A proposta de reforma tributária do governo manteve a isenção de tributos da cesta básica, mas alterou uma regra que pode levar os fabricantes desses produtos a aumentar seus preços, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão. Pelo projeto, as empresas isentas da nova Contribuição Social sobre Operação com Bens e Serviços (CBS) não poderão mais aproveitar créditos gerados ao longo da cadeia de produção para abater outros impostos.
A preocupação de a reforma tributária provocar alta dos preços ao consumidor e aumentar a inflação entrou no radar depois que o ministro da Economia, Paulo Guedes, apresentou o projeto do governo para substituir PIS/Cofins com alíquota única de 12% – considerada elevada por empresas e acadêmicos.
Se o texto for aprovado da forma como está, as empresas que fabricam produtos que têm isenção, como os da cesta básica, terão de devolver esse crédito ao Fisco – estornar, na linguagem técnica. Esse tipo de crédito funciona, na prática, como dinheiro e é usado pelas empresas para abater o pagamento de outros tributos devidos à Receita.
A intenção do governo era acabar com a desoneração dos produtos da cesta básica, com a promessa de que parte do aumento da arrecadação seria devolvida aos mais pobres por meio do Renda Brasil, um novo programa de distribuição de renda. Na última hora, porém, o governo desistiu da proposta, mas acabou com a possibilidade de uso de créditos tributários.
A Receita não quis comentar o risco de as empresas aumentarem os preços e informou que a regra proibindo o aproveitamento do crédito foi pensada para limitar o benefício de isenção à etapa de produção do produto. Segundo o Fisco, a regra diminui a abrangência do benefício, evitando a necessidade de aumento da alíquota geral da CBS para além dos 12%.
“É um tiro no pé”, diz Vinicius Jucá Alves, sócio da área tributária da Tozzini Freire Advogados. A consequência, segundo o especialista, será um aumento da carga tributária sobre esses produtos, que pode ser repassado para o consumidor final. Alves dá como exemplo um fabricante de massa que compra farinha de trigo, produto isento, mas também precisa de outros insumos e equipamentos que não têm isenção. Sem poder usar o crédito para abater os impostos, o fabricante tende a incluir no preço final os 12% que pagou do novo imposto sobre esses itens.
“No modelo atual, empresa que vende um produto isento tem direito a manter o crédito do PIS/Cofins para compensar com Imposto de Renda e outros tributos”, explica. “Esse crédito, que era dinheiro para a empresa, vai ter de ser jogado fora.”
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia), João Dornellas, afirmou que o setor está analisando o impacto da proposta. Segundo ele, a carga tributária média sobre os alimentos, incluindo os da cesta básica, é de 23% – “uma das maiores do mundo”, quando comparada a de países com desenvolvimento similar ao do Brasil, como México e Turquia. Ele diz que a média internacional é da ordem de 7%. “Não podemos esquecer que alimento é essencial e tem impacto direto na renda das famílias brasileiras.”
Para Luca Salvoni, sócio da área tributária do escritório Cascione Pulino Boulous, a nova norma pode implicar aumento de carga se comparada à carga atual de PIS/Cofins (a alíquota atual é de 9,25%). “Poderá ser verificado um aumento da carga final do produtor de itens da cesta básica, considerando a impossibilidade de manutenção dos créditos decorrentes da venda desses produtos”, diz ele.
Já o advogado tributarista Luiz Gustavo Bichara, sócio da Bichara Advogados, considera que o problema da regra foi feita para aumentar a arrecadação da nova contribuição proposta pelo governo. “É uma estratégia para aumentar a arrecadação, mas gera aumento (de preço) ao consumidor porque o custo do insumo que não gerou o crédito vai para o preço.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Adriana Fernandes
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