (MG) e o Vale do Cerrado (GO) -, Guilherme Santana, engenheiro civil que está nesse mercado há 18 anos, diz que o setor, assim como outros da economia, se movimenta com frequência para diversificar sua base de receitas, algo importante para qualquer companhia que queira manter o negócio mais firme diante de qualquer flutuação econômica.

Foi assim que foi lançado um produto que é hoje uma grande aposta desse mercado, que é o de cremação de animais de estimação. “Também já começamos a observar jurisprudência para o sepultamento de humanos com seus pets”, conta.

No mercado internacional, já começam a surgir cemitérios no oceano mar ou a possibilidade de compostagem humana – método de decomposição que transforma os restos mortais em adubo.

Mercado também atrai startups

O mercado que envolve a morte também está atraindo um número cada vez maior de empresas de tecnologia, já batizadas de “death techs”. A atuação delas vai desde a facilitação de processos burocráticos, como o inventário, quanto a propostas para o ritual de despedida, que teve de ser pensado com as restrições impostas pela pandemia.

Nos Estados Unidos, uma startup chamada Cake viu seus negócios crescerem em ritmo acelerado nos últimos meses. Trata-se de uma plataforma que ajuda qualquer pessoa a planejar questões relacionadas à própria morte, passando por assuntos legais, memorial e até mesmo últimos desejos.

Em tempos de pandemia, a plataforma inclui um passo a passo de como organizar um funeral digital, por exemplo. A cofundadora e presidente da startup, Suelin Chen, afirma que a demanda, na pandemia, subiu cerca de 10 vezes, para um volume de 30 milhões de visitantes no site por ano.

No Reino Unido a startup QR Memories também atua com homenagens, com uma ideia inovadora. A ideia foi criar uma placa de aço com um QR code cortado a laser para ser anexado ao túmulo. Com um telefone, o visitante pode fazer a leitura do código, que leva a uma página da web com fotos, informações e às músicas preferidas da pessoa homenageada. “Muitas pessoas usaram nossas páginas para celebrar essa nova conexão”, diz o fundador da QR Memories, Stephen Nimmo.

No Brasil esse mercado também começa a ser explorado, diz a sócia da consultoria Flow Death Care, Gisela Adissi. “Tem muita coisa acontecendo e, por aqui, as pessoas também ficaram mais dispostas a abraçar essas novidades”, afirma.

A startup Benefício Legal, por exemplo, tem na prateleira o produto de assistência ao inventário. “As pessoas não sabem o que é inventário, que é uma demanda legal que não pode ser adiada”, explica o sóciofundador da empresa, Fabiano Moraes. A venda do produto ocorre, principalmente, por meio do plano funeral. Ou seja: o cliente, ao contratar esse seguro, terá também a assistência na hora de fazer o inventário, desde que o mesmo seja um consenso entre os familiares.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Por Fernanda Guimarães

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Estadão Conteúdo

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