Uma decisão favorável na Justiça foi insuficiente para que a diarista Jaqueline de Jesus Santos, de 34 anos, recebesse a cota dupla do auxílio emergencial a que tem direito por ser mãe solteira. Na expectativa de sair do aperto, ela foi a uma lotérica em Salvador ontem para sacar o benefício e ficou frustrada ao perceber que o governo, mais uma vez, pagou só R$ 600 – metade dos R$ 1.200 que lhe são devidos.
Jaqueline é uma das 27,1 mil pessoas que precisaram recorrer à assistência jurídica da Defensoria Pública da União (DPU) para conseguir acessar a ajuda desenhada pelo governo para socorrer trabalhadores informais e autônomos na crise provocada pela pandemia do novo coronavírus. Desde o fim de maio, são quase mil novos processos de assistência abertos pela DPU a cada dia útil. Os dados estão sendo atualizados em painel do órgão na internet.
O número está longe de refletir o total de ações judiciais no Brasil envolvendo o auxílio emergencial, uma vez que a DPU está presente em apenas 30% dos municípios. Mesmo assim, os mais de 27 mil processos surpreendem. “É um número muito grande para nosso cotidiano”, diz o defensor nacional de direitos humanos da DPU, Atanasio Darcy Lucero Júnior.
Mais de 64 milhões de brasileiros foram contemplados pelo programa emergencial, mas o Tribunal de Contas da União (TCU) já alertou que os números estão acima da estimativa de pessoas que fariam jus ao benefício segundo os dados da Pnad Contínua, pesquisa do IBGE que mede emprego e renda. Como mostrou o Estadão/Broadcast, 8,1 milhões podem ter recebido indevidamente o auxílio, de acordo com a área técnica da Corte de contas.
A Controladoria-Geral da União (CGU), por sua vez, já identificou 317,2 mil servidores e agentes públicos que receberam a ajuda sem ter direito. Os pagamentos somam R$ 223 milhões.
Enquanto isso, quem precisa não recebe. Jaqueline tem uma filha de 15 anos e trabalha como diarista para sobreviver. Com a pandemia da covid-19, as diárias minguaram. A ajuda só basta para pagar o aluguel de R$ 400 e as contas de água e luz.
Ela procurou a DPU, que ingressou com uma ação na Justiça e conseguiu garantir o direito aos R$ 1,2 mil. Ontem, com apenas metade do valor, voltou a procurar a Defensoria para saber o que fazer.
A dona de casa Rosângela Araújo Muniz dos Santos, de 34 anos, fez o primeiro pedido do auxílio em 8 de abril, mas até hoje não conseguiu o benefício. Nas duas vezes em que fez a solicitação, os dados foram inconclusivos. Mais tarde, ela descobriu que ainda constava na Rais como funcionária da prefeitura de Salvador, embora tenha sido demitida em setembro de 2019.
Rosângela acionou a Justiça com ajuda da DPU, mas o governo pediu até 29 de junho para dar uma solução ao caso no âmbito do processo. “Para quem está sem dinheiro para se alimentar, esperar até 29 de junho é muito tempo”, diz.
A DPU fez recentemente um acordo com o Ministério da Cidadania para estabelecer uma ponte mais direta para contestação administrativa de decisões sobre o auxílio emergencial, sem necessidade de acionar a Justiça. Dessa maneira, a Defensoria poderá apresentar dados e documentos que mostrem que a ajuda é devida, e a revisão será mais rápida.
Procurado, o Ministério da Cidadania disse que criou o programa com base nas informações disponíveis nas bases de dados em abril de 2020 e vem atualizando os cadastros conforme o possível. “Com relação ao caso da mãe solteira que obteve na Justiça decisão favorável para receber o auxílio emergencial no valor de R$ 1.200,00, o ministério garantirá o direito e ela vai receber os recursos”, disse a Cidadania, sem dar prazo para o pagamento. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Por Idiana Tomazelli
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