O ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, admitiu nesta sexta-feira, dia 16, que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) monitorou participantes da Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP 25), realizada em Madri, em dezembro passado. Em sua conta no Twitter, ele escreveu que o órgão deve acompanhar campanhas internacionais apoiadas por “maus brasileiros”, que o governo Jair Bolsonaro entende como prejudiciais ao Brasil.
Ele afirmou que a Abin tem competência legal para atuar na COP e continuará a agir em “eventos no Brasil e no exterior”. “Temas estratégicos devem ser acompanhados por servidores qualificados, sobretudo quando envolvem campanhas internacionais sórdidas e mentirosas, apoiadas por maus brasileiros, com objetivo de prejudicar o Brasil”, escreveu o ministro. “A Abin é instituição de Estado e continuará cumprindo seu dever em eventos, no Brasil e no exterior.”
A admissão de Heleno ocorreu quatro dias depois de o Estadão revelar detalhes da operação realizada por quatro agentes da Abin, três deles recém-concursados, no mais importante evento sobre o clima do mundo. A reportagem confirmou com um dos oficiais de inteligência enviados à Espanha que o objetivo era monitorar e relatar menções negativas a políticas ambientais do governo Bolsonaro, especialmente na Amazônia. Eles focaram nas organizações não-governamentais (ONGs), com as quais o governo mantém relação conflituosa, mas também observaram atividades e integrantes da própria comitiva brasileira e de delegações estrangeiras.
Heleno está sob pressão. A manifestação do ministro no Twitter ocorre também depois de deputados oposicionistas, da bancada do PSOL, acionarem a Procuradoria-Geral da República e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão cobrando investigação por crime de responsabilidade e ato de improbidade administrativa. Os parlamentares pedem que Heleno e o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, sejam responsabilizados pela operação da Abin e pela omissão de informações ao Congresso. A Constituição prevê punição por envio formal de informações falsas requisitadas por congressistas.
Ao responder a requerimento por escrito, o Itamaraty deixou de informar no ofício à Câmara dos Deputados sobre a presença de nomes da Abin e do GSI na delegação brasileira. O documento omite o vínculo funcional dos quatro oficiais de inteligência concursados da agência e de um assessor de confiança que representou Heleno no na ONU, o coronel da reserva do Exército Adriano de Souza Azevedo, da Assessoria de Planejamento e Assuntos Estratégicos. Todos foram identificados apenas como “assessores” da Presidência da República.
Apesar disso, Heleno alega que o governo foi “transparente” porque a Abin publicou na versão antiga de seu site uma nota dizendo que “integrou a COP 25”, dias depois de a missão em Madri ter sido concluída. Questionados há 10 dias, nem o GSI nem a Abin haviam se manifestado ou respondido a perguntas da reportagem sobre a operação na ONU. Sem precedentes, ela foi contestada também por ambientalistas, diplomatas, ex-chefes de delegação internacional e dirigentes de ONGs.
Crachá
Tendo o elo com Abin oculto, eles foram credenciados na ONU pelo Itamaraty como “analistas” do GSI para supostamente participar das rodadas de “negociações” da COP 25. Com isso, receberam um crachá com tarja rosa que dava o mais amplo acesso a salas de negociação e a espaços sob responsabilidade e segurança das Nações Unidas. A suspeita da presença deles e o comportamento no pavilhão de debates e exposições organizado por ONGs, o Brazil Climate Action Hub, provocou um clima de desconfiança generalizada na delegação.
Até delegados de outros países entraram em alerta. Intimidados, servidores técnicos deixaram de falar em público com ambientalistas, que por sua vez notaram comportamentos suspeitos e deixaram de promover reuniões de coordenação numa sala de debates envidraçada, após abordagem de um “representante do GSI”.
O Estadão consultou as listas oficiais das delegações nas edições da COP de 2013 a 2018, em posse das Nações Unidas. Em nenhuma delas aparece o nome de representantes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) ou da Abin. Fontes acostumadas a participar do evento disseram ser a primeira vez que a Abin monitorou o encontro.
Por Felipe Frazão
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